Esquizofrenia: Fisiopatologia, Manifestações Clínicas e Abordagens Terapêuticas
Introdução
A esquizofrenia é uma doença psicótica crônica e grave que impacta aproximadamente 1% da população mundial, incluindo jovens. Caracterizada por uma complexa interação de fatores biológicos e genéticos, manifesta-se por uma variedade de sintomas que afetam profundamente o pensamento, a percepção, as emoções e o comportamento do indivíduo. A compreensão de sua etiologia multifatorial e fisiopatologia é fundamental para o desenvolvimento de estratégias de tratamento mais eficazes.
Etiologia e Fisiopatologia
Etiologia
A esquizofrenia é uma condição multifatorial, com uma série de fatores de risco identificados. Entre eles, destacam-se a suscetibilidade genética, a ocorrência de insultos no início do desenvolvimento, o nascimento durante o inverno e a idade avançada dos pais. (2)
Estudos já identificaram mais de 100 regiões genéticas associadas a um risco aumentado para a doença (1). No entanto, não parece haver um gene isolado com influência dominante (1). Além disso, diversos genes implicados na esquizofrenia também foram associados a outras condições, como o transtorno bipolar (1). Apesar dessas tendências hereditárias, as causas exatas da esquizofrenia não são totalmente elucidadas (1).
A contribuição genética é significativa, sendo evidente em pelo menos um subtipo de indivíduos que desenvolvem a doença. O risco de um parente de primeiro grau de um paciente afetado desenvolver esquizofrenia é de aproximadamente 6,6%. Esse risco aumenta consideravelmente para 40% quando ambos os pais são afetados.
Relação com outros transtornos:
É importante ressaltar que a predisposição familiar para a esquizofrenia também aumenta o risco de outros transtornos psiquiátricos, como o transtorno esquizoafetivo e os transtornos de personalidade esquizotípica e esquizoide. (2)
Estes últimos são caracterizados por um padrão persistente de déficits sociais e interpessoais, com uma notável incapacidade de estabelecer relações íntimas, acompanhada de comportamento excêntrico e distorções perceptivas leves. (2)
Fisiopatologia
A esquizofrenia é uma doença psicótica que se caracteriza por delírios, alucinações e distúrbios do pensamento, acompanhados de afastamento social, aplanamento das respostas emocionais e deficiência cognitiva (1). Pode ter um curso de recaídas e remissões, ou ser crônica e progressiva, especialmente em casos de início tardio (1). Uma característica comum é a deficiência na “atenção seletiva”, onde a capacidade dos pacientes de discriminar entre estímulos significativos e não significativos parece estar prejudicada (1). Por exemplo, o tique-taque de um relógio pode ter o mesmo nível de atratividade que uma conversa com um acompanhante (1). Acredita-se que os principais neurotransmissores envolvidos na fisiopatologia da esquizofrenia sejam a dopamina e o glutamato (1).
Hipótese da Dopamina
A teoria da dopamina, proposta por Carlson, baseia-se em evidências farmacológicas indiretas observadas tanto em animais quanto em humanos (1). Foi demonstrado que a anfetamina, ao liberar dopamina no cérebro, pode induzir em seres humanos uma síndrome comportamental indistinguível de um episódio de esquizofrenia (1). Em animais, a liberação de dopamina resultou em um padrão de comportamento que se assemelha aos comportamentos repetitivos observados em pacientes esquizofrênicos (1). Adicionalmente, agonistas de receptores D2 produzem efeitos semelhantes em animais e exacerbam os sintomas em pacientes (1). Por outro lado, antagonistas dopaminérgicos e fármacos que bloqueiam o armazenamento de dopamina neuronal são eficazes no controle dos sintomas positivos e na prevenção de alterações comportamentais induzidas por anfetaminas (1).
Hipótese do Glutamato
Em seres humanos, os antagonistas dos receptores NMDA podem induzir sintomas positivos, negativos e déficit cognitivo (1). Em pacientes esquizofrênicos, a expressão do transportador de captação de glutamato, VGLUT1, está reduzida, sugerindo uma perturbação das terminações nervosas glutamatérgicas (1). Postula-se, portanto, que a esquizofrenia pode ser resultado de uma perturbação da neurotransmissão glutamatérgica, manifestada como uma redução na função dos receptores NMDA (Hipótese da Hipofunção NMDA) (1).
