Cromo: Papel Fisiológico, Recomendações e Aplicações Clínicas
Introdução
O cromo é um mineral-traço amplamente distribuído no solo, essencial para diversas funções biológicas (1). Sua forma trivalente desempenha um papel fundamental na ação da insulina, enquanto a forma hexavalente é conhecida por sua toxicidade (1). Este documento explora a fisiologia do cromo, suas recomendações nutricionais, biodisponibilidade, metabolismo, aplicações terapêuticas e considerações de segurança.
Fisiologia Geral e Formas de Cromo
O cromo existe em diversas formas, sendo as mais comuns a trivalente (Cr III) e a hexavalente (Cr VI) (1). A forma hexavalente é reconhecida como tóxica, podendo causar irritação local e até corrosão devido ao seu alto poder oxidante (1). Já a forma trivalente é mais estável e geralmente encontrada em plantas, ligada a complexos orgânicos, provavelmente como forma de reserva (1).
O cromo trivalente tem um papel chave na ação da insulina, facilitando a ligação da insulina ao seu receptor na membrana celular. Esse processo promove o aumento da captação de glicose e aminoácidos, além de favorecer a síntese proteica (1). O cromo é um elemento essencial para a normalidade do metabolismo de carboidratos e lipídios, embora questionamentos recentes tenham sido levantados (1). Desde a década de 1950, tem-se demonstrado que o cromo desempenha um papel importante na tolerância à glicose, mantendo sua normalidade, de modo que sua deficiência prejudica a utilização desse carboidrato (1).
Recomendações Nutricionais e Fontes Alimentares
A escassez de dados clínicos fidedignos que assegurem e estabeleçam quantidades adequadas de ingestão dificulta a definição de parâmetros que determinem as recomendações nutricionais (1). A ingestão de cromo na dieta não pode ser precisamente determinada por nenhuma base de dados existente (1).
As recomendações de Ingestão Adequada (AI) são:
- Homens: 35 mcg/dia (3).
- Mulheres (19 a 50 anos): 25 mcg/dia (3).
- Gestantes: 30 mcg/dia.
- Lactantes: 45 mcg/dia.
Fontes alimentares de cromo incluem:
- Condimentos.
- Fígado, leveduras.
- Tubérculos, brócolis, alho.
- Suco de uva, vegetais e legumes.
- Grãos integrais, cereais integrais.
- Leguminosas/feijões, nozes, cogumelos.
- Ameixas e passas.
- Cerveja, vinho, queijos, ovos.
Biodisponibilidade e Metabolismo
O cromo apresenta uma baixa biodisponibilidade, com apenas 0,5% a 2% desse mineral sendo absorvido pelo organismo (2). Fatores que contribuem para essa baixa absorção incluem fitato, zinco, ferro e vanádio (2). No entanto, compostos orgânicos derivados do cromo, como o picolinato e nicotinato, são bem absorvidos (1). Aminoácidos, oxalato, Vitamina C e amido podem aumentar a biodisponibilidade do cromo (1, 2). Além disso, o percentual de absorção é inversamente proporcional à quantidade de cromo ingerida (1, 2).
O cromo é principalmente armazenado em ossos, fígado, baço, músculos e tecido adiposo, totalizando um pool corporal de aproximadamente 0,4 – 0,6 mg (1, 2). Sua absorção ocorre por difusão passiva; contudo, em determinadas condições, outros mecanismos podem operar (1). Uma vez absorvido, o Cr se mantém na corrente sanguínea ligado principalmente à transferrina, uma proteína que se liga de forma reversível a dois íons metálicos: Cr e Fe, com maior preferência pelo ferro (1). Por esse motivo, sugere-se que o excesso de ferro (hemocromatose) pode interferir no transporte de cromo devido à competição pela ligação à transferrina (1). Contudo, não se sabe se o inverso também é verdadeiro; alguns estudos em humanos demonstraram que a suplementação de cromo não afeta o estado nutricional do indivíduo em relação ao ferro, enquanto outros indicam que a suplementação poderia diminuir a saturação de transferrina (1).
Exames Bioquímicos
Atualmente, não existem indicadores clínicos confiáveis para identificar o estado nutricional de um indivíduo em relação ao cromo (1).
Suplementação de Cromo: Evidências e Considerações
A forma mais utilizada na suplementação é o picolinato de cromo, que é mais bem absorvida em comparação com outras formas comercializadas (2). A suplementação de picolinato de cromo apresentou apenas uma leve diminuição da glicemia de jejum (2). Além disso, a suplementação de 200 a 800 mcg/dia não foi capaz de aumentar a massa magra ou reduzir a gordura corporal (3, 4). É importante notar que não existem estudos de longo prazo que corroborem os benefícios dessa suplementação, portanto, não deve ser utilizada por mais de três meses (Pós-VP). A suplementação em doses excessivas pode gerar um aumento do estresse oxidativo (Pós-VP). Indivíduos que não apresentam alterações de glicemia, insulina e que são eutróficos não se beneficiam do uso deste mineral (1). Embora alguns estudos aleguem que o cromo auxilia no ganho de massa muscular e na perda de peso, não há evidências que comprovem essa afirmação (4). A maioria dos estudos demonstrou que a suplementação de cromo não é eficaz no aumento da massa magra corporal (4).
