A Terapia Cognitivo-Comportamental: Conceitos, Modelos e Aplicações


A Terapia Cognitivo-Comportamental: Conceitos, Modelos e Aplicações


Introdução

A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é uma forma de psicoterapia que se baseia na premissa de que os pensamentos disfuncionais influenciam diretamente o humor e o comportamento. Desenvolvida inicialmente por Aaron Beck, a TCC evoluiu para diversas abordagens que compartilham uma formulação cognitiva central, focada em crenças mal-adaptativas e estratégias comportamentais.


O que é Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)?

Aaron Beck foi o pioneiro no desenvolvimento de uma forma de psicoterapia estruturada, de curta duração e orientada para o presente, inicialmente denominada “terapia cognitiva” nas décadas de 1960 e 1970. Atualmente, o termo “terapia cognitiva” é frequentemente utilizado como sinônimo de “Terapia Cognitivo-Comportamental” (TCC) (2).

Subsequentemente, diversas formas de TCC foram desenvolvidas a partir do modelo original de Beck. Em todas essas variações, o tratamento fundamenta-se em uma formulação cognitiva, que abrange as crenças mal-adaptativas, as estratégias comportamentais e os fatores que perpetuam um transtorno específico (2). Apesar de algumas formas de TCC compartilharem características com a terapia de Beck, suas formulações e ênfases podem variar consideravelmente (2). É importante ressaltar que a TCC derivada do modelo de Beck frequentemente integra técnicas de diversas psicoterapias baseadas em evidências dentro de uma estrutura cognitiva (2).


Modelo Teórico da Terapia Cognitivo-Comportamental

O modelo cognitivo postula que o pensamento disfuncional é um elemento comum a todos os transtornos psicológicos, influenciando diretamente o humor e o comportamento do paciente. Quando os indivíduos aprendem a avaliar seus pensamentos de maneira mais realista e adaptativa, observam uma redução na emoção negativa e no comportamento mal-adaptativo (2).

Em uma abordagem orientada para a recuperação, o terapeuta auxilia o paciente a avaliar seus pensamentos automáticos, com um foco maior nas cognições que podem surgir e interferir nos objetivos de recuperação, em vez de se limitar às cognições já manifestas (2).

As cognições, tanto adaptativas quanto mal-adaptativas, manifestam-se em três níveis distintos:

  1. Pensamentos automáticos: Representam o nível mais superficial da cognição. São verbalizações ou imagens que surgem espontaneamente na mente, como, por exemplo, “estou muito cansado para fazer qualquer coisa” (2).
  2. Crenças intermediárias: Incluem os pressupostos subjacentes, como “se eu tentar iniciar relacionamentos, serei rejeitado” (2).
  3. Crenças nucleares: Constituem o nível mais profundo das cognições, abrangendo as convicções fundamentais sobre si mesmo, os outros e o mundo (p. ex., “estou desamparado”; “o mundo é perigoso”) (2).

Para que ocorra uma melhora duradoura no humor e no comportamento dos pacientes, o trabalho terapêutico deve abranger todos esses três níveis (2). Por exemplo, a persistente subestimação das próprias habilidades pode estar associada a uma crença nuclear de incompetência. A modificação dessa crença central, permitindo uma autoavaliação mais realista, pode alterar a percepção do paciente em relação às situações cotidianas (2).

O modelo cognitivo se expandiu significativamente desde suas formulações iniciais por Beck e Ellis (1). Inicialmente, a ênfase recaía no conteúdo específico do pensamento, como as categorias típicas de distorções de pensamentos automáticos, pressupostos subjacentes e esquemas ou crenças centrais (1). Atualmente, o modelo enfatiza a necessidade de determinar como os esquemas afetam a atenção e a memória e como eles perpetuam as crenças problemáticas (1). Desse modo, o modelo cognitivo identifica o papel do viés de confirmação e do processamento esquemático na manutenção das crenças negativas em indivíduos deprimidos, mesmo diante de informações positivas que as contradigam (1).

Essa estrutura permanece relevante, sendo ampliada para incluir o reconhecimento de que os transtornos de personalidade são caracterizados por esquemas persistentes sobre o self e os outros, e por estilos de compensação, evitação ou manutenção dos esquemas (1). Além disso, o conceito de modos introduz padrões sistêmicos e coordenados que organizam a cognição, o comportamento motivacional, o funcionamento interpessoal e as respostas emocionais em torno de sistemas consistentes e autossustentáveis, como raiva, mania ou depressão (1). O modo é um construto superior que representa a coordenação desses componentes, servindo para se manter e se expandir para novas áreas da vida (1).

O modelo cognitivo postula que problemas como depressão, ansiedade e raiva são mantidos, ativados ou exacerbados por vieses no pensamento (1). No cerne desses vieses, encontram-se os esquemas, que são padrões consistentes de organização da informação em torno de um conceito preexistente (1). Embora tanto o modelo de Beck quanto o modelo de esquemas de Young destaquem o desenvolvimento precoce desses esquemas na infância, pesquisas sobre o processamento esquemático indicam que eles podem ser formados em qualquer fase da vida e que sua formação ocorre fora da consciência imediata (1).

