Neurogênese no Cérebro: Da Formação Embrionária à Plasticidade Adulta


Neurogênese no Cérebro: Da Formação Embrionária à Plasticidade Adulta


Introdução

A neurogênese é o processo biológico fundamental pelo qual novos neurônios são gerados no cérebro. Embora crucial durante o desenvolvimento embrionário, a formação de novos neurônios persiste em regiões específicas do cérebro após o nascimento e ao longo de toda a vida.


Definição e Diversidade Neural

A neurogênese é definida como o processo pelo qual novos neurônios são formados no cérebro. É um processo essencial durante o desenvolvimento de um embrião, mas sua ocorrência se estende a certas regiões cerebrais após o nascimento e por toda a vida (1). O cérebro maduro apresenta inúmeras áreas com funções especializadas e neurônios que diferem em estrutura e conexões. O hipocampo, por exemplo, uma região cerebral vital para a memória e orientação espacial, possui pelo menos 27 tipos distintos de neurônios. Essa notável diversidade neuronal no cérebro é um resultado da neurogênese regulada durante o desenvolvimento embrionário (1).

Nesse processo, as células-tronco neurais se diferenciam, ou seja, adquirem características de diversos tipos de células especializadas, em momentos e regiões cerebrais específicas. As células-tronco possuem a capacidade de se dividir indefinidamente para gerar mais células-tronco ou de se diferenciar para originar células mais especializadas, como as células progenitoras neurais (1).

Até recentemente, os neurocientistas acreditavam que o Sistema Nervoso Central, incluindo o cérebro, era incapaz de realizar neurogênese e de se regenerar. No entanto, a descoberta de células-tronco em partes do cérebro adulto na década de 1990 consolidou a neurogênese adulta como um processo normal em cérebros saudáveis (1). Nos últimos anos, tornou-se evidente que, no cérebro adulto, existem duas regiões com proliferação ativa que geram neurônios continuamente ao longo da vida: a zona subependimal (ou zona subventricular) do ventrículo lateral e a camada subgranular do giro denteado no hipocampo (1).


Regulação da Neurogênese em Condições Patológicas

A morte celular não é um pré-requisito para a neurogênese induzida por lesão. Estudos recentes demonstram que lesões cerebrais agudas, como as causadas por isquemia, convulsões e traumas, podem estimular a neurogênese no hipocampo adulto (1). A neurogênese também pode ser intensificada por atividade convulsiva, isquemia global leve do prosencéfalo e acidente vascular cerebral não associado à morte neuronal no hipocampo (1).

As consequências funcionais da neurogênese induzida por lesão ainda não são totalmente compreendidas. É possível que o aumento da neurogênese atue como um mecanismo compensatório, substituindo neurônios perdidos e neutralizando deficiências funcionais (1). Além disso, foi demonstrado que a aprendizagem por meio de tarefas dependentes do hipocampo melhora a sobrevivência das células recém-formadas, enquanto tarefas de aprendizagem independentes do hipocampo não influenciam a geração de novos neurônios (1).

Atualmente, investiga-se os efeitos da atividade física na proliferação de células na região subgranular do giro denteado. Resultados preliminares em hamsters indicam que o exercício voluntário em uma roda de corrida aumenta a neurogênese no giro denteado. Pesquisadores sugerem que mais estudos são necessários para compreender se essa neurogênese adulta contribui para os papéis funcionais do hipocampo, como plasticidade sináptica, aprendizagem e memória (1).


Neurogênese, Aprendizagem e Memória

O envolvimento do hipocampo na aprendizagem e na memória é reconhecido há muito tempo. Presume-se que a plasticidade sináptica dentro da formação hipocampal contribua para a aquisição e retenção de memórias, embora os mecanismos exatos ainda estejam sob investigação (1). Nas últimas quatro décadas, um volume considerável de evidências tem demonstrado que o giro denteado (GD) do hipocampo adulto produz novos neurônios em números substanciais, um fenômeno observado em uma ampla gama de espécies de mamíferos, incluindo humanos (1).

A memória é a capacidade de um organismo de codificar, armazenar e recuperar informações para guiar o comportamento. A aprendizagem é vista como a aquisição ou codificação dessas informações na memória (1). A estreita relação entre déficits de memória e condições patológicas é notável. A presença ou ausência de um traço de memória (engrama) é frequentemente definida por uma alteração em um comportamento específico (por exemplo, um rato com lesões no hipocampo pode se perder em um labirinto espacial) ou pela capacidade de aprender/recordar (1).

Outra perspectiva aceita é que não existe uma “memória universal”, mas sim diversos sistemas de memória com recursos cerebrais específicos (parcialmente concorrentes, mas também compartilhados) para cumprir suas tarefas (1). Há um conceito de que a memória pode ser armazenada (pelo menos em mamíferos) em mudanças distribuídas nas redes sinápticas, que podem modular a sincronização e o agrupamento de disparos de montagens neuronais (1). Uma introspecção mais aprofundada sobre o engrama e sua natureza levanta muitas questões sobre estabilidade, localização, curso temporal de possíveis mudanças, e a consolidação e transformação de um traço de memória (1).

O papel da formação do hipocampo na aprendizagem e na memória é conhecido há um tempo considerável (1). No entanto, apesar de décadas de pesquisa intensiva, a base neurobiológica exata desse processo no hipocampo permanece enigmática. Há mais de 30 anos, descobriu-se que a produção de novos neurônios ocorria no cérebro de roedores adultos (1). Mais recentemente, a documentação da neurogênese adulta na formação do hipocampo de uma variedade de mamíferos, incluindo humanos, sugeriu uma nova abordagem para a compreensão das bases biológicas da função hipocampal (1). As teorias contemporâneas sobre a função hipocampal incluem um papel importante para essa região do cérebro na aprendizagem associativa. A adição de novos neurônios e, consequentemente, sua nova contribuição para o circuito do hipocampo pode ser um mecanismo para relacionar eventos espacial ou temporalmente distintos (1).


Novos Neurônios e Aprendizagem

Associações positivas entre o número de novos neurônios e o desempenho de aprendizagem podem indicar uma relação entre neurogênese e aprendizado, embora não necessariamente causal (1). Diversas linhas de evidência sugerem uma correlação positiva entre neurogênese e aprendizagem em mamíferos (1). Diferenças na taxa de neurogênese adulta em camundongos têm demonstrado variações associadas ao aprendizado. Por exemplo, ratos com o menor número de novos neurônios apresentaram desempenho inferior em uma tarefa de navegação espacial quando testados em um labirinto de água (1). Adicionalmente, alguns ratos mutantes com neurogênese hipocampal diminuída mostraram desempenho prejudicado em tarefas de aprendizagem dependentes do hipocampo (1). Resultados análogos foram observados em ratos idosos (1). Contudo, existem alguns outros relatos em que essa relação foi dissociada ou pareceu ser revertida (1).


Referências Bibliográficas

  1. Bear MF, Connors BW, Paradiso MA. Neurociências – Desvendando o sistema nervoso. 4. ed. Porto Alegre: ArtMed; 2017. 974 p.