Fitoterapia: Conceitos, Aplicações e Legislação no Brasil


Fitoterapia: Conceitos, Aplicações e Legislação no Brasil


Introdução

A fitoterapia representa uma modalidade terapêutica que emprega plantas medicinais em diversas formas farmacêuticas, distinguindo-se pela utilização de complexos fitoquímicos e não de substâncias ativas isoladas.


Conceituação e Uso da Fitoterapia

A fitoterapia é caracterizada como uma forma terapêutica que utiliza plantas medicinais em suas mais variadas formas farmacêuticas, sem o emprego de substâncias ativas isoladas, mesmo que de origem vegetal (1). No Brasil, um medicamento é considerado fitoterápico somente se sua composição não apresentar apenas um ativo isolado, ainda que este seja de origem vegetal (1). É importante ressaltar que a Medicina Tradicional Chinesa, embora utilize plantas, possui conceitos e abordagens distintas da fitoterapia ocidental.

É fundamental remodelar o conceito de que o emprego de plantas medicinais é sinônimo de segurança (1). A fitoterapia atua como auxiliar no tratamento de desequilíbrios pontuais e, portanto, não deve ser confundida com a suplementação de nutrientes, tampouco substituir um plano alimentar adequado (1).


Legislação e Documentos Relevantes

No contexto brasileiro, a fitoterapia é regulamentada por diversas normativas e documentos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), garantindo a qualidade e segurança dos produtos:

  • RDC 26/2014 (5): Dispõe sobre o registro de medicamentos fitoterápicos e o registro e notificação de produtos tradicionais fitoterápicos.
  • RDC 13/2013 (4): Trata das boas práticas de fabricação de produtos tradicionais fitoterápicos.
  • RDC 17/2010 (3): Estabelece as boas práticas de fabricação de medicamentos.
  • Monografia HMPC/EMA (6): Documento com reconhecimento de segurança e eficácia de algumas plantas.
  • Memento Fitoterápico (7): Publicação da Farmacopeia Brasileira (ANVISA 2016).
  • Formulário de Fitoterápicos (8): Publicação da Farmacopeia Brasileira (ANVISA 2022).

Metabolismo Secundário e Compostos Fitoquímicos

No reino vegetal, a maior parte dos compostos químicos produzidos pelas plantas são metabólitos secundários (PSM – plant secondary metabolites) (1). Esses compostos são sintetizados principalmente para a própria defesa da planta, variando de espécie para espécie, pois cada planta responde individualmente às suas interações com o meio ambiente (como situações de estresse e mecanismos de defesa contra predadores), dada sua individualidade química e genética (1).

Os principais grupos de compostos produzidos pelo metabolismo secundário incluem:

  • Heterosídeos glicosídeos
  • Alcaloides
  • Compostos fenólicos (1)

É crucial entender que esses compostos são substâncias não nutritivas e, para o organismo humano, são xenobióticos, ou seja, substâncias estranhas que precisam ser eliminadas. Eles passam por um processo de biotransformação e podem apresentar graus variados de toxicidade (1). Quando absorvidos, esses PSM sofrem processos de farmacocinética (absorção, distribuição, metabolismo, excreção – ADME) e farmacodinâmica, resultando tanto em efeitos positivos quanto em efeitos colaterais (1). Por essa razão, toda planta é considerada tóxica até que se prove o contrário (1).


Formas Farmacêuticas em Fitoterapia

Os fitoterápicos podem ser apresentados em diferentes estados físicos:

  • Sólido: Ex: extrato seco.
  • Semissólido: Ex: extrato mole.
  • Líquido: Ex: extratos fluídicos, tinturas e glicólicos.
  • Gasoso: (1)

A escolha da forma farmacêutica dependerá da otimização da liberação do ativo desejado (1).

Processos de Extração e Prescrição

Dentre os processos de extração mais comuns para as drogas vegetais, destacam-se:

  • Infusões
  • Decocções
  • Macerações

De acordo com a legislação vigente, todos os nutricionistas podem prescrever essas formas (1).

Outras formas farmacêuticas na fitoterapia, que dependem da indústria ou da manipulação, são as tinturas e os extratos secos em pó (padronizados ou não). A prescrição dessas formas é restrita a profissionais com especialização em fitoterapia (1).

Chás

Os chás são considerados a forma mais segura de consumo (2) e promovem um maior consumo de líquidos, o que é benéfico (2).

  • Decocção: Método de extração com maior concentração de princípios ativos. As ervas são fervidas por 5 a 10 minutos, seguidos por 10 minutos de infusão (2).
    • 5 minutos: Indicado para flores e folhas partidas (2).
    • 10 minutos: Indicado para caules, raízes e folhas inteiras (2).
  • Infusão: Consiste na adição de água fervente sobre a erva, seguida de 10 minutos de infusão. É caracterizada pela extração, com água quente, de partes tenras da planta (frescas ou secas), como flores, folhas e inflorescências (1, 2). A infusão pode ser consumida quente ou fria, mas não pode ser reaquecida após esfriar (1). Uma forma de “reaproveitar” a infusão é utilizá-la como base para sucos (1). É o método mais eficaz para a liberação de catequinas (2).
  • Maceração: Tipo de extração a frio, baseado na relação química entre o ativo e o solvente. Certas plantas são deixadas em repouso em um líquido (água, vinho, álcool, óleos) por, no mínimo, 6 horas (1, 2).

