Cinnamomum zeylanicum (Canela): Aplicações Clínicas e Propriedades Farmacológicas
Introdução
A Cinnamomum zeylanicum, também conhecida como canela-da-índia ou canela-do-Ceilão, é uma especiaria amplamente utilizada na culinária e reconhecida por suas diversas propriedades medicinais. O nome farmacêutico da canela é Cortex Cinnamomi, sendo a casca do caule de árvores jovens (3-5 anos) a parte utilizada para fins terapêuticos.
Compostos Bioativos e Atividades Farmacológicas
A canela possui uma rica composição de compostos bioativos que lhe conferem variadas atividades farmacológicas:
- Óleo essencial: Contém cumarina, ácido cinâmico, eugenol, cinamaldeído, cariofileno e linalol (1,2).
- Taninos (1)
- Diterpenoides (1)
- Proantocianidinas (1)
- Mucilagem (1)
- Açúcares: Sacarose, frutose e manitol, que contribuem para seu sabor adocicado (1).
Esses componentes atuam em diversas frentes:
- Efeito anti-inflamatório (2)
- Efeito antioxidante (2)
- Melhora glicêmica: Reduzindo níveis séricos de glicose e HbA1c, e aumentando os receptores GLUT4 e receptores de insulina, entre outros (2).
- Melhora na composição corporal: Possivelmente devido à melhora glicêmica (2).
- Redução do LDL e aumento do HDL (2).
- Atividade carminativa (1).
- Efeito anestésico, anti-inflamatório e antimicrobiano (1).
- Ação emenagoga (1).
- Estimulante do SNC (1).
Principais Indicações Clínicas
A canela é indicada para as seguintes condições:
- Hipertensão Arterial: A suplementação de canela, mesmo em baixas quantidades (<2g/dia), demonstrou uma redução significativa tanto na pressão diastólica quanto na sistólica (2). Esses resultados foram observados a longo prazo (12 semanas ou mais) (2). O mecanismo exato para a redução da pressão arterial ainda não é totalmente compreendido, mas estudos em animais sugerem uma propriedade vasodilatadora periférica (2).
- Diabetes / Resistência à Insulina: Os efeitos benéficos da canela na glicemia são atribuídos aos seus polifenóis e à presença de cromo, que promovem um maior controle glicêmico e uma adequada sinalização da insulina. Isso ocorre por meio do aumento da atividade da fosfatidilinositol 3-quinase (PI3K), que potencializa a ação desse hormônio (1,3). Adicionalmente, foi observada uma melhor captação da glicose pelo aumento no GLUT4 e pela inibição da síntese de glicogênio. Estudos in vitro também relacionaram a canela à sua ação antioxidante e à potencialização da ação da insulina, sugerindo benefício no controle da intolerância à glicose e do diabetes (3). Uma revisão de 2008 apontou que o consumo de 1 a 6g/dia de canela por indivíduos com Diabetes Mellitus Tipo 2 (DM2), durante 40 dias, foi associado à redução da glicemia de jejum, dos triglicerídeos e do colesterol total, embora sem efeitos na hemoglobina glicada (3). Uma meta-análise mostrou que o consumo de pó de canela (1-3g/dia) melhorou a glicemia de jejum e a hemoglobina glicada, além dos níveis de HOMA-IR (4).
- Dislipidemia: O consumo de canela foi associado a uma diminuição estatisticamente significativa nos níveis de colesterol total, LDL-c e triglicerídeos em jejum, além de um aumento no HDL-c (1,3).
- Obesidade: Algumas evidências experimentais sugerem que a canela pode promover o escurecimento do tecido adiposo branco e aumentar a atividade do tecido adiposo marrom. Em ratos, 500 mg/kg de extrato de canela levaram a um aumento da densidade de UCP1, indicando o escurecimento do tecido adiposo branco (5). Outro estudo associou o consumo de 3g de canela, divididas entre almoço e jantar, a uma diminuição significativa do peso corporal, do percentual de gordura e das circunferências de cintura e quadril, além de melhoras em marcadores bioquímicos (6). Uma meta-análise avaliou o consumo de 1-10g/dia de canela por 8-16 semanas, demonstrando uma diminuição significativa do peso corporal e da massa de gordura, principalmente em dosagens >2g/dia por mais de 12 semanas (7).
