Glândula Tireoide: Regulação, Síntese e Funções Hormonais


Glândula Tireoide: Regulação, Síntese e Funções Hormonais


Introdução

A glândula tireoide, localizada inferiormente à cartilagem tireoide (pomo de Adão), desempenha um papel crucial na regulação metabólica e na manutenção da homeostase. Ela é responsável pela produção e secreção de hormônios essenciais, como a tiroxina (T4), tri-iodotironina (T3), T3 reverso e calcitonina (2, 3).


Regulação da Secreção Hormonal Tireoidiana

A função tireoidiana é meticulosamente controlada por um eixo hipotalâmico-hipofisário-tireoidiano. A tireoide é estimulada pelo hormônio estimulante da tireoide (TSH), liberado pela hipófise anterior, que, por sua vez, é estimulado pelo hormônio liberador de tireotrofina (TRH), proveniente do hipotálamo (2, 3).

Os hormônios tireoidianos (T4 e T3) exercem um mecanismo de retroalimentação negativa (feedback negativo). Dessa forma, baixos níveis circulantes de T4 e T3 promovem o aumento da secreção de TSH. Inversamente, níveis elevados de T4 e/ou T3 no sangue suprimem a produção de TSH, com exceção de indivíduos que apresentem distúrbios hipotalâmico-hipofisários (3).


Síntese dos Hormônios Tireoidianos

Os hormônios T3 e T4 são sintetizados a partir do aminoácido tirosina, que se incorpora à molécula de tireoglobulina durante o processo de síntese hormonal (2). Para a formação normal de tiroxina, é necessária uma ingestão de aproximadamente 50 mg/ano de iodeto, o que equivale a cerca de 1 mg/semana (2).

A captação de iodeto pela tireoide é influenciada por diversos fatores, mas o principal estímulo é o TSH, que promove a atividade das bombas de iodeto nas células tireoidianas, aumentando a concentração de iodo em até oito vezes (2). O TSH também estimula a iodação da tirosina para a formação dos hormônios tireoidianos, o aumento do tamanho e da atividade secretora das células tireoidianas, e o aumento do número de células tireoidianas (2). Muitos desses efeitos do TSH resultam da ativação do sistema do “segundo mensageiro”, o monofosfato de adenosina cíclico (AMPc) (2).

A secreção de TSH é controlada pelo TRH (2). Estímulos externos, como o frio, são capazes de influenciar a liberação de TRH e, consequentemente, de TSH, resultando em um aumento do metabolismo (2). Por outro lado, agitação e ansiedade podem induzir um efeito inverso ao do frio, devido à geração de calor, levando a uma diminuição na secreção (2). O efeito de feedback dos hormônios tireoidianos, independentemente do local de ocorrência, contribui para manter suas concentrações quase constantes nos fluidos corporais circulantes (2).


Metabolismo Periférico dos Hormônios Tireoidianos

O T4 representa cerca de 93% dos hormônios produzidos pela tireoide, contudo, o T3 é aproximadamente quatro vezes mais potente (3). Por essa razão, ocorre a conversão do T4 em T3, um processo catalisado pelas enzimas deiodinases, que são dependentes de selênio (3). Existem três deiodinases conhecidas, cada uma com localização e funções específicas:

  • Deiodinase 1 (DI1): Encontrada no fígado, rins, tireoide e hipófise. Atua na liberação de T3 da membrana plasmática para o líquido extracelular (3).
  • Deiodinase 2 (DI2): Presente no sistema nervoso central, hipófise, tecido adiposo marrom, placenta, tireoide e músculo esquelético, sendo responsável pela geração de T3 nos próprios tecidos (3).
  • Deiodinase 3 (DI3): Localizada no SNC, pele, fígado e placenta, esta deiodinase está envolvida na conversão do T4 em T3 inativo ou T3 reverso, e sua subsequente degradação (3).

Embora 93% dos hormônios metabolicamente ativos sejam tiroxina (T4) e 7% tri-iodotironina (T3), quase todo o T4 é convertido em T3 nos tecidos periféricos (2). As funções de ambos os hormônios são semelhantes, diferindo apenas na velocidade e potência de ação, sendo o T3 quatro vezes mais potente que o T4 (2).

Após a degradação, o hormônio conjugado na forma de glucuronatos ou sulfatos é encontrado na bile e no intestino, onde completa o ciclo êntero-hepático – uma parte é eliminada pelas fezes e outra é reabsorvida (3). É importante ressaltar que a desnutrição, o jejum, dietas hipocalóricas, febre e danos hepáticos ou renais favorecem a formação de T3 reverso. Esse processo implica em menor formação de T3 ativo e, consequentemente, em uma diminuição do metabolismo basal (3).


