Transtorno da Compulsão Alimentar (TCA): Fisiopatologia, Diagnóstico e Estratégias de Manejo
Introdução
O Transtorno da Compulsão Alimentar (TCA) é uma desordem alimentar que, embora prevalente, ainda é pouco reconhecida e diagnosticada, em grande parte devido à vergonha associada aos episódios de compulsão e à tendência dos pacientes de comerem escondido.
Fisiopatologia do Transtorno da Compulsão Alimentar
O Transtorno da Compulsão Alimentar se caracteriza pela ingestão, em um período de até duas horas, de uma quantidade de alimentos maior do que a maioria das pessoas consumiria em circunstâncias análogas (23). No entanto, a definição da compulsão alimentar é considerada controversa por incorporar elementos subjetivos, como a quantidade de alimentos que configura excesso (23).
Uma das teorias que buscam explicar os transtornos alimentares baseia-se na incapacidade dos indivíduos de lidar adequadamente com as emoções, incluindo sentimentos positivos (1). Assim, pessoas com desordens alimentares podem utilizar a compulsão como uma forma de manejar emoções indesejadas (1). O TCA assemelha-se à bulimia nervosa pela ocorrência de episódios de ingestão exagerada e compulsiva de alimentos, pelo menos uma vez por semana durante três meses, mas difere por não apresentar comportamentos compensatórios inapropriados, como a autoindução de vômito (29). É importante ressaltar que, durante um episódio de compulsão, pacientes com TCA geralmente não param de comer até se sentirem fisicamente desconfortáveis (29).
Os episódios compulsivos no TCA geralmente têm início precoce, na infância ou adolescência (29).
Aspectos Neurobiológicos e Psicológicos
Alterações no sistema nervoso central, mais especificamente na atividade da serotonina, podem influenciar diretamente o comportamento alimentar e desempenham um papel importante em outros transtornos psiquiátricos (21).
Estudos indicam que alterações no humor frequentemente precedem os episódios de compulsão (1). Raiva/frustração, ansiedade e tristeza/depressão representam cerca de 95% dos estados de humor que antecedem a compulsão (1). Indivíduos com TCA tendem a comer sozinhos devido à vergonha, sendo atormentados por sentimentos de desgosto, culpa ou tristeza (1).
Análises da alimentação de pessoas com compulsão demonstraram que geralmente há um maior consumo de carboidratos e açúcar, com elevados níveis de gordura e baixos níveis de proteína (22). Pacientes com TCA tendem a ingerir aproximadamente 1000 kcal a mais do que indivíduos sem o transtorno, com maior consumo de fast-foods e sobremesas (19).
Regulação Emocional e Estresse
O controle da emoção é a capacidade de manejar efetivamente as emoções em resposta aos eventos diários (1). Indivíduos que regulam suas emoções de forma adaptativa conseguem modular esses estados afetivos (1). Modelos sugerem que a compulsão alimentar é um meio de amenizar emoções negativas, provavelmente pela falta de estratégias adaptativas para essa modulação (1,24). A literatura sugere que a compulsão pode melhorar o humor temporariamente (1).
Esse modelo propõe que a compulsão alimentar é uma forma de “distração” para evitar lidar com emoções, usando a comida como conforto (1). Assim, o problema não são as “experiências negativas”, mas a ausência de estratégias para lidar com elas (1). A tentativa de suprimir emoções indesejadas pode gerar comportamentos não saudáveis, como abuso de substâncias, alimentos e autoagressão (1). Estudos demonstram que indivíduos com TCA tendem a suprimir suas emoções e reavaliá-las menos (1). A ruminação de pensamentos, especialmente sobre o corpo e peso, está associada à gravidade da psicopatologia do transtorno alimentar (1).
