A Creatina na Prática Clínica e Esportiva: Uma Revisão Abrangente


A Creatina na Prática Clínica e Esportiva: Uma Revisão Abrangente


Introdução

A creatina é um composto nitrogenado amplamente estudado e reconhecido por seus múltiplos benefícios em diversas condições clínicas e no desempenho esportivo. Sintetizada endogenamente a partir de aminoácidos precursores como arginina, metionina e glicina, a creatina também pode ser obtida através da dieta, principalmente de fontes animais (4). Este documento visa fornecer uma análise aprofundada sobre a fisiologia, recomendações de uso, segurança e as aplicações terapêuticas e ergogênicas da suplementação de creatina, com base nas evidências científicas atuais.


Fisiologia e Metabolismo da Creatina

A síntese endógena de creatina ocorre predominantemente no fígado, a partir da arginina, glicina e metionina, a uma taxa aproximada de 1-2 g/dia (9). O processo inicia-se nos rins com a formação de ácido guanidinoacético (AGA), que subsequentemente é transportado para o fígado, onde se condensa com S-adenosilmetionina para formar a creatina (4).

A quantidade corporal total de creatina (fosfocreatina + creatina livre) varia com a massa muscular, sendo estimado que um homem de 70 kg possua entre 120 a 130 mmol de creatina por kg de massa seca, com uma concentração máxima de 160 mmol/kg de massa seca no músculo esquelético (1, 4). Cerca de dois terços da creatina muscular são compostos por fosfocreatina (PCr), enquanto o restante é creatina livre (1). Mais de 90% da creatina total do organismo é armazenada no músculo esquelético (4).

No organismo, a creatina se combina com um grupo fosforil (Pi) para formar a PCr, uma reação enzimática catalisada pela creatina quinase (CK) (1). A principal função da creatina é a rápida provisão de energia via grupo N-fosforil, ou seja, a formação de ATP através da seguinte reação reversível: ADP+fosfocreatina+H+↔ATP+Creatina (4). Esse sistema bioenergético é crucial em tecidos com alta e rápida demanda energética, como o músculo esquelético e o cérebro (4).

A suplementação de creatina aumenta os estoques intramusculares de creatina, o que eleva a taxa de ressíntese da fosfocreatina, aprimorando a capacidade de sustentar exercícios de alta intensidade (6). Não há evidências de que a suplementação de creatina afete a produção endógena de creatina (1).

Fatores como T3, IGF-1 e insulina parecem aumentar o conteúdo total de creatina nas células musculares em comparação com o controle (3).


Farmacocinética da Creatina

Absorção

A creatina mono-hidratada apresenta uma taxa de absorção intestinal próxima de 100% (1). Não existem evidências que indiquem benefícios adicionais para outras formas de creatina em comparação com a mono-hidratada; inclusive, a creatina mono-hidratada tem se mostrado mais eficaz do que as formas etil éster e efervescente (5). A absorção da creatina é um processo sódio-dependente (3). Por isso, é recomendado o consumo de creatina junto com uma fonte de proteínas e carboidratos, pois a insulina liberada em resposta a esses macronutrientes pode potencializar a absorção (1, 3, 5, 6).

Estudos também indicam que o exercício físico prévio ao consumo de creatina pode otimizar o acúmulo de creatina nos grupos musculares exercitados (4). O pico plasmático da creatina geralmente ocorre cerca de 60 minutos após a ingestão (1). É importante notar que a cafeína parece inibir a captação muscular de creatina (3).

Excreção

Aproximadamente 2 g de creatina por dia são espontaneamente convertidos em creatinina, que é então excretada pelos rins na urina (4). O tempo de washout da creatina no organismo é relativamente longo, cerca de um mês, após a interrupção da suplementação (4).


Recomendações de Suplementação e Uso Clínico

Dose e Modo de Uso

A creatina é um suplemento que pode ser utilizado por diferentes faixas etárias e grupos populacionais. Alguns pesquisadores já recomendam o uso de 3 g/dia para promoção da saúde geral (1). Pode ser utilizada por adolescentes e crianças, desde que não exceda a dose recomendada (2), e tem demonstrado diversos benefícios para idosos (3).

A dose recomendada para adultos saudáveis é de 0,03 a 0,06 g/kg/dia (4) ou de 3 a 5 g/dia (6). A creatina mono-hidratada é a forma preferencial (5).