- Dismenorreia / Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP): O chá da casca e o óleo essencial da canela podem apresentar um efeito emenagogo (aumento do fluxo menstrual) (1,8). Além disso, a canela pode proteger o tecido ovariano contra o estresse oxidativo (8).
- Atividade Carminativa: Os constituintes presentes no óleo essencial da casca da C. zeylanicum, como o cinamaldeído, exibem atividade carminativa ao diminuir as contrações do músculo liso intestinal (1).
- Efeito Anestésico, Anti-inflamatório e Antimicrobiano: O óleo essencial da canela apresenta efeito anestésico local, anti-inflamatório e antimicrobiano, sendo recomendado contra microrganismos que provocam moléstias do aparelho respiratório (1).
Posologia
A posologia da canela pode variar conforme a indicação e a forma de apresentação:
- Para indivíduos com diabetes: 1-6g/dia (3).
- Planta seca (infusão ou decocção): 2-4g/dia (1).
- Tintura: 5-10mL/dia (1).
- Óleo essencial: 0,05-0,2mL/dia (1).
- Pó: 400 mg-4g/dia (1).
Verificou-se que os efeitos da canela podem persistir mesmo após 20 dias sem o consumo do alimento (3).
Contraindicações e Precauções
- Em altas doses, pode causar hematúria, gastroenterite e até mesmo aborto (1).
- Contraindicada na gravidez (1).
- Deve ser utilizada cuidadosamente em pacientes com sensibilidade cutânea e de mucosas (1).
- Doses 20 vezes maiores que as terapêuticas foram consideradas tóxicas (1).
Referências Bibliográficas
- SAAD, G. de A. et al. Fitoterapia Contemporânea – Tradição e Ciência na Prática Clínica. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. 441 p.
- MOUSAVI, S. M. et al. Anti-hypertensive effects of cinnamon supplementation in adults: A systematic review and dose-response Meta-analysis of randomized controlled trials. Crit Rev Food Sci Nutr, v. 60, n. 18, p. 3144–54, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.1080/10408398.2019.1678012.
- PHILIPPI, S. T.; PIMENTEL, C. V. de M. B.; ELIAS, M. F. Alimentos Funcionais e Compostos Bioativos. 1. ed. São Paulo: Manole, 2019. 893 p.
- DEYNO, S. et al. Efficacy and safety of cinnamon in type 2 diabetes mellitus and pre-diabetes patients: A meta-analysis and meta-regression. Diabetes Res Clin Pract, v. 156, p. 107815, out. 2019. Disponível em: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0168822719307065.
- KWAN, H. Y. et al. Cinnamon induces browning in subcutaneous adipocytes. Sci Rep, v. 7, n. 1, p. 2447, 26 dez. 2017. Disponível em: http://www.nature.com/articles/s41598-017-02263-5.
- GUPTA JAIN, S. et al. Effect of oral cinnamon intervention on metabolic profile and body composition of Asian Indians with metabolic syndrome: a randomized double-blind control trial. Lipids Health Dis, v. 16, n. 1, p. 113, 12 dez. 2017. Disponível em: http://lipidworld.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12944-017-0504-8.
- MOUSAVI, S. M. et al. Cinnamon supplementation positively affects obesity: A systematic review and dose-response meta-analysis of randomized controlled trials. Clin Nutr, v. 39, n. 1, p. 123–33, jan. 2020. Disponível em: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0261561419300718.
- MOINI JAZANI, A. et al. A comprehensive review of clinical studies with herbal medicine on polycystic ovary syndrome (PCOS). DARU J Pharm Sci, v. 27, n. 2, p. 863–77, 2019.