O estresse é um fator proeminente no comportamento compulsivo, pois ativa o eixo Hipotálamo-Hipófise-Adrenal (HPA) (24). Essa ativação leva ao aumento do cortisol plasmático, que eleva o metabolismo energético e estimula a ingestão de alimentos (24). A ansiedade causada pelo estresse tende a levar à busca de alimento como conforto, em uma tentativa de atender à necessidade energética da rede de resposta ao estresse crônico (24).
Relação com o Gênero
A prevalência do TCA é estimada em 2%, sendo mais frequente em mulheres (1,5 vezes mais que em homens), embora estudos recentes indiquem uma mudança nessa proporção (27,29). É a desordem alimentar mais frequente em homens, com uma taxa de 4:6 entre homens e mulheres, em contraste com a anorexia e bulimia (1:9) (2).
Em mulheres, o efeito do estrogênio durante a puberdade parece facilitar o desenvolvimento da compulsão em geneticamente vulneráveis (2). Os sintomas e a frequência dos episódios são elevados durante a fase lútea (2). Mulheres com TCA demonstraram menor sensibilidade ao sistema de recompensa, maior déficit de atenção e tomada de decisão, além de alterações nas funções cerebrais associadas à impulsividade (2). Níveis elevados de progesterona e baixos níveis de estradiol foram associados a um aumento da compulsão alimentar e do “comer emocional” (2). A baixa de estradiol e progesterona também está associada a uma maior desregulação dos episódios de compulsão alimentar.
Entre as mulheres, a compulsão alimentar é associada a menarca precoce, disfunção menstrual, partos com bebês de alto peso ao nascer e aumento na duração dos estágios 1 e 2 do trabalho de parto (2).
Diagnóstico e Comorbidades
Critérios Diagnósticos (DSM-5)
O diagnóstico do TCA é baseado no DSM-5 (20) e inclui:
- Recorrência de episódios de compulsão (o mesmo critério da bulimia nervosa).
- Os episódios de compulsão estão associados a pelo menos três das seguintes características:
- Comer com velocidade anormal.
- Comer até se sentir mal de tão cheio.
- Comer grandes quantidades mesmo sem sentir fome física.
- Comer sozinho por vergonha.
- Sentir-se mal, envergonhado ou deprimido após comer.
- Deve haver algum evento estressor antes do episódio compulsivo.
- A compulsão deve ocorrer pelo menos uma vez por semana nos últimos 3 meses.
- A compulsão não é associada a um comportamento compensatório posterior.
Alguns autores têm proposto mudanças nos critérios diagnósticos do DSM-5 devido a fatores subjetivos, sugerindo uma autoavaliação baseada no peso e na forma do corpo, que parece diferenciar obesos com e sem TCA, sendo uma característica central dos transtornos alimentares (25).
Pacientes com TCA podem ter episódios compulsivos grandes, que podem ser mascarados por “exageros alimentares” comuns (19). Alguns pacientes também possuem um perfil mais “beliscador”, tornando o episódio de compulsão menos objetivo, mas, em um período maior, é possível perceber a ingestão de uma quantidade de comida muito maior em comparação com outras pessoas (19).
Níveis de Gravidade da Compulsão (DSM-5)
- Suave: 1 a 3 episódios/semana (28,29).
- Moderado: 4 a 7 episódios/semana (28,29).
- Severo: 8 a 13 episódios/semana (28,29).
- Extremo: 14 ou mais episódios/semana (28,29).
Diagnóstico Diferencial
No Transtorno da Compulsão Alimentar, deve-se considerar o diagnóstico diferencial com:
- Bulimia Nervosa.
- Hipotireoidismo.
- Síndrome do Comer Noturno.
- Outras patologias psiquiátricas (29).
- É importante diferenciar o TCA do Vício Alimentar, pois isso influencia diretamente o tratamento (20).
Comorbidades Psiquiátricas
A maioria dos pacientes diagnosticados com TCA (67%-79%) apresenta ao longo da vida pelo menos uma comorbidade psiquiátrica, sendo as desordens de humor e ansiedade as mais prevalentes (1,28,29). Quatro de cada cinco pacientes adultos com TCA apresentam ao menos uma desordem psiquiátrica ao longo da vida (2).
