Cimicifuga racemosa: Potencial Terapêutico na Síndrome Climatérica e Distúrbios Menstruais
Introdução
A Cimicifuga racemosa, popularmente conhecida como cimicífuga ou black cohosh, é uma planta perene nativa da América do Norte. Seu rizoma (caule subterrâneo) é amplamente utilizado em suplementos e fitoterápicos, principalmente para o manejo de sintomas associados à síndrome climatérica, como a menopausa, e distúrbios menstruais como a TPM e dismenorreia.
Aspectos Botânicos e Fitoquímicos
Nomenclatura e Parte Utilizada
O nome científico da planta é Cimicifuga racemosa, também conhecida como Actaea racemosa. Popularmente, é referida como cimicífuga, acteia racemosa ou black cohosh. O rizoma é a parte da planta utilizada para a extração de seus compostos bioativos (1). Os rizomas são tipicamente colhidos no início do outono, secos e propagados na primavera para novas plantas (4).
Compostos Bioativos
O rizoma da Cimicifuga racemosa é rico em uma variedade de compostos bioativos, incluindo:
- Glicosídeos triterpênicos: Acteína, racemosídeo e cimifugosídeo (1).
- Flavonoides (1).
- Óleo essencial (1).
- Ácidos orgânicos: Acético, butírico, fórmico, isoferúlico e salicílico (1).
- Ácidos graxos: Oleico e palmítico (1).
- Taninos (1).
- Resina: Cimicifugina (1).É importante notar que esta espécie não contém formononetina, caempferol nem genisteína (1).
Ações Farmacológicas e Indicações Clínicas
O uso da Cimicifuga racemosa é de prescrição MÉDICA (1). As principais indicações incluem:
- Síndrome climatérica: Especialmente para pacientes com contraindicações à terapia de reposição hormonal (1).
- TPM (Tensão Pré-Menstrual) e Dismenorreia (1).
TPM e Dismenorreia
Desde a década de 1960, estudos com extratos de cimicífuga em pacientes na menopausa, pré-menopausa e jovens com distúrbios hormonais têm observado resultados interessantes em casos de oligomenorreia, dismenorreia e TPM (1). Posteriormente, descobriu-se que a C. racemosa contém compostos ativos (acteína e cimicifugosídeo) com ações sinérgicas capazes de reduzir os níveis séricos de LH (hormônio luteinizante) e de ligar-se aos receptores de estrogênio (1).
Menopausa
O mecanismo de ação proposto da C. racemosa na menopausa ocorre pela supressão dos efeitos mediados pelo LH (1). Existem evidências indiretas de uma possível atividade mediada pelos receptores dopaminérgicos (D2) (1). Nesse contexto, a principal indicação é no alívio dos sintomas da menopausa (1).
Um estudo randomizado, duplo-cego e placebo-controlado, com pacientes tratadas com extrato etanólico de C. racemosa Ze 450 (6,5 mg e 13 mg), demonstrou um alívio significativo e dose-dependente nos parâmetros vasomotores, psicológicos e somáticos, melhorando a qualidade de vida dessas mulheres (1). Uma meta-análise de 2021 revelou que a suplementação com trevo-vermelho, administrada por 3 meses, resultou em uma média de 1,7 ondas de calor a menos por dia em comparação com o placebo, particularmente em mulheres pós-menopausais que sofrem pelo menos 5 ondas de calor diárias (2).
É importante notar, contudo, que esses efeitos não foram sustentados em ensaios com acompanhamento de 12 meses, e mais da metade dos ensaios foram parcial ou totalmente financiados pelo fabricante do trevo-vermelho, o que poderia enviesar os resultados (2). Além disso, o cohosh preto não influencia os níveis de estrogênio, a densidade ou proliferação do tecido mamário, a espessura do endométrio ou a citologia vaginal (2, 12).
Posologia e Apresentações Comerciais
As posologias recomendadas variam conforme a forma do extrato:
- Remifemin (fitoterápico): 20-40 mg/dia.
- Extrato fluido 1:1 (álcool, 90%): 0,3-2,0 mL/dia (1).
- Tintura 1:10 (40-60% álcool): 2-4 mL/dia.
- Extrato seco padronizado a 2,5% de triterpenoides: 40-320 mg/dia (1).
- Rizoma seco: 0,5 a 1g, até 3 vezes ao dia (1).
Recomenda-se o consumo junto às refeições, por prudência, embora não haja uma indicação clara sobre isso (1).
