Otimização da Saúde Pré-Concepção e Gestacional: Abordagens Nutricionais e de Estilo de Vida
Introdução
A fase que antecede a concepção e o período gestacional são cruciais para a saúde materno-infantil. A adoção de um estilo de vida saudável e a otimização do estado nutricional são pilares fundamentais para prevenir complicações e promover desfechos gestacionais favoráveis, influenciando a saúde do futuro indivíduo a longo prazo.
O Período Pré-Concepção
O período considerado “pré-concepção” abrange até 1 ano antes da tentativa de engravidar, momento em que ocorre o cessamento dos métodos contraceptivos (1). Contudo, os 3 meses que antecedem a gravidez são os mais críticos para otimizar a saúde e o estado nutricional (1,2).
Terapia Nutricional e Planejamento para a Fertilidade
Homens
Em homens, um IMC elevado tem sido associado a níveis mais baixos de testosterona (3). Para a otimização da fertilidade masculina, recomenda-se uma dieta de baixo índice glicêmico, com a inclusão de produtos lácteos, redução do consumo de gorduras trans e ferro, além da prática de atividade física moderada (3). Um esperma mais saudável está associado à abstenção de cigarro e álcool, bem como a uma dieta rica em zinco, ácido fólico e antioxidantes (3).
Controle do Peso Corporal
Mulheres com obesidade apresentam maior probabilidade de pré-diabetes, diabetes pré-concepcional não diagnosticada ou hiperglicemia prolongada, embora haja um menor risco de anomalias congênitas (3). É ideal que a mulher inicie a gravidez com um IMC entre 18-25 kg/m² (1). A obesidade na pré-concepção tem sido associada a um aumento no risco de complicações na gestação, no parto, na amamentação e até mesmo à morte materna (2,5). Uma redução de 10% do IMC no período pré-concepção foi associada a um menor risco de pré-eclâmpsia, diabetes gestacional e parto prematuro, entre outras complicações (2).
Suplementação de Micronutrientes Essenciais
Polivitamínicos
Embora algumas revisões sistemáticas sugiram que o uso de polivitamínicos durante a gestação produza efeitos modestos na saúde da criança, a real necessidade dessa suplementação e a eficácia da suplementação individualizada ainda são discutidas (2,4). No entanto, devido às necessidades aumentadas de diversos nutrientes e à frequência de baixa ingestão dietética, a suplementação com um polivitamínico pode ser mais vantajosa do que a suplementação de nutrientes isolados em gestantes (4).
Ferro
A recomendação para gestantes é de 27 mg/dia, com um limite máximo de 45 mg/dia (6). A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda a suplementação de 30-60 mg/dia de ferro elementar durante a gestação (1). Contudo, a suplementação de ferro pode causar irritação gastrointestinal, constipação e diarreia, não sendo recomendada sem a devida comprovação de deficiência (4). Não há evidências suficientes para justificar a suplementação universal de ferro em populações bem nutridas (7).
Ácido Fólico
A recomendação de ácido fólico é de 400-600 mcg/dia (1,3,4,6,7), com um limite máximo de 1000 mcg/dia (6). A OMS preconiza que mulheres em idade reprodutiva iniciem a suplementação com 400 mcg/dia de ácido fólico pelo menos 1 mês antes das tentativas de engravidar e continuem até o final do primeiro trimestre (1,7). Meta-análises indicam que esse valor pode ser obtido tanto por meio de multivitaminas quanto de suplementos específicos (1). Em casos de deficiência comprovada, a suplementação pode chegar a 4 mg/dia (3,6). Alguns estudos chegam a recomendar 5 mg/dia de folato para mulheres obesas (5).
Ômega-3
A recomendação é de 1,4 g/dia (6). É sugerido um mínimo de 300 mg/dia de DHA para gestantes, valor que pode ser superior. Em gestações de gêmeos, o valor varia entre 300-500 mg (3).