A fase de carregamento (ou saturação) é um método que pode ser adotado se houver necessidade de resultados mais rápidos em um curto período. Consiste em ingerir 0,3 g/kg/dia (ou 20 g/dia) divididos em 4 doses diárias, por 5 a 7 dias (1, 4, 6). Não se deve exceder 5 g por dose (4).

Duração da Suplementação

Não há na literatura científica dados que indiquem qualquer razão para não adotar períodos mais ou menos longos de uso (4). Estudos têm demonstrado a segurança do uso contínuo por até 4 anos (6), e outros por até 10 anos, sem alterações na taxa de filtração glomerular ou outros marcadores de função renal (4).

Orientações Nutricionais ao Paciente

Para otimizar a absorção e os efeitos, o paciente deve ser orientado a:

  • Realizar o uso da creatina junto com uma fonte de proteína e carboidrato.
  • Consumir todos os dias, incluindo dias sem treino, finais de semana e feriados, para manter os estoques musculares.
  • Evitar consumir junto com cafeína, devido à possível inibição da captação muscular (3).
  • Manter intervalos entre as séries de exercício de pelo menos 60 segundos para otimizar a ressíntese de fosfocreatina (3).
  • Não ultrapassar a dose máxima diária de 5 g por dose (4).

Segurança e Efeitos Adversos

A creatina é considerada o suplemento mais seguro e eficaz disponível para atletas que praticam esportes de alta intensidade e curta duração (2, 3, 5, 6, 9).

Ganho de Peso

O único efeito colateral consistentemente encontrado com o uso de creatina é o ganho de peso, principalmente devido à retenção hídrica intracelular (1). Após a fase de carregamento, é possível que ocorra um ganho de 0,5 a 3,5 kg de peso (água) (6, 12), sendo o aumento médio de massa corporal de aproximadamente 1 kg (12). Em esportes onde o controle de peso é crítico, é fundamental avaliar a relação benefício-risco desse ganho ponderal (4). São necessárias entre 4 a 6 semanas para que o peso do atleta retorne ao valor pré-suplementação (1, 10). A retenção hídrica é predominantemente intracelular, não causando efeitos estéticos como celulite.

Mitos sobre Efeitos Colaterais

Existem rumores sobre efeitos colaterais como desconforto gastrointestinal, cãibras, hipertermia, disfunção hepática e renal. No entanto, estudos não comprovam tais efeitos, principalmente em doses de até 5 g (4).

  • Desconforto gastrointestinal: Sintomas como diarreia, vômito e indisposição estomacal podem ocorrer com doses muito altas de creatina ingeridas de uma única vez (acima de 5g), por isso é recomendado que doses únicas não ultrapassem 5g (4). Contudo, a literatura científica apresenta poucas evidências que sustentem tais efeitos quando utilizadas doses de até 5g (4).
  • Cãibras musculares: Não existem evidências na literatura que indiquem que o aumento da creatina intramuscular, que causaria um aumento da quantidade de água dentro das células musculares, alterando a concentração de diferentes íons e a excitabilidade dessas células musculares, possa de fato ocorrer e causar cãibras (4). Estudos bem controlados não observaram efeitos indesejados relacionados a cãibras com a suplementação de creatina (4).
  • Termorregulação/Hidratação: Estudos prospectivos, bem controlados e que avaliaram diretamente os efeitos da suplementação de creatina sobre variáveis relacionadas à hidratação e termorregulação não mostraram qualquer efeito adverso do uso de creatina (4). Pelo contrário, alguns pesquisadores observaram que a creatina foi capaz de diminuir a resposta termorregulatória em exercícios longos, promovendo maior eficiência mesmo em ambientes quentes e úmidos (1). A creatina pode inclusive servir como uma estratégia de hiper-hidratação para atletas em exercícios intensos em ambientes quentes e úmidos, reduzindo o risco de problemas relacionados ao calor (1).

Função Renal e Hepática

Atualmente, há fortes evidências de que o uso de creatina é seguro para a função renal em indivíduos saudáveis, conforme demonstrado em estudos bem controlados com humanos (4, 5, 8). Não existem evidências científicas que demonstrem qualquer prejuízo no uso de creatina por crianças e adolescentes (1).