Extratos de cohosh preto podem variar consideravelmente dependendo de fatores como cultivo, colheita, técnicas de extração, solvente utilizado e métodos de padronização (2, 3), o que pode resultar em efeitos inconsistentes (8, 9).
Contraindicações e Toxicidade
Contraindicações
O uso de Cimicifuga racemosa é contraindicado em (1):
- Gestação.
- Lactação.
- Pacientes em uso de imunossupressores.
Segurança e Efeitos Adversos
O black cohosh é geralmente considerado seguro, e estudos clínicos não relataram efeitos colaterais significativos (2). A administração de doses padrão ou altas por 3 a 6 meses não parece afetar a função hepática (2). Da mesma forma, não demonstra efeitos significativos na pressão arterial, frequência cardíaca, peso corporal ou Índice de Massa Corporal (IMC) (2).
Estudos exploraram seu impacto na função renal, colesterol total e triglicerídeos, não revelando efeitos gerais, exceto por alguns estudos que relataram casos de aumento do colesterol de lipoproteína de alta densidade (HDL) e diminuição do colesterol de lipoproteína de baixa densidade (LDL) (2). Ensaios comparando o black cohosh com a tibolona (medicamento para sintomas da menopausa) descobriram que pacientes tratados com black cohosh apresentaram menos efeitos colaterais (e.g., sangramento vaginal) do que aqueles com tibolona (2, 8).
Uma meta-análise indicou que 0,5% a 15% das mulheres na menopausa que tomam black cohosh apresentaram desconforto gastrointestinal (9).
Em estudos animais e in vitro com células humanas, o black cohosh induziu micronúcleos (MN), que são biomarcadores de alterações genéticas, e interrompeu a via do folato. Essa interrupção levou à anemia macrocítica não regenerativa em ratos, caracterizada por glóbulos vermelhos aumentados e substituição inadequada na medula óssea (10). Embora esses resultados indiquem um risco potencial, estudos clínicos são necessários para avaliar o impacto no corpo humano (10).
Mecanismo de Ação Detalhado
Inicialmente, o mecanismo presumido do black cohosh envolvia a ativação de receptores de estrogênio. Contudo, estudos in vitro e in vivo sobre seus extratos não produziram evidências de atividade estrogênica (2, 11). Em vez disso, parece que o black cohosh se liga a receptores no sistema nervoso central (SNC) responsáveis por funções como termorregulação, humor e sono (e.g., receptores opioides mu, de serotonina, dopamina e ácido gama-aminobutírico – GABA) (2, 11, 12). Esse modo de ação esclarece por que o black cohosh não influencia os níveis de estrogênio, a densidade ou proliferação do tecido mamário, a espessura do endométrio ou a citologia vaginal (2, 12).
Adicionalmente, o black cohosh demonstrou propriedades antiestrogênicas em estudos de câncer de mama (13). Esse efeito antiestrogênico foi observado in vitro como uma redução no crescimento de células de câncer de mama responsivas ao estrogênio (13).
Outro estudo in vitro encontrou um potencial mecanismo termorregulador não estrogênico do black cohosh, que pode modular o sistema imunológico promovendo a produção de óxido nítrico (NO) em células tratadas com interferon gama (INF-γ) (12).
Uma meta-análise revelou que o extrato isopropanólico de black cohosh (iCR) mostrou-se mais eficaz do que o placebo no alívio de sintomas neurovegetativos (como ondas de calor, suores noturnos e palpitações) e sintomas psicológicos (como depressão) em mulheres com sintomas naturais de perimenopausa e pós-menopausa (2). Um dos estudos incluídos nessa meta-análise também descobriu que o black cohosh melhorou a eficiência do sono e diminuiu o despertar após o início do sono (WASO) em comparação com o placebo (5).
Referências Bibliográficas
- SAAD, G. de A. et al. Fitoterapia Contemporânea – Tradição e Ciência na Prática Clínica. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. 441 p.
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- WEN-PEI BAI, S. Y. W. et al. [Efficacy and safety of remifemin compared to tibolone for controlling of perimenopausal symptoms]. Zhonghua Fu Chan Ke Za Zhi, ago. 2009.
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- SHAMS, T. et al. Efficacy of black cohosh-containing preparations on menopausal symptoms: a meta-analysis. Altern Ther Health Med., jan.-fev. 2010.
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- JULIÁ MOLLÁ, M. D. et al. Cimicifuga racemosa treatment and health related quality of life in post-menopausal Spanish women. Gynecol Endocrinol., jan. 2009.