Insuficiência Cardíaca: Fisiopatologia, Classificação e Abordagens Terapêuticas


Insuficiência Cardíaca: Fisiopatologia, Classificação e Abordagens Terapêuticas


Introdução

A insuficiência cardíaca (IC) é uma síndrome clínica complexa e heterogênea, caracterizada pela incapacidade do coração de bombear sangue de forma adequada para suprir as demandas metabólicas do organismo. Sua fisiopatologia envolve uma intrincada rede de mecanismos que vão desde alterações hemodinâmicas até disfunções orgânicas sistêmicas, incluindo a interação com a microbiota intestinal.


Fisiopatologia da Insuficiência Cardíaca

A insuficiência cardíaca apresenta fenótipos distintos de apresentação e diversos alvos terapêuticos (3). Os principais fenótipos incluem:

  • Insuficiência Cardíaca Crônica com Fração de Ejeção Reduzida (ICFER) (3).
  • Insuficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Preservada (ICFEP) (3).
  • Insuficiência Cardíaca Descompensada Aguda (ICDA) (3).
  • Insuficiência Cardíaca Avançada (3).

Pacientes com níveis elevados de citocinas inflamatórias, como TNF-α, IL-1 e IL-6, estão associados a sintomas clínicos mais severos e a um maior risco de mortalidade (1). Há fortes evidências de que esses mediadores inflamatórios influenciam a apoptose, hipertrofia e fibrose cardíaca (1).

Insuficiência Cardíaca, Intestino e Microbiota

A diminuição do débito cardíaco na IC resulta em adaptações na circulação sistêmica, levando à congestão em diversos órgãos, incluindo a parede intestinal (1). A redução da perfusão sanguínea afeta a estrutura dos vilos na mucosa intestinal, resultando em acidose, um achado comum em aproximadamente metade dos pacientes com insuficiência cardíaca (1).

Postula-se que ocorre um edema na parede gastrointestinal, comprometendo a função da barreira intestinal e facilitando a translocação bacteriana (1). Essa translocação leva à endotoxemia, com consequente aumento da resposta inflamatória e do estresse oxidativo, ambos resultados da isquemia e congestão intestinal (1). O espessamento da parede intestinal, decorrente do edema, está diretamente correlacionado com os níveis circulantes de PCR (Proteína C Reativa), leucócitos sanguíneos e marcadores de permeabilidade intestinal (1).

Além das alterações funcionais, observa-se uma modificação na composição e diversidade da microbiota bacteriana nesses pacientes (1). Estudos indicam que o metabolismo bacteriano, particularmente a produção de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), pode influenciar o tônus vascular e a pressão sanguínea do hospedeiro (1). Bactérias produtoras de acetato são consideradas intervenções protetoras no tratamento da hipertensão, hipertrofia cardíaca e no desenvolvimento de fibroses (1).

Hipertensão e Insuficiência Cardíaca

Na maioria dos casos de hipertensão, ocorre um aumento da resistência periférica, forçando o ventrículo esquerdo do coração a intensificar seu esforço para bombear o sangue através do sistema (2). Com o tempo, essa sobrecarga pode levar à hipertrofia ventricular esquerda e, eventualmente, à insuficiência cardíaca (2).


Classificação e Abordagens Terapêuticas

Insuficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Preservada (ICFEP)

A terapia na ICFEP foca no controle da congestão, na estabilização da frequência cardíaca e da pressão arterial, e na tentativa de aumentar a tolerância aos exercícios (3). A experiência clínica demonstra que a redução da pressão arterial é capaz de melhorar significativamente os sintomas (3). Nesses casos, a identificação e o tratamento apropriado dos distúrbios da ventilação no sono devem ser fortemente considerados (3).

Insuficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Reduzida (ICFER)

Atualmente, os bloqueadores do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) e os betabloqueadores constituem a base da farmacoterapia para ICFER (3). Esses tratamentos promovem a atenuação do declínio da função cardíaca, melhora na estrutura e função cardíaca, resultando em redução dos sintomas, melhora na qualidade de vida, diminuição das hospitalizações e declínio na mortalidade, tanto por insuficiência da bomba quanto por arritmias (3).

Insuficiência Cardíaca Avançada

Geralmente observada em pacientes com ICFER, a insuficiência cardíaca avançada se manifesta em pacientes altamente sintomáticos e refratários ou incapazes de tolerar o tratamento em dose plena com antagonistas neuro-hormonais (3). Frequentemente, esses pacientes requerem doses crescentes de diuréticos e apresentam hiponatremia persistente e insuficiência renal, com episódios frequentes de descompensação cardíaca que necessitam de hospitalização (3). Pacientes nesse estágio apresentam risco máximo de morte relacionado à falência súbita ou progressiva da bomba cardíaca (3).

Insuficiência Cardíaca Descompensada Aguda (ICDA)

A ICDA é uma síndrome clínica heterogênea que leva à hospitalização do paciente, resultante de uma confluência de anormalidades inter-relacionadas, incluindo redução no desempenho cardíaco, disfunção renal e alterações na complacência vascular (3).

O tratamento desses pacientes é complexo e gira em torno do controle do volume e da redução da impedância vascular, enquanto se mantém a atenção à perfusão dos órgãos-alvo (coronárias e rins) (3). O primeiro passo é identificar e abordar os desencadeantes conhecidos da descompensação (3). Sempre que o quadro for sugestivo, deve-se investigar e tratar infecções e tromboembolismo pulmonar, tanto franco quanto oculto (3).

Uma etapa paralela no tratamento envolve a estabilização hemodinâmica naqueles que apresentam instabilidade. O uso rotineiro de cateter em artéria pulmonar não é recomendado, devendo ser restrito a pacientes que respondem mal à diurese ou que apresentam hipotensão ou sinais e sintomas sugestivos de baixo débito cardíaco, nos quais o alvo terapêutico não é atingido (3).


Conduta Clínica e Terapia Nutricional

Restrição de Sódio

A restrição de sódio é uma medida fundamental na conduta clínica de pacientes com insuficiência cardíaca, visando controlar a hipertensão e a homeostase de fluidos (1).

Dieta DASH

A adoção da Dieta DASH (Dietary Approaches to Stop Hypertension), rica em frutas, vegetais, grãos integrais, produtos lácteos com baixo teor de gordura e pobre em gorduras saturadas e colesterol, é recomendada para o controle da hipertensão.

Suplementação

  • Ômega-3: A suplementação de 1g/dia de EPA/DHA é recomendada na insuficiência cardíaca (4). O objetivo é controlar a inflamação e mitigar os efeitos intestinais adversos observados na IC (1).

Referências Bibliográficas

  1. TANG, W. H. W.; LI, D. Y.; HAZEN, S. L. Dietary metabolism, the gut microbiome, and heart failure. Nature Reviews Cardiology, v. 16, n. 3, p. 137–154, 2019. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1038/s41569-018-0108-7. Acesso em: [30 jun. 2025].
  2. MAHAN, L. K.; ESCOTT-STUMP, S.; RAYMOND, J. L. Krause Alimentos, Nutrição e Dietoterapia. 13. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. 1227 p.
  3. JAMESON, J. L. et al. Medicina Interna de Harrison. 20. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2021. 3522 p.
  4. SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 109, n. 2, supl. 1, p. 1-125, 2017.

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