Iodo
As recomendações de iodo variam de 150-250 mcg/dia (1,6,7), com um limite máximo de 1100 mcg/dia (6). A OMS recomenda a ingestão diária de 150-250 mcg/dia de iodo no período pré-gestacional (1). O iodo é essencial para a produção dos hormônios tireoidianos, cujas necessidades aumentam na gravidez, sendo cruciais para o desenvolvimento cerebral e do sistema nervoso da criança (1). Mesmo com a iodização do sal, muitos países ainda apresentam deficiências de iodo, justificando a suplementação na gravidez (1).
Vitamina D
As recomendações de vitamina D são de 15 mcg/dia (6), com um limite máximo de 100 mcg/dia (6) e um limite superior de ingestão de 50 mcg/dia (6). (Nota: 1 mcg = 40 UI). Alguns estudos sugerem a ingestão de 10 mcg (400 UI) desde a pré-concepção até o final do primeiro trimestre (4). Na Inglaterra, a suplementação é recomendada da gestação até a lactação (4). Estudos indicam a suplementação para indivíduos negros ou aqueles com pouca exposição solar diária (4). A deficiência de vitamina D, tanto em homens quanto em mulheres, está associada à infertilidade (3). No entanto, não há evidências suficientes para justificar a suplementação rotineira de vitamina D em todas as populações (1).
Modificações de Estilo de Vida
Cafeína
Alguns estudos recomendam a redução da ingestão de cafeína no período pré-concepção e, principalmente, durante a gestação (1,2). O consumo de cafeína (quantidade não especificada) tem sido associado a efeitos na fertilização in vitro, aumento do tempo até a gestação e diminuição da fertilidade (1). O consumo de mais de 300 mg/dia de cafeína foi associado ao aborto espontâneo, embora com evidências limitadas (1). É essencial ter cuidado com o excesso de cafeína e bebidas cafeinadas (energéticos).
Álcool
Não há consenso sobre a quantidade segura de álcool no período pré-concepção e durante a gestação; portanto, a abstinência é recomendada nesses períodos (1,2). Embora a influência do álcool na fertilidade ainda não seja totalmente clara, seus efeitos na má formação fetal, nascimentos prematuros e associação com a depressão durante a gestação são bem estabelecidos (1).
Tabagismo
É um consenso internacional que a mulher deve parar de fumar assim que decidir engravidar, e, se necessário, buscar terapia para esse fim (1). Fumar durante a gravidez aumenta o risco de complicações como aborto espontâneo, má formação congênita e morte súbita, entre outros (1,2).
Transtornos Alimentares
Mulheres com anorexia nervosa e bulimia podem apresentar amenorreia, infertilidade e taxas reduzidas de gravidez (3).
Atividade Física
A prática de atividades físicas durante a pré-concepção está associada a uma gama de efeitos benéficos, incluindo a melhora da fertilidade, além de outros benefícios gerais para a saúde (1). Níveis mais elevados de atividade física na pré-concepção foram associados a um menor risco de diabetes gestacional (2).
Considerações Fisiológicas e Fatores de Risco
Ambiente Materno e Saúde Fetal
Estudos demonstram uma associação entre o ambiente materno e a suscetibilidade do feto a desenvolver doenças crônicas como síndrome metabólica, diabetes tipo 2 e doenças coronarianas mais tarde na vida (1).
Fatores de Risco Pré-Gravidez
Os principais fatores de risco a serem considerados no período pré-gravidez incluem:
- Diabetes
- Hipotireoidismo
- Obesidade
- Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs)
- HIV / Síndrome da imunodeficiência
- Consumo inadequado de álcool
- Tabagismo
- Deficiência de ácido fólico
- Deficiência de ferro
- Uso de Isotretinoína (para acne)
- Uso de drogas antiepiléticas
- Uso de anticoagulantes orais
Hormônios da Tireoide
A exigência de hormônios da tireoide em gestantes aumenta entre 10-40% (3). Gestantes com hipotireoidismo tratado devem aumentar seus níveis de T4 para prevenir a hipotireoxinemia transitória, associada ao nascimento prematuro ou baixo peso ao nascer (3).
Referências Bibliográficas
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- EXCELLENCE, C. Vitamin supplementation in pregnancy. Drug and Therapeutics Bulletin, v. 54, n. 7, p. 81–84, 2016.
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