Fisiologia do Sistema Reprodutor Feminino
Introdução
O sistema reprodutor feminino é intrinsecamente regulado por um complexo eixo hormonal que se inicia na puberdade, culminando na maturação sexual e no estabelecimento do ciclo menstrual. Contudo, em mulheres atletas, particularmente aquelas envolvidas em esportes de alta demanda física ou estética, essa regulação pode ser comprometida, dando origem à “Tríade da Mulher Atleta”, uma condição que interliga disponibilidade energética, função menstrual e saúde óssea.
Eixo Hipotalâmico-Hipofisário-Gonadal Feminino
Na puberdade, o hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH) é secretado pelo hipotálamo, estimulando a adeno-hipófise a liberar o hormônio luteinizante (LH) e o hormônio foliculoestimulante (FSH) (2). Esses hormônios são cruciais para a maturação sexual e a gametogênese (2). Paralelamente, o hormônio antimülleriano (AMH), uma glicoproteína, controla o desenvolvimento sexual fetal, sendo ativado especificamente no feto masculino para inibir o desenvolvimento do trato reprodutivo feminino (2).
O aumento na secreção de hormônios do hipotálamo e da adeno-hipófise, que ocorre na puberdade, estimula a secreção de estrógenos pelos ovários (2). Essa elevação hormonal desencadeia a maturação dos órgãos reprodutores e o desenvolvimento das características sexuais secundárias, bem como a aceleração do crescimento, seguida pelo fechamento das epífises dos ossos longos (2).
O Ciclo Menstrual
O ciclo menstrual inicia-se com a menstruação, que perdura por 3-6 dias e corresponde à eliminação da camada superficial do endométrio uterino (2). Após o término da menstruação, tem início a fase folicular, na qual o endométrio se regenera (2).
O GnRH, secretado no hipotálamo, estimula a adeno-hipófise a liberar os hormônios gonadotróficos, FSH e LH. Estes atuam nos ovários, promovendo o desenvolvimento de pequenos grupos de folículos, cada um contendo um óvulo (2). Dentre esses, um folículo se desenvolve mais rapidamente, formando o folículo de Graaf, que consiste em células da teca e da granulosa dispostas ao redor de um núcleo preenchido por líquido, contendo o óvulo (2). O folículo de Graaf é responsável pela secreção de estrógenos (2).
Os estrógenos são os responsáveis pela fase proliferativa da regeneração endometrial, que ocorre entre 5-6 dias e a metade do ciclo (2). Durante essa fase, o endométrio aumenta sua espessura e vascularização. No pico de secreção de estrógenos, há um aumento na secreção de muco e alterações no pH, facilitando a entrada dos espermatozoides (2).
A secreção elevada e endógena de estrógenos antes da metade do ciclo sensibiliza as células liberadoras de LH da hipófise à ação do GnRH, induzindo o surto de secreção de LH na metade do ciclo (2). Esse pico de LH causa o inchaço e a ruptura do folículo de Graaf, resultando na ovulação (2).
Estimuladas pelo LH, as células do folículo de Graaf proliferam e se desenvolvem no corpo lúteo, que secreta progesterona (2). A progesterona estimula a fase secretória do ciclo, que torna o endométrio suscetível à implantação do óvulo fertilizado (2). Essa progesterona exerce um efeito de retroalimentação negativa no hipotálamo e na hipófise, diminuindo a liberação de LH (2). Se não houver a implantação do óvulo, a secreção de progesterona cessa, desencadeando a menstruação (2). Caso ocorra a implantação, o corpo lúteo continua a secretar progesterona, e seu efeito no hipotálamo e na adeno-hipófise previne ovulações adicionais (2).
A Tríade da Mulher Atleta
A Tríade da Mulher Atleta é uma condição que interliga o consumo de energia, a função menstrual e a densidade mineral óssea (3). Manifestações clínicas podem incluir transtornos alimentares, amenorreia hipotalâmica funcional e osteoporose (3).
Mulheres fisicamente ativas, especialmente aquelas que praticam esportes que valorizam o baixo peso ou a estética corporal, têm maior probabilidade de sofrer de distúrbios relacionados ao ciclo menstrual:
- Início tardio da menstruação (menarca) (1)
- Ciclo menstrual irregular (oligomenorreia) (1)
- Parada completa da menstruação (amenorreia) (1)
A disfunção menstrual e ovariana é, em grande parte, resultado de modificações na secreção pulsátil normal do hormônio luteinizante pela hipófise, que é regulada pelo hormônio liberador de gonadotrofina do hipotálamo (1).
Hipóteses para a Disfunção Menstrual
- Estresse Induzido pelo Exercício: Um nível prolongado de estresse físico pode desregular o eixo hipotalâmico-hipofisário-adrenal e modificar a produção do hormônio liberador de gonadotrofina, resultando em irregularidades menstruais (1).
- Disponibilidade Energética Insuficiente: Outra hipótese sugere que uma reserva de energia (gordura) insuficiente para sustentar uma gravidez induz a interrupção da ovulação (1).
- Impacto Hormonal do Exercício Intenso: Esforços físicos intensos e/ou prolongados liberam cortisol e outros hormônios relacionados ao estresse, que podem alterar a função ovariana por meio do eixo hipotalâmico-hipofisário-adrenal (1).
Recomendações
Antes da menopausa, a irregularidade ou a ausência de função menstrual aceleram a perda óssea e aumentam o risco de lesões musculoesqueléticas durante o exercício, o que pode levar a interrupções mais longas do treinamento (1). O consumo regular de refeições bem balanceadas e nutritivas pode ajudar a prevenir ou reverter a amenorreia atlética sem que a atleta precise reduzir o volume ou a intensidade do treinamento físico (1).
Referências Bibliográficas
- MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do Exercício – Nutrição, Energia e Desempenho Humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017. 1059 p.
- RITTER, J. M. et al. Rang & Dale Farmacologia. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2020. 789 p.
- RIBAS FILHO, D.; SUEN, V. M. M. Tratado de Nutrologia. 2. ed. Santana de Parnaíba: Manole, 2019. 646 p.