Apesar de esses esquemas operarem com automaticidade, o modelo cognitivo propõe que eles podem ser acessados na percepção consciente por meio de diversas técnicas, visando, em parte, tornar explícito o que está implícito (1). A abordagem cognitiva ressalta a importância de testar a construção da realidade feita pelo paciente, comparando-a com os fatos disponíveis (1). A terapia busca desvendar, por meio de questionamentos e experimentos comportamentais, as convicções do paciente e os padrões habituais de pensamento subjacentes aos seus problemas (1).

Pensamentos Automáticos e Reações

Embora comumente se atribua as reações emocionais e comportamentais a situações externas, o modelo cognitivo demonstra que o que de fato causa essas reações são as interpretações que fazemos das situações e eventos vivenciados. A TCC teoriza que cada evento ou situação gera uma interpretação, um pensamento automático, que surge espontaneamente na mente, sem deliberação (2).

Quando esses pensamentos automáticos surgem, eles geram reações que se manifestam em quatro domínios:

  • Emoção
  • Comportamento
  • Resposta fisiológica

As pessoas podem sentir felicidade, tristeza, ansiedade, medo ou raiva, e apresentar comportamentos associados a essas emoções. Contudo, a presença de tristeza ou ansiedade não implica necessariamente um problema na cognição ou interpretação (2).

Por exemplo, um indivíduo deprimido frequentemente exibe uma visão negativa de si mesmo, da vida em geral e do futuro, o que pode levá-lo a relutar em tentar novos comportamentos, temendo o fracasso e o consequente aumento da desmoralização e sofrimento (1). A terapia busca estimular uma maior consciência dos pensamentos que podem estar moldando e impulsionando essa negatividade, introduzindo dúvidas fundamentais sobre a infalibilidade dessa forma de pensar (1). O terapeuta encoraja o ceticismo em relação a pensamentos que fragilizam o paciente e enfatiza que os pensamentos têm consequências, necessitando ser avaliados para determinar se são pragmáticos e condizentes com os fatos (1). Em essência, trata-se de uma abordagem empírica da realidade, questionando: “quais são as consequências de pensar assim?” e “qual seria a consequência de uma visão alternativa?” (1).

Comportamentos podem ser modificados, mas a percepção de que certos traços são permanentes pode criar uma ilusão de imutabilidade e, consequentemente, a crença na impossibilidade de mudança (1). No modelo cognitivo, a “realidade” é um sistema aberto. Assim, o modelo cognitivo é construtivista na medida em que o “conhecedor” – tanto o terapeuta quanto o paciente – nunca possuirá todos os fatos (1). As decisões no mundo real são tomadas com informações incompletas, em tempo real e sempre em condições de incerteza (1). O conhecimento no mundo empírico é mais uma questão de probabilidades do que de certezas, pois as previsões são sempre baseadas em informações incompletas (1).

É crucial ressaltar que o terapeuta não atua como um “líder de torcida” pelo otimismo. Em vez disso, ele solicita ao paciente que examine as evidências a favor e contra suas crenças e reflita sobre as implicações pragmáticas das diferentes perspectivas (1). A modificação das crenças, e, por conseguinte, das expectativas futuras e da disposição para engajar-se em estratégias comportamentais, constitui um componente importante dessa estratégia (1).

O objetivo da terapia não se limita a “sentir-se melhor”; ela visa desenvolver uma ampla gama de técnicas eficazes que permitam ao paciente enfrentar problemas futuros (1). A abordagem cognitivo-comportamental é orientada para a ação, focada nos problemas atuais, envolve autoajuda e estabelece uma relação colaborativa entre paciente e terapeuta (1). A ênfase na identificação de formas problemáticas de pensamento e enfrentamento, e a subsequente sugestão de alternativas, é o princípio central de todas as abordagens em TCC (1). Enfatizar a mudança, engajando o paciente na busca de alternativas, é o principal antídoto para o desamparo e a desesperança (1).

Modelo Cognitivo Complexo

A sequência simplificada de percepção de situações que levam a pensamentos automáticos e, subsequentemente, influenciam as reações das pessoas, é, por vezes, uma super simplificação. Pensamento, humor, comportamento e fisiologia podem afetar uns aos outros de maneira complexa (2).

Existem diversos tipos de situações desencadeantes, tanto internas quanto externas, sobre as quais os pacientes podem ter pensamentos automáticos, incluindo:

  • Um fluxo de pensamentos: por exemplo, pensar sobre estar desempregado (2).
  • Uma lembrança: como ser demitido do trabalho (2).
  • Uma imagem: como o olhar de desaprovação do chefe (2).
  • Uma emoção: como notar a intensidade da própria disforia (2).
  • Um comportamento: como permanecer na cama (2).
  • Uma experiência fisiológica ou mental: como notar taquicardia ou pensamento lento (2).

Os indivíduos podem experienciar uma sequência complexa de eventos com múltiplas situações desencadeantes, pensamentos automáticos e reações distintas (2).