Entre as condições psiquiátricas observadas: 65% com desordens de ansiedade, 46% com desordens de humor, 43% com desordens de impulsividade e 25% com abuso de substâncias (28). Alguns estudos sugerem uma associação direta entre sintomas depressivos e a compulsão alimentar (1). Indivíduos com TCA, que vivenciam experiências estressoras, reagem emocionalmente de forma diferente de pessoas sem o transtorno. Eles reportam mais eventos negativos e menor capacidade de tolerar um “humor” negativo (1).
Comorbidades Clínicas e Consequências
O TCA é um fator de risco independente para o desenvolvimento da síndrome metabólica e obesidade (2). As consequências de longo prazo da compulsão alimentar são significativas (21). Em um grupo de adultos com TCA, 71% apresentavam um IMC > 30, e mais de 25% das crianças e adolescentes com sobrepeso e obesidade associavam perda de controle e compulsão na hora de comer (22).
Pessoas com TCA geralmente apresentam marcadores inflamatórios ligados à síndrome metabólica, com risco aumentado de morbidade e mortalidade (22). Uma pessoa com TCA tem 13 vezes mais chances de desenvolver Diabetes Mellitus Tipo 2 (DM2), e 25% dos pacientes diabéticos apresentam o transtorno (22). Em pacientes bariátricos, o diagnóstico de TCA é o segundo mais prevalente, atrás apenas da depressão (22). Indivíduos obesos com TCA apresentaram déficits na flexibilidade cognitiva, memória de trabalho e resolução de problemas (23). Pacientes com TCA foram associados a um maior risco de diabetes, colesterol alto, triglicerídeos elevados e hipertensão (28).
Efeitos Gastrointestinais
Pacientes com compulsão frequentemente relatam refluxo e azia, disfagia, inchaço abdominal, dor abdominal, diarreia, constipação e urgências do trato gastrointestinal inferior (22). Doenças autoimunes, como a doença de Crohn, podem ser mais prevalentes em pacientes compulsivos (22).
Efeitos Nutricionais
A análise da alimentação de pessoas com compulsão demonstrou um maior consumo de carboidratos e açúcar, com elevados níveis de gordura e baixos níveis de proteína (22). Dietas ricas em gorduras são associadas a um baixo consumo de vitaminas A, C e folato (22). Dietas com alto consumo de bebidas açucaradas foram associadas a menor consumo de leite, o que reduz a ingestão de cálcio e vitamina D (22).
A vitamina D em pessoas obesas tende a ficar sequestrada no tecido adiposo (22). É comum que essas pessoas escondam seu corpo, diminuindo ainda mais a exposição ao sol (22).
Relação com o Câncer
Existem diversos fatores que podem associar o TCA ao câncer, sugerindo uma possível relação entre as duas condições (22).
Relação com o Tabagismo
Pessoas com TCA apresentam maior dificuldade para parar de fumar. Quando param, tendem a ter um ganho de peso ainda maior e são mais propensas a fumar durante a gravidez (22).
Saúde Reprodutiva
Desordens menstruais, como amenorreia, oligomenorreia e transtorno disfórico pré-menstrual, estão associadas ao TCA (22). A relação entre fertilidade e o transtorno ainda não foi devidamente estudada, mas a obesidade e a síndrome metabólica estão associadas à subfertilidade (22).
TCA e Gestantes
Ao contrário de outros transtornos alimentares (como bulimia e anorexia), em que a gravidez pode conferir certa proteção, na compulsão ela é um fator de risco (22). Gestantes com TCA têm risco aumentado para ganho de peso excessivo e maior risco de uso de tabaco (22). Essas gestantes tendem a consumir menores quantidades de folato, potássio e vitamina C, gerando problemas de formação fetal, somados a um maior consumo de cafeína, que aumenta o risco para aborto espontâneo (22). Após o parto, pacientes com TCA têm maior risco para a depressão pós-parto (22).