Em relação a indivíduos com comprometimento renal, dados mostram que mesmo aqueles com maior risco para doenças renais podem se beneficiar da suplementação de creatina sem risco para a função dos rins (4). Um estudo com um jovem com apenas um rim, apresentando ligeira redução da taxa de filtração glomerular, não encontrou alterações na taxa de filtração glomerular ou outros marcadores da função renal após 35 dias de suplementação, embora a creatinina sérica tenha aumentado (4).

É crucial salientar que a creatinina sérica é um marcador indireto da função renal e seu aumento é esperado com a suplementação de creatina, uma vez que a creatina é espontaneamente convertida em creatinina (4). A avaliação da função renal deve ser feita por outros marcadores como a cistatina C, clearance de creatinina e taxa de filtração glomerular (TFG) (4).

Quanto à função hepática, os efeitos deletérios da creatina estão relacionados à espécie estudada e à dose (em camundongos e ratos submetidos a doses altas). Em humanos, até o momento, nenhum indício de prejuízo da função hepática foi encontrado (4).

Contaminação e Doping

Existe a possibilidade de contaminação da creatina com di-hidrotestosterona (DHT), o que pode causar queda de cabelo. No entanto, isso não é atribuído à creatina em si, mas sim à presença de andrógenos contaminantes, que também podem levar a problemas em testes de doping.

Formação de Compostos Citotóxicos e Carcinogênese

Teoricamente, a metabolização da creatina poderia resultar na formação de compostos com efeitos carcinogênicos ou citotóxicos, como metilamina, formaldeído e aminas heterocíclicas (4). Apesar de um discreto aumento no aparecimento desses compostos na urina ter sido observado, nenhum ensaio clínico bem controlado demonstrou qualquer efeito tóxico após a suplementação de creatina (4).


Aplicações Clínicas da Creatina

Atletas e Desempenho Esportivo

A creatina é o suplemento mais seguro e eficaz para atletas que praticam esportes de alta intensidade e curta duração, como aqueles com esforços máximos repetitivos (duração <10 segundos) separados por curtos períodos de recuperação (geralmente <60 segundos), realizados por um longo período (1 a 2 horas) (2, 3, 5, 6, 9).

O aumento nas reservas de creatina (Cr) e fosfocreatina (PCr) proporciona maior capacidade de fornecimento de energia pelo sistema ATP-CP, prolongando a capacidade de produção de trabalho pelo músculo esquelético e, consequentemente, retardando o início da fadiga muscular (4). A suplementação permite um aumento na velocidade de regeneração do ATP durante intervalos de exercícios de alta intensidade (5).

  • Aumento de Desempenho e Massa Muscular: O aumento do desempenho gerado pela creatina indiretamente leva ao ganho de massa muscular e ao aumento dos estoques de glicogênio. A literatura é clara ao demonstrar que a suplementação de Cr, associada ao treinamento de força, resulta em aumentos superiores de massa magra do que a suplementação ou o treinamento isoladamente (4). O principal mecanismo atribuído à suplementação de Cr é o aumento no volume de treino, que acarreta maior ganho de força e hipertrofia a longo prazo (4).
  • Recuperação e Prevenção de Lesões: A suplementação de creatina pode melhorar a recuperação pós-exercício, prevenir injúrias e danos musculares, melhorar a termorregulação e auxiliar na reabilitação (1). Em maratonistas, a creatina diminuiu alterações nos níveis de CK, prostaglandinas E2, TNF-α, e aboliu o crescimento da lactato desidrogenase (LDH), mostrando melhora nos marcadores inflamatórios e na dor muscular (1).
  • Natação e Ciclismo: Na natação, a suplementação de creatina reduziu a força de arrasto e o coeficiente hidrodinâmico, beneficiando a eficiência da propulsão (4). Em esportes de endurance como o ciclismo, a creatina pode exercer um efeito ergogênico sobre os sprints que ocorrem ao longo das provas (4).

Idosos e Sarcopenia

A suplementação de creatina, isolada ou associada à atividade física, é uma das poucas estratégias nutricionais capazes de atenar o processo de sarcopenia em idosos (4). Idosos frequentemente apresentam concentrações intramusculares de Cr e PCr significativamente menores do que indivíduos jovens, possivelmente devido à atrofia de fibras musculares tipo II (com maior conteúdo de PCr), alterações alimentares e redução da atividade física (4).

