Doença de Alzheimer (DA): Fisiopatologia, Diagnóstico, Tratamento e Abordagens Nutricionais
Introdução
A Doença de Alzheimer (DA) é a forma mais comum de demência entre os idosos e um grave problema de saúde pública (4). Caracterizada por um comprometimento cognitivo e funcional progressivo, a DA se manifesta com sintomas que evoluem ao longo do tempo. A idade é o principal fator de risco, com a prevalência aumentando de 2% em indivíduos entre 65–69 anos para 20% em pessoas com 85-89 anos (1).
Fisiopatologia
A DA é caracterizada por um comprometimento cognitivo e funcional progressivo (3). A doença está associada ao encolhimento cerebral e à perda de neurônios, especialmente no hipocampo e na parte basal do prosencéfalo (1). A perda de neurônios colinérgicos no hipocampo e no córtex frontal é uma característica marcante da doença e é considerada a causa da deficiência cognitiva e da perda de memória de curto prazo (1). A razão para a perda seletiva dos neurônios colinérgicos resultante da formação de placas de β-amiloide não é conhecida (1).
Dois aspectos microscópicos são característicos da doença:
- Placas amiloides extracelulares: Depósitos amorfos da proteína β-amiloide (Aβ) no espaço extracelular (1).
- Emaranhados neurofibrilares intraneuronais: Agregados de filamentos de uma forma fosforilada da proteína associada ao microtúbulo (Tau) (1).
Ambos os depósitos são agregados proteicos resultantes do enovelamento incorreto de proteínas nativas (1). Essas alterações se correlacionam com o desequilíbrio do estado redox, neuroinflamação, alterações mitocondriais e perda de neurônios, especialmente os colinérgicos, e de conexões sinápticas (4). Essas mudanças ocorrem principalmente no hipocampo e no córtex, incluindo a amígdala e o núcleo basal de Meynert (4).
Acredita-se que o aparecimento precoce da proteína amiloide prediz o desenvolvimento da DA, embora os sintomas possam levar muitos anos para se manifestar (1). O processamento alterado do precursor da proteína amiloide (PPA) foi implicado na patogênese da DA (1).
Sinais e Sintomas
Os sintomas clínicos consistem no comprometimento cognitivo em todos os domínios, geralmente iniciando com transtornos de memória, principalmente para fatos recentes (memória episódica) (2, 4). A deterioração progressiva atinge a atenção, concentração, linguagem, gnosias, praxias e funções executivas (2, 4).
Sintomas comuns incluem dificuldade em recordar nomes e eventos recentes, perda de funções executivas, apatia e depressão (1). A deterioração da linguagem (principalmente a anomia), distúrbios de planejamento e habilidades visoespaciais surgem com a evolução da demência (4). A depressão é um sintoma habitual na fase inicial da DA, enquanto a psicose franca, agitação e desinibição comportamental são frequentes em estágios mais avançados (4).
Evolução Clínica
Uma vez diagnosticada, a DA evolui gradualmente por fases, que são classificadas segundo os critérios de estadiamento propostos pelo Clinical Dementia Rating (CDR), dividindo a doença em fases leve, moderada e grave (2).
Tratamento Farmacológico
O tratamento da DA visa reduzir temporariamente os sintomas, mas não altera o curso subjacente da doença (2). Atualmente, os fármacos aprovados para o tratamento da DA são os inibidores da colinesterase e a memantina (1).
- Inibidores da colinesterase: Compostos como donepezila, rivastigmina e galantamina demonstraram melhorias modestas em testes de memória e cognição, mas sem um efeito sustentado na progressão da doença ou melhora em outras medidas comportamentais e psicológicas que afetem a qualidade de vida (1).
- Memantina: Um antagonista oralmente ativo dos receptores NMDA (1). Produz uma ligeira melhora cognitiva nas formas moderadas e graves da DA (1). Acredita-se que funcione pela inibição seletiva da ativação excessiva e patológica do receptor NMDA, preservando a ativação fisiológica (1). Apresenta uma meia-vida longa, e os efeitos adversos incluem cefaleia, tontura, sonolência, constipação, falta de ar e hipertensão (1).
Abordagens Nutricionais e Complementares
Aspectos Nutricionais
Investigações sobre o papel da alimentação na redução do risco de Alzheimer sugerem que o consumo de folato, antioxidantes (especialmente a vitamina E) e ácidos graxos poli-insaturados (destacando-se o ômega-3) está associado a efeitos protetores (4).