TCA e Sono
Existem uma série de anormalidades do sono em pessoas com TCA (22). A síndrome do comer noturno é relativamente frequente (15-20% dos pacientes), e está associada a disforia, insônia e anorexia matinal (22). A obesidade e a compulsão tendem a estar associadas a um sono de curta duração (24).
TCA e Saúde Óssea
Doenças ósseas são consequências de longo prazo da compulsão. Isso ocorre devido ao menor consumo de cálcio, menor controle alimentar e menor exposição à vitamina D, além do excesso de peso, níveis aumentados de gordura e de cortisol, que estão relacionados à menor densidade mineral óssea (22).
Características Comuns dos Pacientes com TCA
- Não reconhecem seu problema central: Buscam tratamento para tudo, menos para a compulsão (19).
- Baixa autoestima: Não reconhecem seus méritos/conquistas e têm dificuldade em cuidar de si (19).
- Impulsivos: Apresentam dificuldade de controle, muitas vezes não percebem exageros (19).
- Desorganizados: Têm grande dificuldade no planejamento alimentar e em perceber gatilhos (19).
- Problemas com imagem corporal: Não apresentam uma distorção, mas depreciam sua própria imagem (19).
- Sofrimento em relação ao comportamento alimentar: Sentem-se desconfortáveis com o descontrole (19).
As atividades ideativas, responsáveis pelo pensamento lógico e sua flexibilidade, apresentaram déficits na população com TCA, o que pode explicar a dificuldade de perder peso e a adesão a dietas (23). A percepção da imagem corporal e a preocupação com o ideal de corpo saudável podem contribuir para o início e a manutenção de transtornos alimentares. Estudos apontam que a predominância do TCA em indivíduos insatisfeitos com o peso e a aparência foi aproximadamente 4 vezes maior (23). Além disso, principalmente em mulheres, há um certo receio a palavras relacionadas a excesso de gordura, tamanho do corpo e peso (28).
Tratamento do Transtorno da Compulsão Alimentar
O tratamento do TCA requer uma abordagem multidisciplinar, com a psicoterapia como primeira linha, principalmente a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) (2). A associação com médicos para o uso e controle de medicamentos (antidepressivos e antiepiléticos) e um controle nutricional e de peso também são importantes (2). Pacientes diagnosticados com TCA devem ter um acompanhamento médico geral para observar questões como diabetes, hipertensão, dislipidemia, dores, desordens do sono, desordens intestinais, asma e, em mulheres, a função reprodutiva (2). É fundamental que a terapia cognitiva priorize a diminuição dos episódios compulsivos, sendo o emagrecimento um objetivo secundário (21,29).
Terapia Farmacológica
Os benefícios da farmacoterapia não parecem perdurar após o término da medicação (21).
- Lisdexamfetamina (LDX): O único medicamento devidamente aprovado para o tratamento da compulsão alimentar pela FDA (2,28). É amplamente utilizado no tratamento do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). LDX em doses de 50-70 mg (não 30 mg) reduziu significativamente os sintomas da compulsão alimentar (2). A DEA o considera um fármaco com risco de abuso e dependência, necessitando de monitoramento (2). A recomendação é o uso de uma vez ao dia, pela manhã, com ou sem jejum, não sendo recomendado à noite devido ao potencial de causar insônia (28). Efeitos na redução da compulsão foram observados com uma semana de tratamento e perduraram até a 12ª semana de estudo (28). Esse medicamento apresenta ação anorexígena por meio da dopamina, agindo no núcleo lateral do hipotálamo (29). Os efeitos colaterais mais comuns foram boca seca e insônia (28).
