Demência e Transtorno Neurocognitivo Maior: Uma Abordagem Abrangente
Introdução
A demência é uma síndrome complexa que se manifesta como um grupo de sinais físicos e sintomas, caracterizada principalmente por prejuízo da memória, alterações comportamentais e perda de habilidades cognitivas e funcionais. Embora o termo “demência” seja amplamente utilizado, no contexto clínico e diagnóstico mais recente, a condição é englobada pelo conceito de transtorno neurocognitivo maior (TNC maior).
Definição e Caracterização Clínica
A demência é uma síndrome, ou seja, um conjunto de sinais e sintomas (3). Três características principais definem a demência (3):
- Prejuízo da Memória: Varia de esquecimentos leves a perdas severas, a ponto de o indivíduo não se recordar da própria identidade.
- Problemas de Comportamento: Geralmente manifestam-se como agitação, insônia, choro fácil, comportamentos inadequados, perda da inibição social normal e alterações de personalidade.
- Perda das Habilidades: Dificuldade em executar tarefas cotidianas como organizar compromissos, dirigir, vestir-se, cuidar da vida financeira e cozinhar.
Sintomas Iniciais
Os sintomas iniciais da demência são variados, mas a perda de memória de curto prazo é frequentemente a característica principal ou única que motiva a primeira consulta médica (3). Além do déficit de memória, outros sintomas comuns incluem (3):
- Dificuldade em executar tarefas domésticas.
- Problemas de vocabulário.
- Desorientação no tempo e espaço.
- Incapacidade de julgar situações.
- Problemas com o raciocínio abstrato.
- Colocação de objetos em lugares equivocados.
- Alterações de humor e comportamento.
- Alterações de personalidade.
- Perda de iniciativa (passividade).
Classificação Diagnóstica: Demência vs. Transtorno Neurocognitivo Maior (TNC)
A demência está atualmente incorporada à entidade recém-nomeada transtorno neurocognitivo maior (TNC maior) no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-5 (1). No entanto, o uso do termo “demência” não está excluído em subtipos etiológicos nos quais é um termo-padrão (1).
O termo “demência” é mantido no DSM-5 para continuidade, especialmente em contextos onde médicos e pacientes estão familiarizados com ele (1). Embora “demência” seja o termo habitual para transtornos como as demências degenerativas, que afetam principalmente adultos mais velhos, o termo “transtorno neurocognitivo” é amplamente empregado e, em geral, preferido para condições que afetam pessoas mais jovens, como prejuízo secundário a lesão cerebral traumática ou infecção pelo HIV (1).
A definição de TNC maior é mais abrangente do que o termo “demência”, pois permite o diagnóstico em indivíduos com declínio substancial em apenas um domínio cognitivo (1). Notavelmente, a categoria do DSM-IV “transtorno amnéstico” é agora diagnosticada como TNC maior devido a outra condição médica, para a qual o termo “demência” não é utilizado (1).
Causas da Demência
Existem diversas doenças ou alterações orgânicas capazes de levar a um quadro demencial (3). Muitas dessas causas são reversíveis, como o uso prolongado de alguns medicamentos (ex: para hipertensão arterial, diuréticos, certos hipnóticos) (3). A depressão também pode estar associada à demência (3).
Outras condições relacionadas à demência incluem (3):
- Doenças vasculares do sistema nervoso central (SNC).
- Doenças infecciosas (ex: sífilis e HIV no SNC).
- Hipotireoidismo.
- Deficiência de vitamina B12.
- Doenças degenerativas do SNC (ex: Doença de Alzheimer).
Prevalência
Aproximadamente 24 milhões de pessoas em todo o mundo apresentam algum tipo de demência (4). Desses casos, a Doença de Alzheimer (DA) é considerada a causa mais comum entre idosos com idade igual ou superior a 65 anos (4).
Tratamento e Manejo
O tratamento da demência é multifacetado e depende da etiologia subjacente.
Abordagem Geral
O progresso de alguns tipos de demência pode ser retardado com o uso de medicamentos, mas a demência geralmente não pode ser revertida nem completamente interrompida (3). O tratamento é diferenciado conforme a doença seja primária, secundária ou associada a outras enfermidades (3).
- Casos Secundários: O tratamento específico da doença responsável pelo quadro demencial é frequentemente suficiente para aliviar os sintomas e promover a melhora do paciente (3).
- Demência Associada a Outras Enfermidades: O tratamento dessas enfermidades é fundamental para melhorar consideravelmente os efeitos da demência sobre o indivíduo (3).
Em todas as situações, e particularmente nos casos de demência primária, a aproximação entre os profissionais de saúde e os familiares é crucial (3). A honestidade sobre as reais condições do paciente ajuda a promover o comprometimento com os cuidados indispensáveis para minimizar os efeitos da demência sobre o paciente e sobre a qualidade de vida dos cuidadores (3).
Tratamento Farmacológico
Duas classes principais de fármacos são utilizadas para o manejo sintomático da Doença de Alzheimer:
- Inibidores da Acetilcolinesterase (IACs):
- Exemplos: Donepezila, galantamina, rivastigmina (2).
- Uso: Indicados para a Doença de Alzheimer de leve a moderada (2).
- Considerações: Os efeitos adversos colinérgicos podem ser um problema significativo (2).
- Antagonistas do Receptor NMDA:
- Exemplo: Memantina (2).
- Uso: Indicados para a Doença de Alzheimer de moderada a grave (2).
Ambas as classes de medicamentos demonstram uma melhora detectável no comprometimento cognitivo em ensaios clínicos, mas apresentam efeitos adversos significativos e são de uso clínico limitado (2). Eles não conseguem retardar a neurodegeneração (2). A eficácia é monitorada periodicamente em cada paciente, e a administração é continuada apenas quando se acredita que o fármaco esteja agindo e que seu efeito de retardar a deterioração funcional e cognitiva supere os efeitos adversos (2).
Prevenção
A demência não possui cura, o que torna a prevenção ou o retardo de sua progressão as melhores estratégias (3). Embora o processo de envelhecimento e a genética não possam ser alterados, muitos fatores de risco modificáveis podem ser manejados (3):
- Cessar o tabagismo.
- Manter um peso saudável.
- Controlar os níveis de colesterol.
- Controlar a pressão arterial.
Referências Bibliográficas
- AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2018. 948 p.
- RITTER, J. M. et al. Rang & Dale Farmacologia. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2020. 789 p.
- GOIÁS. Secretaria de Estado da Saúde. Demência. Disponível em: https://www.saude.go.gov.br/biblioteca/7595-dem%C3%AAncia. Acesso em: 27 jan. 2024.
- SILVA, M. L. N.; MARUCCI, M. F. N.; ROEDIGER, M. A. Tratado de Nutrição em Gerontologia. 1. ed. Barueri – SP: Manole, 2016. 507 p.