Toxicidade e Segurança
Quando ingerido, o cromo III possui baixo grau de toxicidade, principalmente devido à sua baixa absorção (1). Estudos em ratos mostraram que doses de 100 mg/kg desse elemento são seguras (1). Em humanos, tratamentos de 1000 mcg/dia por 64 meses não resultaram em nenhum efeito tóxico (1). No entanto, ensaios laboratoriais in vitro sugeriram que o picolinato de cromo pode se acumular nas células e causar dano cromossômico (4). Embora esses achados ainda não tenham sido confirmados em seres humanos, é importante ter cautela com o uso da suplementação (4).
Mecanismos Associados à Bioatividade do Cromo e Aplicações Clínicas
Cromo e Metabolismo da Glicose
Modelos animais e humanos de diabetes tipo 2 apresentaram maior excreção urinária de Cr (1). Por isso, especula-se que indivíduos diabéticos poderiam desenvolver deficiência de Cr, o que poderia exacerbar os sintomas do diabetes (1). O aumento na produção de insulina, em função do aumento da glicemia, parece resultar em uma maior perda de Cr (1). O cromo está diretamente relacionado a isso, pois o aumento das concentrações de insulina estimula o transporte e o influxo do cromo para as células, com consequente associação à cromodulina intracelular. Esse processo intensifica a atividade tirosinoquinase do receptor de insulina, o que, em última instância, acarreta aumento da translocação do GLUT4 para a membrana plasmática (2). Nesse contexto, indivíduos com diabetes tipo 2 descompensado poderiam se beneficiar com a suplementação de cromo (2). Um estudo mostrou que 400 mcg/dia de picolinato foi benéfico na melhora da sensibilidade à insulina (1). No entanto, devido à falta de dados clínicos consistentes, a American Diabetes Association (ADA) e a Associação Europeia de Estudos sobre o Diabetes não recomendam a suplementação de cromo trivalente como tratamento para o diabetes (1).
Cromo e Síndrome do Ovário Policístico (SOP)
A suplementação de picolinato de cromo reduziu a glicose de jejum e os níveis de insulina, além de aumentar a sensibilidade à insulina em pacientes com Síndrome do Ovário Policístico (SOP) após três meses de tratamento (Pós-VP).
Cromo e Colesterol
O cromo é capaz de inibir a enzima HMG-CoA redutase, que está relacionada à síntese de colesterol (Pós-VP). Quando um paciente apresenta colesterol elevado, uma formulação com cromo pode ser interessante (Pós-VP). Alguns estudos demonstraram que os níveis de colesterol total, LDL e triacilgliceróis parecem diminuir, enquanto HDL e apolipoproteína A parecem aumentar (1).
Cromo e HIV
Alguns estudos sugerem que a suplementação de cromo pode atenuar certos efeitos colaterais associados à terapia antirretroviral (1). Pacientes com HIV frequentemente desenvolvem resistência à insulina, o que torna o cromo um mineral interessante para o tratamento (1). Além disso, foram observados efeitos na diminuição dos triglicerídeos (1).
Cromo e Estresse Oxidativo
O cromo trivalente parece ter participação na inibição do estresse oxidativo e na secreção de citocinas inflamatórias (1). Um estudo mostrou que a suplementação de 400 mcg/dia de picolinato de cromo foi capaz de diminuir a inflamação e o estresse oxidativo (1).
Cromo e Exercício Físico
Sugere-se que o aumento da captação de aminoácidos — decorrente da melhora na sensibilidade à insulina — favoreça a síntese proteica (2). Contudo, estudos demonstraram que a suplementação de cromo não foi capaz de promover o aumento da massa muscular, nem diminuir a gordura corporal (2). A suplementação com cromo não apresenta evidências expressas que corroborem seu uso com o intuito de promover o ganho de massa muscular (2).
Referências Bibliográficas
- COZZOLINO, S. Biodisponibilidade de Nutrientes. 6. ed. São Paulo: Manole, 2020. 934 p.
- LANCHA JR., A. H.; ROGERI, P. S.; PEREIRA-LANCHA, L. O. Suplementação Nutricional no Esporte. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2019. 266 p.
- KERKSICK, C. M. et al. ISSN exercise & sports nutrition review update: Research & recommendations. Journal of the International Society of Sports Nutrition, [s. l.], v. 15, n. 1, p. 1–57, 2018.
- JEUKENDRUP, A. E.; GLEESON, M. Nutrição no Esporte – Diretrizes Nutricionais e Bioquímica e Fisiologia do Exercício. 3. ed. São Paulo: Manole, 2021. 559 p.