Alterações Hormonais e Implicações Clínicas

O excesso ou a deficiência de T4 e T3 interfere diretamente na funcionalidade de órgãos e tecidos, podendo resultar em disfunções leves, moderadas ou graves, que frequentemente comprometem a qualidade de vida (3). A ausência de atividade tireoidiana pode levar a uma queda do metabolismo basal para 40% a 50% do normal, enquanto um excesso extremo pode aumentá-lo em 60% a 100% (2). Além das alterações metabólicas, o crescimento também é afetado (2). Quando ocorre uma interrupção na síntese dos hormônios tireoidianos, os efeitos fisiológicos da deficiência podem levar meses para serem observados (2).


Funções Fisiológicas dos Hormônios Tireoidianos

O principal efeito dos hormônios tireoidianos é um aumento generalizado da atividade funcional de todo o organismo (2). Os receptores desses hormônios estão ligados ou próximos às fitas de DNA genético, o que promove o aumento da produção de diversas proteínas, elevando, por sua vez, as funções dessas proteínas (2). Os hormônios tireoidianos também exercem efeitos não genômicos, como a regulação de canais iônicos, fosforilação oxidativa e ativação de segundos mensageiros intracelulares (2).

Os hormônios tireoidianos estimulam o metabolismo dos carboidratos, resultando em aumento da captação de glicose, intensificação da glicólise e gliconeogênese, melhora da absorção intestinal e até mesmo da secreção de insulina (2). No metabolismo das gorduras, eles promovem a mobilização mais rápida de lipídios no tecido adiposo, reduzindo o acúmulo de tecido adiposo no organismo, elevando a concentração de ácidos graxos no plasma e aumentando sua oxidação pelas células (2). Além disso, reduzem as taxas de colesterol, fosfolipídios e triglicerídeos no plasma; contudo, a redução em sua liberação, além de elevar essas taxas, quase sempre provoca o acúmulo de lipídios no fígado (2).

Em relação ao sistema nervoso central, o excesso de hormônios tireoidianos pode levar a cansaço e sonolência excessiva, apesar da dificuldade em iniciar o sono (2). Os hormônios também aumentam a secreção de diversas outras glândulas endócrinas, mas concomitantemente elevam as necessidades teciduais desses hormônios (2).


Hormônios Específicos da Tireoide

TSH – Tireotropina

O TSH (Tireotropina) é um hormônio glicoproteico secretado pela hipófise anterior, cuja principal função é estimular a secreção de T4 (tiroxina) e T3 (tri-iodotironina) pela tireoide (2). Seus efeitos ocorrem devido a:

  • Aumento da proteólise da tireoglobulina, com consequente aumento da liberação de hormônios tireoidianos (este é o efeito mais precoce) (2).
  • Aumento da atividade da bomba de iodeto, elevando a captação de iodo pelas células glandulares em até oito vezes (2).
  • Aumento da iodação da tirosina, promovendo a formação dos hormônios tireoidianos.
  • Aumento do tamanho e da atividade secretora das células tireoidianas.
  • Aumento do número de células tireoidianas.

Tiroxina – T4

A Tiroxina (T4) é o principal produto hormonal resultante da reação de acoplamento de resíduos de iodotirosina (2). É um hormônio anabólico secretado pela tireoide (1), essencialmente dependente da ingestão dietética de iodo para sua síntese (1). O T4 influencia o metabolismo dos combustíveis, bem como o crescimento e a diferenciação celular (1). É capaz de aumentar o metabolismo basal, desempenhando um papel crucial na termogênese (1).

T3 Reverso (rT3)

O T3 reverso (rT3) é fisiologicamente inativo. É produzido em pequena quantidade pela glândula tireoide e também gerado em alguns tecidos corporais a partir da conversão do T4 (3).

Calcitonina

A calcitonina é um hormônio produzido nas células parafoliculares da tireoide (3). Sua principal função é a regulação das concentrações sanguíneas de cálcio: quando há um aumento da calcemia, a calcitonina é secretada, estimulando a deposição de cálcio nos ossos (3). Por outro lado, o paratormônio exerce efeitos opostos à calcitonina, estimulando o aumento da calcemia por descalcificação óssea, diminuição da eliminação renal e aumento na absorção intestinal de cálcio (3).

Em casos de tireoidectomia total, a produção de calcitonina é perdida. No entanto, a terapia de reposição de calcitonina não é rotineiramente administrada após a remoção cirúrgica da tireoide, pois os hormônios sexuais (estrógeno, progesterona e testosterona) podem ter efeitos similares à calcitonina, aumentando a densidade mineral óssea (3). Dessa forma, a reposição de calcitonina (por meio de spray nasal) é reservada para outros casos patológicos de desmineralização óssea, como a doença de Paget e alguns casos de osteoporose (3).


Referências Bibliográficas

  1. DOMINICZAK, M. Série Carne e Osso: Metabolismo. 1. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. 244 p.
  2. HALL, J. E.; GUYTON, A. C. Tratado de Fisiologia Médica. 13. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017. 1–1176 p.
  3. SILVA, S. M. C. S.; MURA, J. D. P. Tratado de Alimentação, Nutrição & Dietoterapia. 3. ed. São Paulo: Editora Pitaya, 2016. 1308 p.

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