Contracepção Hormonal: Mecanismos, Tipos e Implicações Clínicas


Contracepção Hormonal: Mecanismos, Tipos e Implicações Clínicas


Introdução

A contracepção hormonal é um método eficaz de controle de natalidade que atua principalmente na inibição da ovulação. A administração de estrogênio ou progesterona, nas quantidades apropriadas durante a primeira metade do ciclo menstrual, pode inibir a ovulação (1). Isso ocorre porque esses hormônios evitam o pico pré-ovulatório da secreção de Hormônio Luteinizante (LH) pela hipófise, que é essencial para a ovulação (1). Embora ainda não totalmente esclarecido, acredita-se que momentos antes do pico de LH, possa ocorrer uma depressão súbita da secreção de estrogênio pelos folículos ovarianos, que seria o sinal de feedback necessário para esse pico (1).


Contraceptivos Orais

Existem dois tipos principais de contraceptivos orais: combinações de estrogênio com progesterona e somente progesterona (3). Tanto os contraceptivos orais com progesterona quanto os combinados são metabolizados pelas enzimas citocromo P450 hepáticas (3). Dada a utilização da dose efetiva mínima, qualquer aumento da sua depuração pode resultar em falha do método (3).

Pílula Combinada

O estrogênio utilizado nas pílulas de segunda geração é o etinilestradiol, com algumas poucas preparações contendo mestranol (3). A progesterona varia entre noretisterona, levonorgestrel, etinodiol ou, nas pílulas de terceira geração, desogestrel ou gestodeno (3). As pílulas de terceira geração são mais potentes, com menos ação androgênica e poucas mudanças no metabolismo de lipoproteínas, porém com um maior risco para tromboembolia (3).

O conteúdo de estrogênio é geralmente de 20-50 μg de etinilestradiol ou seu equivalente, e a preparação é escolhida com baixíssimos níveis de estrogênio e progesterona, que são bem tolerados e oferecem um bom controle do ciclo (3). A pílula combinada é utilizada por 21 dias consecutivos, seguidos de 7 dias sem pílula, gerando o sangramento. Os ciclos normais de menstruação começam logo após a descontinuação do tratamento (3).

Mecanismo de Ação da Pílula Combinada

  • O estrogênio inibe a secreção de FSH (Hormônio Folículo Estimulante) via retroalimentação negativa na adeno-hipófise, suprimindo o desenvolvimento do ciclo ovariano (3).
  • A progesterona inibe a secreção de LH, prevenindo a ovulação (3). Ela também estimula a produção de muco cervical, tornando-o menos suscetível à passagem do esperma (3).
  • Estrogênio e progesterona agem combinadamente para alterar o endométrio, de tal maneira que evita a implantação (3).
  • Eles também podem interferir nas contrações coordenadas de colo, útero e tubas uterinas, que facilitariam a implantação (3).

Efeitos Benéficos e Aplicações da Pílula Combinada

  • Contracepção (3).
  • Diminuição dos sintomas menstruais, como períodos irregulares e sangramentos intermenstruais (2, 3).
  • Auxílio na anemia por deficiência de ferro (3).
  • Melhora da Tensão Pré-Menstrual (TPM) (3).
  • Atuação em doenças benignas da mama, fibrose uterina e cistos funcionais ovarianos (3).
  • Prevenção da perda óssea em mulheres na pré-menopausa (2).

Efeitos Adversos Comuns da Pílula Combinada

  • Ganho de peso, retenção hídrica ou efeito anabólico, ou ambos (3).
  • Náuseas amenas, rubor, tontura, depressão e irritabilidade (3).
  • Mudanças na pele (acne/aumento na pigmentação) (3).
  • Amenorreia de duração variável na cessação da ingestão (3).