Tinturas

As tinturas são divididas em duas categorias (2):

  • Tintura Vegetal: Processo de extração por meio de solução alcoólica ou hidroalcoólica, geralmente utilizando 20% de plantas secas em relação ao peso total da tintura (1, 2).
  • Tintura Mãe: Preparações líquidas que utilizam álcool como solvente em plantas frescas. Nessa categoria, a concentração de planta é de 10% (2). A tintura mãe segue a padronização de 10% e é a base da produção de homeopatias (1, 2).

Xaropes

São preparações resultantes da decocção de plantas com adição de sacarose (açúcar). Utilizam pelo menos 50% de açúcar, o que inibe o crescimento de microrganismos (2).

Pós ou Drogas Pulverizadas

Consistem na moagem da planta seca, o que facilita a liberação dos ativos e sua dosificação (1).

Extratos Vegetais

Preparações concentradas obtidas de drogas vegetais secas ou frescas por meio de um solvente apropriado, seguidas de evaporação parcial ou total e ajuste na concentração (1). Os extratos vegetais podem ser ou não padronizados no fitoquímico mais presente e são utilizados na produção de tinturas, comprimidos e cápsulas, assim como os pós (1).


Suplementação e Informações Cruciais

O uso de fitoterápicos deve ter data de início e fim. O excesso de algumas substâncias, como os alcaloides, pode causar danos ao organismo.

Tipos de Produtos Fitoterápicos (ANVISA)

A ANVISA classifica os produtos em fitoterapia em três tipos:

  • Medicamento Fitoterápico:
    • Sua fabricação segue a RDC 17/2010 (3).
    • Apresenta comprovação de segurança e eficácia baseada em estudos clínicos, com indicações precisas (3).
    • Conforme a RDC 26/2014, são “obtidos com emprego exclusivo de matérias-primas ativas vegetais cuja segurança e eficácia sejam baseadas em evidências clínicas e que sejam caracterizadas pela constância de suas qualidade” (5).
  • Produto Tradicional Fitoterápico:
    • Segue a RDC 13/2013 (4).
    • São produtos liberados com base em estudos observacionais, demonstrando segurança ao longo do tempo (4). Não apresentam bula (4).
  • Preparação Magistral: Formulações manipuladas individualmente para um paciente específico.

Padronização de Medidas Caseiras

Para a dosificação e orientação do paciente, são utilizadas as seguintes padronizações:

  • Colher de sopa: 15 mL / 3 g
  • Colher de sobremesa: 10 mL / 2 g
  • Colher de chá: 5 mL / 1 g
  • Colher de café: 2 mL / 0,5 g
  • Xícara de chá/copo: 150 mL
  • Xícara de café: 50 mL
  • Cálice: 30 mL

Padronização de Cápsulas (Farmacopeia Americana)

A padronização das cápsulas baseia-se em seu volume e capacidade de massa, influenciando a conveniência de uso:

TAMVolume (mL)Massa (mg)
0001,36600-1430
000,95390-975
00,67325-715
10,48227-510
20,37195-390
30,27130-325
40,2097-260
50,1365-130

Quanto menor o tamanho da cápsula, maior tende a ser a conveniência para o paciente.


Informações Essenciais no Uso de Plantas

Para uma prescrição segura e eficaz em fitoterapia, é fundamental considerar:

  • Nome da espécie (científico).
  • Parte utilizada da planta.
  • Matéria-prima vegetal.
  • Forma farmacêutica.
  • Constituintes químicos da planta.
  • Padronização do marcador (se aplicável).
  • Posologia (indicação, dose, frequência, duração).
  • Farmacocinética: ADME (Absorção, Distribuição, Metabolismo, Excreção).
  • Farmacodinâmica (mecanismo de ação).
  • Reações adversas.
  • Interações medicamentosas.
  • Contraindicações.
  • Precauções.
  • Advertências.
  • Sobredose/toxicidade.

Referências Bibliográficas

  1. Silva, S. M. C. S.; Mura, J. D. P. Tratado de alimentação, nutrição & dietoterapia. 3. ed. São Paulo: Editora Pitaya, 2016. 1308 p.
  2. Hirschbruch, M. D. Nutrição esportiva – Uma visão prática. 3. ed. Barueri – SP: Manole, 2014. 496 p.
  3. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). RDC 17/2010: Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos. Brasília, DF: ANVISA, 2010.
  4. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). RDC 13/2013: Boas Práticas de Fabricação de Produtos Tradicionais Fitoterápicos. Brasília, DF: ANVISA, 2013.
  5. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). RDC 26/2014: Registro de Medicamentos Fitoterápicos e Registro e Notificação de Produtos Tradicionais Fitoterápicos. Brasília, DF: ANVISA, 2014.
  6. HMPC/EMA. Monografias com reconhecimento de segurança e eficácia de algumas plantas.
  7. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Memento Fitoterápico. Farmacopeia Brasileira. Brasília, DF: ANVISA, 2016.
  8. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Formulário de Fitoterápicos. Farmacopeia Brasileira. Brasília, DF: ANVISA, 2022.

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