Estresse – Impactos na Saúde, Fisiopatologia, Consequências e Estratégias de Manejo
Introdução
O estresse é uma resposta fisiológica e emocional natural a estressores físicos ou psicológicos, caracterizada por alterações bioquímicas e comportamentais. Embora essa reação seja funcional em situações agudas — mobilizando recursos para a resposta de “lutar ou fugir” —, a sua persistência configura o estresse crônico, estado que compromete a homeostase do organismo, favorecendo o desenvolvimento de patologias e a redução da longevidade.
Fisiopatologia do Estresse
A compreensão do estresse envolve uma complexa interação de sistemas biológicos e psicológicos.
Mecanismos Hormonais e Metabólicos
O estresse crônico está associado a uma maior ativação do eixo Hipotálamo-Pituitária-Adrenal (HPA) e a um aumento da atividade simpato-adrenal, resultando em um humor negativo e, frequentemente, no fenômeno do “comer emocional” (1). A ativação do eixo HPA promove uma maior liberação de cortisol, enquanto a ativação simpato-adrenal libera adrenalina e noradrenalina na corrente sanguínea (1).
Estudos têm demonstrado associação entre o “estresse percebido” e o ganho de peso, bem como o acúmulo de gordura abdominal, sendo que a ansiedade mostra uma relação dose-resposta com esse acúmulo (1). Embora o estresse não altere a percepção do apetite, observa-se um aumento na ingestão calórica. Durante uma “tarefa estressante”, também há um aumento nos níveis de cortisol, glicose e insulina no sangue (1). Esse aumento do consumo calórico é parcialmente explicado por uma maior ativação da área de “recompensa” cerebral (1).
A elevação crônica do eixo HPA pode promover o acúmulo de gordura abdominal e o aumento do peso corporal devido ao aumento do cortisol, que, além disso, influencia condições como o diabetes tipo 2, hipertensão, dislipidemia e doenças cardiovasculares (1).
Fisiopatologia da Resposta ao Estresse e Neurotoxicidade
A denominada “síndrome de emergência” é altamente adaptativa para a resolução de crises agudas. Contudo, a persistência dessa mobilização torna a resposta fisiológica mais deletéria que o próprio agente estressor, fato particularmente observável no estresse psicológico manifestado como ansiedade cotidiana. (4)
Em nível neurológico, o estresse acarreta consequências significativas. As altas concentrações de corticoides apresentam neurotoxicidade para os neurônios do córtex pré-frontal e do hipocampo, podendo induzir à apoptose e consequentes déficits mnêmicos. Paradoxalmente, esses hormônios exercem efeito oposto na amígdala, onde ativam a neuroplasticidade, tornando-a hiperativa. Esse processo estabelece um ciclo de retroalimentação patológica com desfechos clínicos adversos. (4)
Estresse e Qualidade do Sono
O aumento do eixo HPA também influencia o sono, gerando um sono mais leve com maior número de interrupções (1). Contudo, não apenas o estresse gera prejuízos no sono, mas o próprio sono pode ser um fator estressante (1). Estudos encontraram que a privação de sono por duas noites foi associada a um aumento de 21% no cortisol (1). A má qualidade do sono também tem influência no estresse e no ganho de peso (1). A privação de sono, principalmente em adolescentes, foi associada a um maior consumo energético, o que pode ser explicado por mudanças na regulação do apetite e dos hormônios como leptina, grelina e GLP-1 (1).
Modelo Trifásico do Estresse
A visão mais clássica e antiga do estresse psicológico compreende que ele é formado por três fases distintas, conhecido como o modelo trifásico do estresse:
- Alerta: Esta fase ocorre quando um fator estressor é percebido. Por exemplo, em uma semana de avaliações acadêmicas, a lembrança súbita de uma prova esquecida pode gerar um estado de alerta, resultando em energia para iniciar o estudo (exemplo adaptado).
- Resistência: Se o estressor persiste, o indivíduo entra na fase de resistência. No cenário do estudo, a persistência na tarefa, mesmo com a sensação de não aptidão, leva aos primeiros sintomas de estresse, como esquecimento, sudorese e sentimentos catastróficos (exemplo adaptado).
- Exaustão: Se o estressor continua inabalável e os recursos do indivíduo se esgotam, ocorre a fase de exaustão. A insistência em uma tarefa que não gera aprendizado, combinada com a intensificação dos sintomas de estresse e a redução da atenção, indica a chegada a este ponto, onde a continuidade da tentativa torna-se disfuncional (exemplo adaptado).
É fundamental compreender que, embora o exemplo ilustre um cenário de curto prazo, o indivíduo pode permanecer dias ou semanas em cada fase, o que pode resultar em danos irreparáveis à saúde mental e à qualidade dos relacionamentos sociais. Embora o organismo seja adaptado ao estresse agudo, que surge e dura pouco tempo, o mesmo não se pode dizer sobre o estresse crônico, que é uma condição patológica capaz de prejudicar a concentração e a memória, além de estar associado a desordens psiquiátricas como depressão, esquizofrenia e transtorno de estresse pós-traumático (PTSD) (2).
Suscetibilidade ao Estresse
Alguns estudos associaram deficiências de nutrientes como Vitamina D, Niacina, Folato, Vitamina B6, B12 e Ômega-3 a uma maior suscetibilidade ao estresse e à depressão (1). Além disso, polimorfismos no gene do receptor de glicocorticoides, que estão associados a uma maior secreção basal de cortisol, também podem aumentar a suscetibilidade ao estresse (1).