Manifestações Clínicas
A sintomatologia geralmente tem início no final da adolescência, com uma progressão insidiosa na maioria dos casos, podendo evoluir de um quadro de isolamento social e alterações perceptivas para delírios e alucinações recorrentes. O prognóstico clínico é, frequentemente, reservado. Mas é importante notar que, aproximadamente, 10% dos pacientes com esquizofrenia perdem a vida por suicídio. (2)
O fenótipo clínico da esquizofrenia é variável, especialmente quanto ao equilíbrio entre os sintomas positivos e negativos, o que influencia a eficácia dos fármacos antipsicóticos (1). Diferentes sintomas parecem ser resultado de anomalias em distintos circuitos neurais (1).
Indivíduos podem manifestar-se com uma variedade de sinais e sintomas, que são categorizados como positivos ou negativos. A sintomatologia positiva inclui delírios, alucinações e desorganização conceitual. Por outro lado, a sintomatologia negativa abrange a anedonia, a redução da expressão emocional, o declínio na função, o prejuízo da concentração e o isolamento social. (2)
Vale ressaltar que no cenário clínico da esquizofrenia, cerca de um terço dos pacientes apresenta uma predominância de sintomas negativos. Estes incluem a perda de funções, como a anedonia, a diminuição da expressão emocional e o isolamento social.
Para o estabelecimento de um diagnóstico formal, é necessário que o paciente apresente no mínimo dois desses sintomas durante um período de um mês, com a persistência de sinais por no mínimo seis meses. Além disso, podem estar presentes alterações no pensamento ou no discurso e um comportamento motor desorganizado, incluindo a catatonia. (2)
Reestruturação Nosológica e Abandono dos Subtipos
A psicopatologia moderna (CID-11 e DSM-5) rejeitou os subtipos clássicos de esquizofrenia definidos no final do século XIX e início do XX. Essa descontinuação deve-se à insuficiência utilitária e baixa validade clínica dos subtipos, que demonstraram ser: (3)
- Instáveis Longitudinalmente: Apresentam transições frequentes ao longo da evolução da doença. (3)
- Não Preditivos: Não se correlacionam com o padrão de evolução patológica ou com a resposta terapêutica (farmacológica ou psicossocial). (3)
- Heterogêneos Etiologicamente: Demonstram baixa coesão em relação aos substratos genéticos e neurobiológicos. (3)
- Obsoletos em Pesquisa: A delimitação de subtipos tem sido progressivamente abandonada no contexto investigativo. (3)
Em vez da classificação categórica em subtipos, o foco atual reside na identificação de dimensões sintomatológicas que se combinam de modo heterogêneo nas diversas fases do transtorno. (3)
Dimensões Sintomatológicas da Esquizofrenia
Os sintomas são agrupados em seis dimensões primárias para avaliação e manejo clínico:
- Sintomas Negativos
- Sintomas Positivos
- Sintomas de Desorganização
- Sintomas Psicomotores/Catatonia
- Sintomas/Prejuízos Cognitivos
- Sintomas de Humor
1. Sintomas Negativos (Síndrome Deficitária)
Estes sintomas estão associados a alterações no córtex pré-frontal. (1) Caracterizam-se pela perda ou redução de funções psíquicas essenciais, culminando no empobrecimento global da esfera afetiva, cognitiva e social. (3)
Manifestação | Descrição Clínica |
Aplainamento/Embotamento Afetivo | Comprometimento da capacidade de sintonia afetiva e da ressonância emocional no intercâmbio interpessoal. |