A suplementação de creatina tem sido capaz de reduzir a fadiga em idosos, aumentar a força e melhorar o desempenho físico em diversos testes funcionais e de potência (4). Quando associada ao treinamento de força, promoveu ganhos aditivos de massa muscular, força e capacidade física (4). Acredita-se que a creatina estimule fatores de transcrição e regulação de genes envolvidos no ganho de massa muscular, além de aumentar a proliferação de células satélites, que participam da hipertrofia (4).

Doenças Neurodegenerativas e Cognição

O cérebro é um órgão metabolicamente ativo e a creatina cerebral é essencial na produção de energia (7). A creatina otimiza a ressíntese de energia, sendo um suplemento sinérgico com vitamina B3 e triptofano, o que pode melhorar a produção de serotonina e melatonina, favorecendo a saúde cognitiva (1, 6, 7).

  • Melhora Cognitiva: A creatina foi capaz de melhorar a memória e a inteligência em tarefas que exigem velocidade, e reduziu a fadiga mental em cálculos matemáticos (1). Há evidências de que a creatina melhora a cognição em voluntários em privação de sono, com menor redução no desempenho, melhora no tempo de reação e no humor (1, 6, 7).
  • Neuroproteção: Estudos demonstram que o sistema ATP/CK/PCr é fundamental para o funcionamento do sistema nervoso central (SNC) em condições normais e patológicas. A creatina pode desempenhar ações antiapoptóticas, antiexcitotóxicas e antioxidantes (4). Em doenças neurodegenerativas, caracterizadas por estresse oxidativo e disfunção mitocondrial, a creatina pode ser uma estratégia terapêutica adjunta para reduzir as espécies reativas de oxigênio (EROS) e aumentar a produção de energia celular (4). Benefícios foram observados em Alzheimer, demência (3), depressão, desordens do pânico, esquizofrenia e injúrias cerebrais (7). Pesquisadores acreditam que seus efeitos neuroprotetores se devem à manutenção da bioenergética mitocondrial neuronal (1).
  • Limitações: Apesar dos benefícios observados, ainda há dúvidas sobre o impacto da suplementação nos níveis de creatina cerebral em pessoas saudáveis (7). É especulado que doses maiores e/ou períodos mais longos seriam necessários para aumentar os níveis cerebrais de creatina, devido à barreira hematoencefálica (7). No cérebro, o aumento pode chegar a, no máximo, 10%, comparado a 20% no músculo (7). No entanto, não é possível afirmar que a creatina atenuará o declínio da função cognitiva relacionado ao envelhecimento, pois outros fatores também influenciam a cognição (4).

Diabetes

Estudos in vitro demonstraram que a creatina pode aumentar, modestamente, a secreção de insulina (4). Em outros estudos, foram observados efeitos benéficos da creatina sobre a expressão do GLUT-4 (4). Em humanos, a suplementação de 5 g/dia de creatina combinada ao treinamento físico em diabéticos promoveu aumento nos conteúdos intramusculares de PCr, melhora no controle glicêmico e incremento na translocação de GLUT-4 (4). O mecanismo pode envolver o aumento da expressão da proteína AMPK, que otimiza a captação intramuscular de glicose (4). A creatina associada a treinamento aeróbio também melhora a tolerância à glicose (3).

Miopatias

A creatina tem um papel clinicamente relevante na atenuação da perda de massa muscular (4). Pacientes com miopatias frequentemente apresentam reduções nas concentrações intramusculares de PCr (4). Uma meta-análise com 20 ensaios clínicos revelou que a suplementação de Cr promoveu ganho de força e massa magra em pacientes com diversas distrofias musculares (4). Assim, a suplementação de Cr emerge como uma potencial estratégia terapêutica em desordens musculares, como miopatias inflamatórias, citopatias mitocondriais e distrofia muscular (3, 4).

Doenças Osteoarticulares

As células do tecido ósseo demandam grande aporte energético. O sistema PCr-CK é crucial nesse processo (4). Sugere-se que a suplementação de Cr possui efeitos benéficos nas propriedades funcionais e estruturais do osso, podendo ser utilizada como estratégia nutricional terapêutica em distúrbios que acometem este tecido (4). Estudos observaram aumento significativo do conteúdo mineral ósseo (CMO) e redução de marcadores de reabsorção óssea com a suplementação de creatina, especialmente quando associada ao exercício (4). A creatina é efetiva na prevenção da perda mineral óssea em idosos (1, 3).

