O Lítio na Prática Clínica: Farmacologia e Considerações Terapêuticas
Introdução
O lítio é um cátion monovalente que, apesar de sua eficácia estabelecida, apresenta desafios no manejo clínico devido à sua estreita janela terapêutica e potencial para toxicidade, sendo primariamente empregado no controle do transtorno maníaco-depressivo.
Aspectos Farmacológicos e Mecanismo de Ação
O lítio demonstra eficácia clínica em uma concentração plasmática que varia de 0,5 a 1 mmol/L. Concentrações superiores a 1,5 mmol/L já estão associadas a múltiplos efeitos tóxicos, o que ressalta a natureza estreita de sua janela terapêutica. (1)
Simulação Iônica e Efeitos Bioquímicos
O lítio atua como um cátion monovalente capaz de simular o papel do sódio (Na+) em tecidos excitáveis. Ele pode permear os canais de Na+ controlados por voltagem responsáveis pela geração dos potenciais de ação. (1)
Os efeitos bioquímicos do lítio são multifacetados e envolvem a inibição de diversas enzimas que participam nas vias de transdução de sinais. (1)
- Inibição da Proteína G: O lítio inibe a função da proteína G, resultando na redução da ativação do canal de K+ e na diminuição da produção de cAMP induzida por hormônios. (1)
- Bloqueio de Respostas Celulares: O lítio também bloqueia outras respostas celulares específicas, como a resposta das células tubulares renais ao hormônio antidiurético e a resposta da tireoide ao hormônio tireoestimulante. (1)
Mecanismo de Ação Hipotético
Embora o mecanismo de ação completo do lítio não esteja totalmente elucidado, as principais hipóteses bioquímicas incluem:
- Interferência na formação de trifosfato de inositol. (1)
- Inibição de quinases. (1)
Farmacocinética e Perfil de Toxicidade
Administração e Eliminação
O lítio é administrado por via oral, geralmente como sal de carbonato, e sua eliminação ocorre primariamente pela via renal. (1)
A farmacocinética do lítio é caracterizada por uma eliminação bifásica. Cerca de metade da dose oral é eliminada em aproximadamente 12 horas, mas o restante, que presumivelmente representa o lítio captado pelas células, é eliminado durante o período de uma a duas semanas subsequentes. Esta fase de eliminação lenta implica que, com a dosagem regular, o lítio se acumula lentamente por duas semanas ou mais antes que o estado de equilíbrio (steady-state) seja alcançado. (1)
Toxicidade e Monitoramento
O manejo do lítio é considerado desafiador, pois exige monitoramento constante da concentração plasmática. Além disso, há um potencial elevado para problemas em pacientes com lesão renal preexistente e em situações de interações medicamentosas, como aquelas que envolvem diuréticos. (1)
Os principais efeitos tóxicos que podem ocorrer durante o tratamento crônico incluem:
- Gastrointestinais:
- Náuseas, vômito e diarreia. (1)
- Neurológicos/Motores:
- Tremor. (1)
- Renais:
- Poliúria (com sede secundária), resultante da inibição da ação do hormônio antidiurético. (1)
- Retenção de Na+ associada ao aumento da secreção de aldosterona. (1)
- Com o tratamento prolongado, pode ocorrer lesão tubular renal grave, tornando o monitoramento regular da função renal essencial para todos os pacientes em uso de lítio. (1)
- Endócrinos:
- Aumento do volume da tireoide, por vezes associado ao hipotireoidismo. (1)
- Outros:
- Ganho de peso e perda de cabelo. (1)
A toxicidade aguda pelo lítio manifesta-se com diversos efeitos neurológicos, progredindo de confusão e comprometimento motor para coma, convulsões e morte se a concentração plasmática atingir 3 a 5 mmol/L. (1)
Referências Bibliográficas:
1- RITTER, James M. et al. Rang & Dale: farmacologia. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2020.