Retração Social (Associalidade) | Isolamento progressivo do convívio social, secundário a disfunções afetivas (apatia) e volitivas (abulia e redução do drive para a ação social). |
Alogia (Empobrecimento da Linguagem/Pensamento) | Diminuição observável na fluência verbal e redução do conteúdo do discurso (discurso empobrecido). |
Avolição (Diminuição da Vontade) | Expressa-se como hipopragmatismo e redução da iniciativa, resultando em dificuldade ou inabilidade para executar tarefas minimamente organizadas que demandem motivação e persistência. |
Anedonia | Redução da capacidade de experimentar prazer, distinguindo-se da anedonia depressiva pela ausência de desconforto subjetivo evidente associado à experiência. |
(1,3)
Considerações Adicionais:
- Busca-se distinguir entre sintomas negativos primários (intrínsecos à esquizofrenia) e secundários (resultantes de medicação antipsicótica, comorbidade depressiva ou isolamento). (3)
- A negligência de autocuidado (higiene pobre, desinteresse pela aparência e saúde) é uma consequência clínica observada. (3)
- O distanciamento afetivo e a retração social correlacionam-se, em parte, com o conceito de “autismo na esquizofrenia” de Eugen Bleuler (distinto do Transtorno do Espectro Autista – TEA), que também incluía inacessibilidade ao mundo interno e pensamento idiossincrático. (3)
2. Sintomas Positivos (Síndrome Produtiva)
Estes sintomas estão associados a alterações na via mesolímbica. (1) Constituem manifestações psicopatológicas atípicas e salientes que se adicionam ao funcionamento psíquico normal.
Manifestação | Descrição Clínica |
Alucinações | Experiências sensoriais sem estímulo externo real. O tipo mais prevalente é a alucinação audioverbal (“vozes”, frequentemente com conteúdo acusatório/comentador). Podem ocorrer alucinações visuais, táteis, gustativas (e.g., gosto de veneno) e olfativas (e.g., auto-ósmicas). |
Ideias Delirantes (Delírios) | Crenças fixas e falsas. São frequentemente de natureza persecutória, autorreferente ou de influência. Delírios bizarros (implausíveis, não congruentes com o humor basal) são fortes indicadores da esquizofrenia. |
Outras Distorções da Realidade | Presença de ideias marcadamente deturpadas e bizarras sobre eventos e fatos, sem a estrutura formal de um delírio. |
(1,3)
Sintomas de Primeira Ordem de Kurt Schneider:
São manifestações clínicas que o autor alemão considerava de elevado peso diagnóstico, indicando uma alteração radical da fronteira Eu-Mundo e perda da intimidade: (3)
- Percepção Delirante: Atribuição abrupta e maciça de um significado delirante a uma percepção sensorial normal.
- Alucinações Auditivas Típicas: Vozes que comentam as ações, dialogam ou comandam o indivíduo.
- Eco/Sonorização do Pensamento: O indivíduo ouve seus próprios pensamentos no ato de pensar.
- Difusão/Publicação do Pensamento: Sensação de que os pensamentos são audíveis ou percebidos por terceiros.
- Roubo do Pensamento: Experiência de que o pensamento é extraído da mente.
- Vivências de Influência (Distúrbios do Eu):
- Influência Corporal: Sentimento de que uma força ou agente externo atua sobre o organismo (e.g., raios, ondas).
- Vivência do “Fabricado” ou “Imposto”: Experiência de que sentimentos, impulsos, vontades ou pensamentos são impostos ou fabricados por uma fonte externa, resultando na perda do controle sobre si mesmo.