- Inibidores da Recaptação da Serotonina (ISRS): Fluoxetina, fluvoxamina e sertralina são considerados os melhores agentes farmacológicos para a compulsão (21,27). No entanto, os resultados são relevantes apenas nas primeiras semanas de tratamento, e estudos mostram uma elevada resposta ao placebo (70%) (29).
- Dasotralina: Um medicamento ainda em estudo. É um inibidor da recaptação de dopamina e norepinefrina (28). Possui meia-vida longa, exigindo apenas uma dose por dia. Doses de 4-6 mg/dia apresentaram resultados de até 4 semanas sem episódios de compulsão (28). Os efeitos colaterais mais comuns incluem insônia, redução de apetite e perda de peso (28).
Psicoterapia
Estudos demonstram que tanto a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) quanto a Terapia Comportamental Dialética (TCD) foram associadas à redução da frequência dos episódios de compulsão alimentar (29). A TCC produziu melhoras significativas nos sintomas de depressão e na concepção da imagem corporal, além de uma acentuada perda de peso (23).
Terapia Nutricional
As recomendações nutricionais de macro e micronutrientes seguem o padrão da população em geral. No entanto, não são indicadas restrições calóricas em um primeiro momento, devido à sua associação com o aumento de quadros compulsivos.
Aprender a comer: Uma estratégia com bons resultados foca em capacitar os pacientes para que aprendam a fazer escolhas alimentares saudáveis, incluindo todos os alimentos de forma contextualizada e em quantidades suficientes para suprir seus sinais internos de fome, saciedade e desejo, separando a comida das emoções, sem a utilização de dietas restritivas (19). A base da orientação nutricional deve ser focada em ordenar e distribuir as refeições de forma regular ao longo do dia (29).
Suplementação e Nutrientes Específicos
A deficiência de algumas vitaminas e minerais tem sido implicada na patologia dos transtornos alimentares devido ao papel essencial de alguns nutrientes no sistema neuroendócrino (26). Acredita-se que uma dieta pobre pode ser tanto causa quanto consequência de uma desordem alimentar (26). Nutrientes como triptofano, vitamina B6, ácido fólico, fenilalanina, tirosina, histidina, colina e ácido glutâmico são essenciais na produção de neurotransmissores como serotonina, dopamina e norepinefrina, que regulam o humor, apetite e cognição (26). Além deles, o ômega-3 influencia na regulação da neurotransmissão dopaminérgica e serotonérgica, impactando a depressão e a ansiedade (26).
- Vitamina D: Baixos níveis de vitamina D são comuns nesses pacientes, devido a baixo consumo e baixa exposição solar. Recomenda-se avaliar a vitamina D.
- Zinco: A deficiência de zinco já foi identificada como um alvo no tratamento da anorexia devido ao seu papel na regulação do apetite e do sabor dos alimentos (22). O zinco também tem sido estudado por seus benefícios na resistência à insulina e na obesidade (22). Recomenda-se ajustar a ingestão de zinco.
- Proteínas: Recomenda-se ajustar a ingestão de proteínas.
Fitoterapia
- Rhodiola Rosea: Um estudo em ratos encontrou benefícios contra a compulsão alimentar com extrato de Rhodiola (3% de rosavina e 3,12% de salindrosídeo) em doses de 10 ou 20 mg/kg antes da ingestão alimentar. Ambas as dosagens diminuíram a compulsão alimentar, sendo a maior mais efetiva (3).
- Passiflora incarnata: Observaram-se efeitos nos sistemas opioidérgicos e gabaérgicos, interferindo em mecanismos comportamentais, associados à oleamida (agonista dos receptores GABA e CB1) (4). Modula o sistema gabaérgico, incluindo a afinidade para os receptores GABA A e GABA B, além de efeitos na captação do GABA (5). Na prática, a passiflora tem ação interessante na compulsão alimentar, principalmente relacionada à ansiedade. Outro estudo mostrou que a oleamida, atuando no núcleo accumbens, com ação agonista nos receptores CB1 e 5-HT2C, modula o comportamento alimentar (6). Um estudo avaliou que o extrato de passiflora por 14 dias melhorou sintomas mentais como disforia, ansiedade, agitação, irritabilidade e o desejo por substâncias que atuassem no sistema de recompensas (7).