Teoria dos Temas da Vida
A Teoria dos Temas da Vida sugere que indivíduos cronicamente estressados podem encarar o estresse como um “tema” recorrente em suas vidas. Nesses casos, mesmo que o cenário e os personagens mudem, o “roteiro” permanece o mesmo, levando a uma repetição de padrões ansiogênicos. Esta teoria auxilia a compreender que, embora existam ambientes favoráveis ao estresse, a forma como o indivíduo o percebe e lida com ele é, em última instância, também um problema intrínseco.
Etiologia Psicossocial e Cronificação
No contexto contemporâneo, o estresse tende a apresentar caráter contínuo, sendo frequentemente precipitado por mecanismos psicológicos. Os gatilhos incluem conflitos familiares, instabilidade financeira, exclusão social e pressão laboral, somados a fatores ambientais como poluição e isolamento social. (4)
O estado de ansiedade e/ou depressão decorrente altera o padrão cognitivo, fomentando pensamentos negativos que amplificam a resposta ao estresse. Isso impulsiona comportamentos de esquiva, tais como sobrecarga de trabalho, abuso de substâncias, distorções na autoavaliação e isolamento. Consequentemente, observa-se a autoperpetuação do estresse, mantendo mecanismos de defesa ativos por períodos prolongados e promovendo um desgaste biológico não previsto evolutivamente. Em casos de intensidade e duração extremas, especialmente no âmbito laboral, pode-se instalar a Síndrome de Burnout (esgotamento profissional). (4)
Estratégias de Enfrentamento do Estresse em Jovens Adultos
De forma geral, o enfrentamento do estresse pode ser dividido em duas amplas categorias (3):
- Enfrentamento focado na emoção: Consiste na tentativa de lidar com as emoções associadas à experiência de um determinado evento, por meio de táticas como recusar, pensar sobre ou reavaliar o evento sob outra perspectiva (3).
- Enfrentamento focado no problema: Envolve abordar o problema diretamente e desenvolver formas de ação para enfrentar e mudar uma situação desfavorável (3).
Há uma diferença de gênero na forma como os jovens adultos lidam com o estresse (3). Observou-se que mulheres em idade universitária são mais propensas a usar estratégias focadas na emoção do que homens na mesma faixa etária (3). Além disso, mulheres nessa idade tendem a experimentar níveis mais elevados de estresse (3).
Modulação Fisiológica via Práticas Contemplativas
Evidências científicas reiteradas demonstram a eficácia da meditação no manejo do estresse. A prática contemplativa não apenas aprimora a percepção subjetiva do estresse, mas também promove alterações quantificáveis em indicadores fisiológicos: (4)
- Redução dos níveis de cortisol circulante; (4)
- Regulação da atividade cardíaca; (4)
- Elevação das imunoglobulinas sanguíneas, sugerindo otimização do sistema imunológico; (4)
- Modulação do sistema nervoso autônomo, com diminuição da atividade simpática e incremento da ativação parassimpática. (4)
Adicionalmente, observam-se alterações morfofuncionais encefálicas, incluindo a redução da atividade e do volume estrutural da amígdala. Tais achados fundamentam a recomendação clínica da meditação como ferramenta terapêutica. (4)
Mecanismos de Regulação Vagal e Respiratória
Embora as bases neurofisiológicas das práticas meditativas careçam de elucidação completa, sabe-se que a indução de um padrão respiratório lento e profundo eleva a atividade do sistema parassimpático. Este sistema antagoniza o sistema simpático (responsável pela resposta de “lutar ou fugir”), desencadeando respostas de “descansar e interagir”. (4)
O nervo vago é o principal componente do sistema parassimpático, atuando na inervação cardíaca e visceral. Ele desempenha dupla função: transmite ordens motoras e conduz informações sensoriais viscerais ao cérebro, monitorando a homeostase interna. Sua ativação induz o repouso corporal e desloca o funcionamento do organismo para o modo de recuperação. (4)
O ritmo respiratório lento estimula centros nervosos na base do encéfalo que regulam a atividade parassimpática, resultando no aumento do tônus vagal. Esse incremento correlaciona-se clinicamente com: (4)
- Sensação de bem-estar; (4)
- Redução da ansiedade; (4)
- Aumento da capacidade de regulação emocional. (4)
Enquanto as práticas contemplativas representam um meio eficiente de regulação do estresse, outras intervenções, como o exercício físico, também demonstram ação benéfica comprovada na modulação desses sistemas. (4)
Conduta Clínica e Terapêutica
Terapia Nutricional
A nutrição desempenha um papel importante no manejo do estresse e na saúde mental:
- A combinação de vitaminas do complexo B com cálcio e magnésio demonstrou efeitos benéficos no estresse, ansiedade e no humor percebido (1).
- A suplementação de Ômega-3 tem mostrado melhora em pacientes com depressão (1).
- A inclusão de fontes de triptofano foi capaz de reduzir o estresse agudo e a resposta do eixo HPA (1).
Fitoterapia
A Passiflora incarnata tem sido estudada por seus potenciais efeitos ansiolíticos. Um estudo em ratos demonstrou que o uso de longo prazo da Passiflora incarnata foi correlacionado com níveis diminuídos de estresse e, consequentemente, um aumento na motivação para agir e na atividade motora (2).
Referências Bibliográficas
- GEIKER, N. R. W. et al. Does stress influence sleep patterns, food intake, weight gain, abdominal obesity and weight loss interventions and vice versa? Obes Rev., v. 19, n. 1, p. 81–97, 2018.
- JANDA, K. et al. Passiflora incarnata in neuropsychiatric disorders— a systematic review. Nutrients, v. 12, n. 12, p. 1–17, 2020.
- PAPALIA, D. E.; MARTORELL, G. Desenvolvimento Humano. 14. ed. Porto Alegre: Artmed, 2022. v. 1.
- COSENZA, Ramon M. Neurociência e mindfulness: meditação, equilíbrio emocional e redução do estresse. Porto Alegre: Artmed, 2021.