3. Sintomas de Desorganização (Síndrome de Desorganização)
Caracterizam-se pela fragmentação da progressão lógica e da organização comportamental. (3)
Manifestação | Descrição Clínica |
Pensamento Desorganizado | Varia desde o descarrilamento até a desagregação total do pensamento, culminando em um discurso incompreensível. |
Discurso Desorganizado | Manifestação linguística da desorganização do pensamento, incluindo tangencialidade e circunstancialidade em graus variáveis. |
Comportamento Desorganizado | Condutas incompreensíveis e bizarras, frequentemente com inadequação social ou sexual, manifestadas na vestimenta, adornos e expressão geral. |
Afeto Inadequado | Incongruência ou ambivalência acentuada entre as esferas afetivas, ideativas e volitivas. |
(3)
4. Sintomas Psicomotores e Catatonia (Síndrome Psicomotora)
Abrangem alterações na atividade motora, desde a lentificação até a agitação extrema. (3)
Manifestação | Descrição Clínica |
Lentificação/Empobrecimento Psicomotor | Redução do repertório e da velocidade dos gestos e movimentos. |
Movimentos Anômalos | Estereotipias (movimentos repetitivos, mecânicos, sem finalidade), Maneirismos (gestos complexos, repetidos, percebidos como excêntricos ou excessivos), e Posturas Bizarras. |
Síndrome Catatônica | O espectro mais marcante, com nível de consciência preservado, mas apresentando: |
– Estupor: Redução acentuada ou ausência de atividade psicomotora, acompanhada de mutismo e negativismo. | |
– Flexibilidade Céreácea (Catalepsia): Manutenção passiva de posturas impostas, mesmo contra a força da gravidade. | |
– Ecolalia e Ecopraxia: Repetição mecânica das palavras e/ou atos do interlocutor. | |
– Excitação/Furor Catatônico: Episódios de agitação psicomotora intensa e, por vezes, agressividade impulsiva. |
(3)
5. Sintomas/Prejuízos Cognitivos
O déficit cognitivo é geralmente evidente antes do surgimento de outros sintomas (1). Além desses sintomas centrais, é comum a presença de outros quadros, como ansiedade, culpabilidade, depressão e autopenalização (1). Esses quadros podem, em até 50% dos casos, conduzir a tentativas de suicídio (1). Eles são alterações difusas, frequentemente prodrômicas, com significativo impacto na evolução funcional do paciente. (3)
Domínio Cognitivo Afetado | Manifestação Clínica |
Cognição Geral | Comprometimento em atenção, memória episódica, memória de trabalho, velocidade de processamento e funções executivas (incluindo fluência verbal). |
Cognição Social | Déficit na percepção e gerenciamento de emoções (decodificação de pistas faciais, tonais e gestuais) e na percepção social (compreensão do contexto e dicas sociais). |
Vieses de Atribuição | Tendência a realizar atribuições negativas e hostis a terceiros em vez de atribuir a fatores ambientais. |
(3)
Relevância Clínica: As disfunções cognitivas são consideradas uma dimensão preditora da pior evolução nos domínios social e ocupacional, com eficácia terapêutica farmacológica e neuropsicológica modesta até o momento. (3)
6. Sintomas de Humor
Incluem a redução na experiência/expressão emocional em contraste com o aumento da reatividade emocional (principalmente na presença de sintomas positivos), conhecido como “paradoxo emocional da esquizofrenia”. (3)
- Observam-se altas taxas de sintomas ansiosos, depressivos e Depressão Clínica, contribuindo substancialmente para o sofrimento e as dificuldades psicossociais. (3)
Outras Características Associadas
- Falta de Insight: Elemento preponderante, no qual o paciente nega a existência de doença ou atribui os sintomas a fatores externos (e.g., nervosismo, influências espirituais). (3)
- Sinais Neurológicos: Presença de sinais neurológicos inespecíficos (soft signs), incluindo déficits olfativos, hipoalgesia (sensibilidade reduzida à dor), anormalidades oculomotoras (movimentos sacádicos), prejuízos na coordenação motora fina e sequenciamento motor complexo, e maior prevalência de mancinismo ou dominância lateral mista (sugerindo anomalia da dominância hemisférica). (3)
Diagnóstico:
O diagnóstico da esquizofrenia é essencialmente um processo de exclusão, requerendo a ausência de sintomas de humor relevantes, doenças clínicas significativas e abuso de substâncias. As reações farmacológicas que podem provocar alucinações, paranoia, confusão ou comportamento incomum devem ser descartadas, visto que podem ser dose-dependentes ou idiossincráticas. Agentes antiparkinsonianos, clonidina, quinacrina e os derivados da procaína são os medicamentos mais frequentemente associados a esses sintomas. Por isso, a possibilidade de causas medicamentosas deve ser sempre investigada em casos de psicose de início recente. (2)
O exame neurológico de um paciente com esquizofrenia é, em geral, normal. No entanto, é possível observar manifestações motoras como rigidez, tremores e discinesias em aproximadamente 25% dos pacientes que não estão em tratamento. (2)
Esquizofrenia: Comparação de Critérios Diagnósticos (CID-11 e DSM-5)