- Ômega-3: A ingestão de ômega-3 correlaciona-se positivamente com a redução do risco de DA e outras doenças neurodegenerativas (4). O ácido docosa-hexaenoico (DHA), o maior constituinte de ômega-3 no cérebro, promove a plasticidade sináptica e a neurogênese no hipocampo, otimizando a formação de redes sinápticas (4). O DHA também reduz a formação das placas senis ao inibir a agregação da proteína Aβ (4).
- Antioxidantes: Dado o papel do estresse oxidativo na DA, o alto consumo de vitamina E e C tem sido associado a um menor risco (4). A suplementação combinada dessas vitaminas demonstrou diminuir a prevalência e a incidência da DA, embora essa associação não tenha sido observada quando suplementadas isoladamente (4).
- Curcumina: Este fitoquímico da cúrcuma é promissor para o desenvolvimento de terapias para a DA (4). Em animais, demonstrou inibir a agregação de Aβ e a formação de emaranhados (4).
- Selênio: Um estado nutricional deficiente em selênio está associado a um risco aumentado de DA (4). O aporte adequado de selênio, por meio de fontes como a castanha-do-Brasil, demonstrou melhorar o estado de selênio e o desempenho cognitivo em idosos com declínio cognitivo leve (4). A selenoproteína glutationa peroxidase 4, regulada pelo selênio, é crucial na prevenção da morte celular por ferroptose, um mecanismo de neurodegeneração (4).
Terapia Nutricional por Estágio
- Fase Leve: A abordagem nutricional deve focar em retardar a perda sináptica e evitar a redução do peso (2). Um estudo com suplementação de EPA, DHA, colina, uridina, vitaminas E, C, B6, B12, ácido fólico, zinco e selênio demonstrou melhora significativa na memória de pacientes com DA leve (2).
- Fase Moderada: Pacientes neste estágio podem apresentar alterações de comportamento que afetam o estado nutricional, como recusa alimentar, voracidade, dificuldade para se manter sentado, problemas de mastigação e deglutição, e sonolência durante as refeições (2). É importante estimular o paciente a se alimentar sozinho para não perder o hábito (2).
- Fase Grave: Nessa fase, a atenção da equipe de saúde é constante, devido à significativa redução de peso e disfagia neurogênica (2). A consistência pastosa dos alimentos é geralmente mais aceita (2). Fatores como fraqueza da musculatura oral/lingual, diminuição do olfato/paladar e o uso de fármacos que alteram a saliva e a sensibilidade oral podem dificultar a alimentação (2). O uso de espessantes alimentares é um aliado importante para diminuir o risco de aspiração, especialmente de líquidos (2). Com a evolução da disfagia, a suspensão da alimentação oral pode ser indicada (2). O uso de sondas nasogástricas ou nasoentéricas é desaconselhável, pois pacientes com demência tendem a removê-las por reflexo (2).
Alzheimer e Distúrbios do Sono
Alterações do sono e do ciclo sono-vigília são comuns na DA e progridem com a doença, podendo estar presentes desde o início (3). O depósito amiloide no estágio pré-clínico da DA está associado a uma pior qualidade do sono (3). A fragmentação do sono, cochilos diurnos e o aumento do tempo acordado durante a noite podem evoluir para uma inversão do ritmo dia-noite (3).
O tratamento das alterações do sono na DA tem resultados decepcionantes, e a maioria das intervenções farmacológicas disponíveis é ineficaz (3). Por outro lado, abordagens não farmacológicas têm demonstrado benefícios mais duradouros e com menos efeitos adversos (3):
- Higiene do sono (3)
- Exposição à luz solar (3)
- Evitar cochilos diurnos (3)
- Atividade física e socialização (3)
- Terapia cognitivo-comportamental (3)
- Uso do CPAP (Continuous Positive Airway Pressure) em casos de apneia do sono (3).
Referências Bibliográficas
- RITTER, J. M. et al. Rang & Dale Farmacologia. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2020. 789 p.
- SILVA, M. de L. do N.; MARUCCI, M. de F. N.; ROEDIGER, M. de A. Tratado de Nutrição em Gerontologia. 1. ed. Barueri: Manole, 2016. 507 p.
- BACELAR, L. R. P. et al. III Consenso Brasileiro de Insônia • 2013: Do Diagnóstico ao Tratamento. São Paulo, 2013.
- COMINETTI, C.; COZZOLINO, S. Bases bioquímicas e fisiológicas da nutrição nas diferentes fases da vida, na saúde e na doença. 2. ed. Manole, 2020. 1369 p.