Fibromialgia

Pacientes fibromiálgicos frequentemente apresentam redução nas concentrações intramusculares de ATP e PCr, e a dor tem sido hipotetizada como resultado de dano muscular provocado por isquemia local e redução de ATP (4). Estratégias que aumentem o aporte de ATP e a capacidade oxidativa são potencialmente terapêuticas (4). A suplementação de creatina por 8 semanas melhorou diversos parâmetros clínicos em pacientes fibromiálgicos, embora os benefícios tenham cessado 4 semanas após a interrupção (4). A suplementação exerce efeitos benéficos sobre a função muscular, mas não afeta significativamente o quadro clínico geral da doença (4).

Doença de Parkinson

A perda progressiva de neurônios na Doença de Parkinson pode ser decorrente de distúrbios energéticos mitocondriais (4). A suplementação de creatina poderia ser uma intervenção benéfica, restabelecendo a homeostase energética mitocondrial (4). Em um estudo com idosos, após 24 meses de suplementação, não houve progressão da doença, e foi relatada melhora no humor e na resposta à terapia dopaminérgica (4). A suplementação ininterrupta por dois anos foi bem tolerada e segura nesses pacientes (4).

Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)

Evidências preliminares apontam para redução significativa na expressão da enzima CK-BB no SNC em ELA, sugerindo alteração no metabolismo de creatina e distúrbio mitocondrial (4). Embora a suplementação de creatina pudesse atuar como neuroprotetora, atenuando o dano mitocondrial e gerando energia, estudos sucessivos não encontraram benefícios na suplementação para ELA em termos de força, qualidade de vida, fadiga ou questionários específicos da doença (4). Até o momento, evidências preliminares não confirmam a eficácia da suplementação de creatina na ELA (4).

Câncer

Há evidências da presença de CK em células tumorais, sugerindo o envolvimento energético do sistema Cr/CK/PCr no câncer (4). Estudos in vitro e em roedores demonstraram que a suplementação de creatina poderia exercer um efeito protetor no crescimento de células tumorais, possivelmente pela redução da atividade da via glicolítica do tumor e aumento das concentrações de PCr (4). Observou-se diminuição do crescimento tumoral com o aumento da dose de creatina (4). No entanto, efeitos positivos sobre o crescimento tumoral foram encontrados apenas em tumores cuja atividade da CK era aumentada (4). Em modelos com tumores menos agressivos ou com alta expressão de CK, a creatina pareceu atenuar o crescimento tumoral. Em contrapartida, em modelos com tumores mais agressivos ou com baixa atividade da CK, a creatina não pareceu afetar o crescimento tumoral (4).

Além disso, estudos em ratos mostraram que a creatina foi capaz de aumentar a disponibilidade energética para células de defesa, sendo uma aliada na luta contra o câncer (11). Foi encontrado um aumento na expressão gênica de receptores de creatina nas células imunes contra o câncer (CrT), importante para a demanda energética das células (11). A deficiência de creatina em animais com câncer diminui a eficiência do sistema imune (11). Os efeitos foram observados principalmente no câncer de cólon (11).

Gestação

A suplementação de creatina durante a gravidez pode gerar benefícios no crescimento fetal, desenvolvimento e saúde da criança (1). Em animais, a suplementação materna trouxe benefícios relacionados à sobrevivência neonatal e ao funcionamento dos órgãos após asfixia (1).

Vegetarianos/Veganos

A creatina é encontrada principalmente em fontes animais, tornando a suplementação ainda mais benéfica para vegetarianos e veganos (10). Estudos demonstraram que vegetarianos apresentam um estoque de creatina intramuscular menor (90-110 mmol/kg) do que a população onívora (1). Os benefícios para essa população não se limitam ao desempenho esportivo, estendendo-se à cognição e saúde mental (7).

Outras Condições

  • Hipertrigliceridemia: O uso de creatina associado à prática de atividade física é benéfico para indivíduos com hipertrigliceridemia. Atletas utilizando creatina apresentaram maior quantidade de HDL e menor de LDL e VLDL (3).
  • Isquemia Miocárdica e AVC: Alguns autores consideram o uso profilático da creatina benéfico em pacientes com risco de isquemia miocárdica e acidente vascular cerebral (AVC) (1).

Referências Bibliográficas

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