Dimensão Clínica / Critério | Classificação Internacional de Doenças (CID-11) | Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) |
Sintomas Nucleares / Manifestações | Alterações em múltiplas dimensões mentais e comportamentais, incluindo: | Critério A: Presença de dois ou mais dos seguintes sintomas: |
– Pensamento (Delírios e/ou desorganização da forma do pensamento) | 1. Delírios | |
– Percepção (Alucinações) | 2. Alucinações | |
– Experiências de alterações do self (influência/controle externo) | 3. Discurso desorganizado | |
– Perdas cognitivas (atenção, memória, cognição social) | 4. Comportamento grosseiramente desorganizado ou catatônico | |
– Alterações da volição (perda de motivação) | 5. Sintomas negativos (embotamento afetivo, alogia, avolição) | |
– Alterações dos afetos (aplainamento emocional) | ||
– Alterações psicomotoras (incluindo catatonia) | ||
Duração Mínima do Sintoma Agudo | Os sintomas nucleares (delírios, alucinações persistentes, transtornos formais do pensamento, experiência de influência/controle) devem estar presentes por pelo menos um mês. | Os sintomas listados (A. 1 a 5) devem estar presentes com duração significativa por pelo menos um mês. |
Impacto Funcional | Implícito pela natureza das alterações (e.g., perda de volição, déficits cognitivos). | Disfunções sociais, ocupacionais e/ou acadêmicas, denotando perdas nas habilidades interpessoais e produtivas (Critério B). |
Duração Total do Transtorno | Não especificada nos critérios de sintoma nuclear. | A duração dos sintomas principais (de A. 1 a 5) deve ser de pelo menos um mês, e a duração total do quadro deficitário (incluindo pródromos ou sintomas residuais) deve ser de pelo menos seis meses (Critério C). |
(3)
Perfil Clínico e Diagnóstico
O diagnóstico é estabelecido pela combinação de sintomas positivos, negativos, de desorganização, cognitivos, psicomotores e de humor. É essencial que essa manifestação ocorra com perdas no funcionamento social e na ausência de sintomas proeminentes de humor (mania e/ou depressão), e que não seja secundária a condições neurológicas ou uso de substâncias. (3)
- Idade de Início: O surgimento dos sintomas psicóticos geralmente ocorre na adolescência ou início da vida adulta. Observa-se uma tendência de início mais precoce em indivíduos do sexo masculino em comparação com o feminino. (3)
- Curso e Prognóstico: A esquizofrenia é uma doença crônica com curso marcado por surto-remissão recorrente, em que a remissão completa após os episódios agudos é incomum. A evolução funcional implica, frequentemente, menores taxas de emprego e independência econômica, com maior risco de condição de rua ou encarceramento. O curso é classicamente dividido em fases pré-mórbida, psicótica aguda e crônica, com graus variados de deterioração. (3)
- Fatores de Pior Evolução: O prognóstico desfavorável está associado ao sexo masculino, início precoce da doença, períodos prolongados sem tratamento, gravidade do comprometimento cognitivo (notavelmente a cognição social) e a intensidade dos sintomas negativos. (3)
- Heterogeneidade: Existe uma considerável variabilidade entre os pacientes em termos de substratos neurobiológicos, manifestações clínicas, curso e resposta terapêutica. A gravidade e os agrupamentos sintomáticos (clusters) flutuam amplamente ao longo da doença. (3)
- Comorbidade Suicídio/Violência: Verificam-se taxas e riscos aumentados de suicídio. Em fases específicas, pode haver aumento de comportamentos violentos. (3)
Transtornos relacionados:
Em casos onde o paciente manifesta os sintomas da esquizofrenia, mas não o critério de duração, o diagnóstico correto é transtorno esquizofreniforme. Já o transtorno esquizoafetivo se aplica a pacientes que apresentam sintomas da esquizofrenia junto com períodos de transtornos de humor. (2)
O diagnóstico de transtorno delirante se aplica a indivíduos que apresentam delírios com duração de pelo menos um mês, sem que os outros critérios para esquizofrenia sejam preenchidos. Por outro lado, esquizotípico e esquizoide são classificações que se referem a transtornos de personalidade. (2)
A catatonia é uma síndrome que se caracteriza por manifestações comportamentais e motoras, como estupor, mutismo, cataplexia, flexibilidade cérea e estereotipia. O diagnóstico dessa síndrome, que pode ser resultado de transtornos psiquiátricos e médicos graves, é confirmado pela presença de pelo menos três desses sintomas. (2)
Conduta Clínica: Terapia Medicamentosa
Antipsicóticos
Os antipsicóticos são o pilar do tratamento agudo e de manutenção da esquizofrenia. Eles são eficazes no controle de alucinações, delírios e transtornos do pensamento, independentemente da sua origem. (2) A terapia com antipsicóticos tem demonstrado eficácia em pacientes esquizofrênicos, permitindo que levem uma vida mais funcional (1). No entanto, esses fármacos podem apresentar efeitos colaterais importantes, incluindo efeitos extrapiramidais motores, endócrinos e sedativos (1).