- Griffonia simplicifolia: As sementes dessa planta são a principal fonte de 5-HTP (componente intermediário para a produção de serotonina), que tem a capacidade de ultrapassar a barreira hematoencefálica e ser convertido a serotonina, regulando o humor, a memória, desordens obsessivo-compulsivas, depressão e ansiedade. Um estudo em animais com suplementação de 5-HTP (98% purificado da fonte vegetal Griffonia simplicifolia) 1, 2 e 4 horas antes da ingestão alimentar, em doses de 50, 100 e 200 mg, resultou em diminuição da ingestão alimentar de maneira dose-dependente (8). Em humanos, a suplementação oral de 5-HTP (100-150 mg) aumentou significativamente o 5-HTP no plasma, sugerindo que pode ser útil no controle da ingestão alimentar excessiva gerada por estresse (8). Um estudo com mulheres com sobrepeso, utilizando suplementação de 5-HTP de Griffonia junto a outros fitoterápicos, reduziu o IMC e dobras cutâneas, além de aumentar a saciedade (9).
- Crocus sativus: Um estudo utilizando extrato patenteado de Crocus sativus (176,5 mg/dia, padronizado em 0,3%) por 8 semanas reduziu a fome e a frequência de beliscadas entre as refeições (16). Outro estudo avaliou o efeito do açafrão no apetite com 30 mg de extrato aquoso do Crocus sativus ou extrato aquoso de crocina por 8 semanas, mostrando redução do IMC e da massa gorda, com diminuição na ingestão energética, sendo o efeito do extrato mais potente do que da crocina isolada (17). No entanto, um estudo com 15 mg duas vezes ao dia em mulheres com sobrepeso e depressão por 12 semanas não encontrou efeitos na redução do desejo alimentar, embora houvesse uma pequena melhora nos escores de depressão (18).
- Ashwagandha (Withania somnifera): O extrato metanólico pode oferecer glicowithanolídeos, melhorando o comportamento obsessivo-compulsivo, com efeito comparado a medicamentos padrões como a fluoxetina. Os autores discutem que um dos possíveis mecanismos seria a inibição da recaptação de serotonina, melhorando sua neurotransmissão pós-sináptica (13). Em camundongos resistentes à leptina, a withaferina A (1,25 mg/kg) por 21 dias reduziu a ingestão alimentar e o peso corporal, atribuídos à melhora da sensibilidade à leptina (14). Outro estudo avaliou 50 indivíduos sob estresse crônico, utilizando 300 mg de extrato de Withania somnifera duas vezes ao dia por 4 e 8 semanas, encontrando uma redução acentuada das pontuações de “alimentação emocional” e “alimentação descontrolada” (15).
- Garcinia cambogia: A planta apresenta efeito de inibição de apetite, associado ao ácido hidroxicítrico, que inibe a recaptação de serotonina, atuando sobre os mecanismos de saciedade. Um estudo avaliou o uso de um produto com Garcinia cambogia (500 mg de extrato seco a 60% de hidroxicítrico), Ascophyllum nodosum (200 mg de extrato de alga marinha) e L-carnitina (20 mg), ou placebo, duas vezes ao dia, 1 hora antes do almoço e jantar, por 2 semanas. Encontrou-se redução na sensação subjetiva de fome e aumento da saciedade, mas sem diferenças na ingestão energética (10). Um estudo com 60 pessoas com sobrepeso, por 8 semanas, utilizando 4500 mg de extrato de Garcinia (60% de hidroxicítrico) teve um aumento na saciedade (11). Uma metanálise encontrou baixos resultados, com a maioria dos estudos sem eficácia, concluindo que a magnitude do efeito é pequena e a relevância clínica incerta (12).
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