Considerações sobre Segurança da Pílula Combinada

Com as pílulas de segunda geração, com conteúdo de estrogênio < 50 μg, o risco de tromboembolismo é pequeno (15/100.000 usuárias/ano, sendo que em não usuárias o risco é de 5/100.000 usuárias/ano) (3). No entanto, é preciso ressaltar que esse risco aumenta em subgrupos com fatores adicionais, como fumantes, e com o uso continuado da pílula, especialmente em mulheres acima de 35 anos de idade (3). Além disso, o risco de câncer é afetado, havendo uma diminuição tanto para o risco de câncer ovariano quanto para o endometrial (3).

Pílulas de Progesterona

Fármacos utilizando apenas progesterona incluem noretisterona, levonorgestrel e etinodiol (3). A pílula deve ser tomada sem interrupção (3).

Mecanismo de Ação da Pílula de Progesterona

O mecanismo de ação ocorre primariamente sobre o muco cervical, que se torna inviável para o esperma (3). Mas a progesterona provavelmente também impede a implantação através de seu efeito sobre o endométrio e sobre a motilidade e as secreções uterinas (3).

Efeitos Benéficos e Adversos da Pílula de Progesterona

  • Oferecem uma alternativa viável para a pílula combinada em algumas mulheres nas quais o estrogênio é contraindicado, sendo ainda viáveis para aquelas cuja pressão sanguínea aumenta de maneira exagerada durante o tratamento com estrogênio (3).
  • Entretanto, seus efeitos contraceptivos são menos confiáveis quando comparados aos da pílula combinada, e, perdendo-se uma dose, pode ocorrer a concepção (3).
  • Além disso, sangramentos irregulares são relativamente comuns (3).

Contracepção Pós-Coito

A pílula do dia seguinte (levonorgestrel, sozinho ou combinado com estrogênio) é efetiva se administrada dentro de 72 horas após o intercurso não protegido e repetida após 12 horas (3). Náuseas e vômitos são comuns, por isso as pílulas podem ser perdidas. Assim, podem ser utilizadas pílulas de reposição se associadas a um antiemético, como a domperidona (3).


Contraceptivos de Ação Prolongada

Medroxiprogesterona

A medroxiprogesterona pode ser administrada intramuscularmente como contraceptivo, sendo considerada um método eficaz e seguro (3). No entanto, ela apresenta efeitos colaterais indesejados, como irregularidade menstrual e infertilidade prolongada após a dose final (3).

Levonorgestrel

O levonorgestrel é implantado subcutaneamente em uma cápsula não biodegradável (3). Essa via de administração evita o metabolismo de primeira passagem no fígado (3). As cápsulas liberam seu conteúdo de progesterona lentamente por 5 anos (3).


Outras Aplicações dos Hormônios Sexuais

Osteoporose

A amenorreia e a deficiência de estrogênio já foram associadas ao aumento da reabsorção óssea e à osteoporose (2).

Comportamento Alimentar

Hormônios sexuais mostraram-se capazes de interferir no apetite e em funções metabólicas. Em animais, o estradiol foi capaz de inibir a alimentação, enquanto a progestina estimulou o apetite (2).

Metabolismo

A progestina pode interferir no metabolismo dos carboidratos, diminuindo a sensibilidade à insulina (2). Em mulheres pós-menopausa, a administração de estrogênio foi capaz de reduzir a oxidação lipídica pós-prandial e aumentar a massa gorda (controverso).

Tríade da Mulher Atleta

Contraceptivos hormonais podem ser recomendados a atletas, principalmente para aquelas que se encontram com a tríade da mulher atleta. Foram observados poucos prejuízos na performance, sendo considerado uma excelente forma de tratamento (2).


Referências Bibliográficas

  1. HALL, J. E.; GUYTON, A. C. Tratado de Fisiologia Médica. 13. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017. 1176 p.
  2. RICKENLUND, A. et al. Effects of oral contraceptives on body composition and physical performance in female athletes. J Clin Endocrinol Metab., v. 89, n. 9, p. 4364–4370, 2004.
  3. RITTER JAMES, M. et al. Rang & Dale Farmacologia. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2020. 789 p.
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