O mecanismo de ação desses medicamentos envolve, em parte, a ligação aos receptores dopaminérgicos D2/D3 no estriado ventral. A eficácia clínica dos antipsicóticos convencionais está diretamente relacionada à sua afinidade pelos receptores D2. Inclusive, os agentes atípicos mais recentes também promovem um certo nível de bloqueio desses receptores. (2)
Apesar de controlarem efetivamente os sintomas positivos, os antipsicóticos convencionais não são eficazes no alívio dos sintomas negativos e da deficiência cognitiva (1,3). Adicionalmente, nem todos os pacientes respondem à terapia farmacológica, com aproximadamente 30% dos indivíduos não apresentando resposta ao tratamento (1). Mas naqueles pacientes que respondem, foi visto uma melhora clínica em horas ou dias, mas a remissão completa geralmente leva de 6 a 8 semanas. (2)
Manutenção do tratamento e prevenção de recaídas:
O tratamento de manutenção exige monitoramento contínuo para prevenir recaídas e para identificar o desenvolvimento de distúrbios de movimento. Embora a redução gradual da dose possa melhorar a função social em muitos pacientes mantidos com doses elevadas, o tratamento farmacológico intermitente é menos eficaz do que a administração regular. A interrupção completa da medicação resulta em uma taxa de recaída de cerca de 60% em seis meses. Preparações injetáveis de ação prolongada (como risperidona, paliperidona, olanzapina, aripiprazol e haloperidol) são uma opção para casos de baixa adesão ao tratamento oral, mas estes agentes não devem ser considerados intercambiáveis. (2)
Efeitos adversos:
Os antipsicóticos podem causar uma variedade de efeitos adversos, incluindo letargia, ganho de peso, hipotensão postural, constipação e boca seca. Com agentes de primeira geração, os sintomas extrapiramidais — como distonia, acatisia e acinesia — são frequentes e, se não forem abordados, podem contribuir para a baixa adesão ao tratamento. (2)
Comorbidades Físicas e Risco de Mortalidade
A esquizofrenia está associada a um risco significativo de morbidade e mortalidade prematura. (3)
- Comorbidades Físicas: São muito frequentes obesidade e doenças cardiovasculares (DCV). Há também aumento de diabetes, doenças pulmonares e infecções. (3)
- Comportamentos de Risco: Apresentam prevalência aumentada de tabagismo e uso de substâncias. (3)
- Expectativa de Vida Reduzida: Indivíduos com esquizofrenia vivem, em média, 15 a 25 anos a menos que a população geral, devido à maior incidência de doenças físicas e a estilos de vida de maior risco. (3)
Referências Bibliográficas
- RITTER, J. M. et al. Rang & Dale Farmacologia. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2020. 789 p.
- FAUCI, Anthony S. et al. (org.). Medicina interna de Harrison. 20. ed. Porto Alegre: AMGH, 2020.
- DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2019.