Crenças: Fundamento dos Pensamentos Disfuncionais

Pensamentos disfuncionais são gerados por nossas crenças disfuncionais sobre nós mesmos, o mundo e o futuro. As crenças centrais ou nucleares são os entendimentos mais básicos e fundamentais que as pessoas possuem sobre si mesmas, o mundo, a vida, os outros e o futuro. Desde a infância, os indivíduos desenvolvem certas ideias sobre si, os outros e seu ambiente. Suas crenças mais centrais são compreensões duradouras tão essenciais e profundas que muitas vezes não são verbalizadas, nem mesmo para si (2).

Os indivíduos tendem a considerar essas ideias como verdades absolutas, como “as coisas são”. Pessoas bem adaptadas predominantemente mantêm crenças realisticamente positivas na maior parte do tempo. Contudo, todos possuem crenças negativas latentes que podem ser parcial ou completamente ativadas na presença de vulnerabilidades ou estressores (2).

Quando os pacientes apresentam condições psicológicas significativas, como transtornos ou dificuldades frequentes em seus relacionamentos e desempenho funcional, suas crenças ativas tendem a ser:

  • Disfuncionais
  • Irracionais
  • Negativas
  • Rígidas
  • Globais
  • Generalizadas

Essas crenças são formadas ao longo do desenvolvimento e são influenciadas por:

  • O estilo de vida, o tratamento e o relacionamento dos pais e familiares entre si e com o indivíduo.
  • A educação recebida em casa.
  • A cultura em que o indivíduo está inserido.
  • As experiências escolares.
  • A interação com outras pessoas, amigos e desconhecidos.

Qualquer experiência vivenciada ou não, tanto positiva quanto negativa, assim como os traumas experimentados durante o desenvolvimento, contribui para a formação das crenças centrais. Uma vez formadas, as pessoas passam o restante de suas vidas reforçando-as ou refutando-as.

Na TCC, as crenças podem ser funcionais ou disfuncionais em relação a si mesmo, ao mundo, à vida, aos outros e ao futuro. Elas podem ser categorizadas em quatro esquemas principais:

  • Desamparo: A pessoa acredita ser incapaz de cuidar e proteger a si mesma (emocional ou fisicamente) ou se percebe incapaz em comparação com outras pessoas.
  • Desamor: A pessoa crê que há algo em si que impede o recebimento de amor e a vivência de intimidade com os outros.
  • Desvalor: A pessoa se percebe moralmente inadequada ou incompetente.
  • Desregramento: A pessoa acredita ser indisciplinada e incapaz de se organizar para produzir e realizar, ou merecedora de proteção e privilégios por ser especial.

Crenças Adaptativas

Muitos pacientes eram psicologicamente saudáveis antes do início do transtorno, sendo razoavelmente afetivos, com bons relacionamentos e vivendo em ambientes predominantemente seguros. É provável que a maioria deles tenha desenvolvido crenças flexíveis, úteis e baseadas na realidade sobre si mesmos, seu mundo, outras pessoas e o futuro (2).

Contudo, os equivalentes negativos latentes dessas crenças podem emergir temporariamente quando esses pacientes interpretam negativamente uma dificuldade relacionada à sua eficácia, um problema interpessoal ou uma atitude contrária ao seu código moral (2).

Vale ressaltar que alguns pacientes podem apresentar crenças excessivamente adaptativas, especialmente se forem maníacos ou hipomaníacos. Eles podem ter uma visão irrealisticamente positiva de si mesmos, dos outros, do mundo e/ou do futuro. Quando essas crenças são disfuncionais, pode ser necessário ajudá-los a encarar suas experiências de forma mais realista, mesmo que isso implique uma direção negativa (2).

Crenças Negativas Disfuncionais

Indivíduos com histórico de menor saúde psicológica tendem a apresentar um funcionamento mais deficiente, podendo ter relacionamentos problemáticos e possuir crenças nucleares mais negativas. Essas crenças podem ter sido ou não realistas e/ou úteis no momento em que se desenvolveram (2).

Enquanto as crenças centrais disfuncionais são formadas, o indivíduo, para sobreviver às experiências sofríveis que as geram, elabora estratégias de enfrentamento disfuncionais baseadas em atitudes evitativas ou compensatórias dessas experiências, formando também regras ou suposições disfuncionais.

De forma geral, as crenças nucleares negativas sobre si mesmo se enquadram em três categorias (2):

  • Desamparo: Ser ineficaz em ações, autoproteção ou em se igualar a outros (2). Exemplos:
    • “Não consigo fazer as coisas.”
    • “Não sou capaz de me proteger.”
    • “Sou inútil comparado aos outros.”
  • Desamor: Possuir qualidades pessoais que resultam na incapacidade de receber e manter amor e intimidade dos outros (2). Exemplos:
    • “Sou alguém impossível de ser amado, desagradável, indesejável.”
    • “Não serei aceito ou amado porque sou diferente, um nerd, defeituoso.”
    • “Serei certamente rejeitado, abandonado e ficarei sozinho.”
  • Desvalor: Ser imoral, pecador ou perigoso para os outros (2). Exemplos:
    • “Sou imoral, moralmente mau, um pecador.”
    • “Sou perigoso, tóxico, louco e mau.”
    • “Não mereço viver.”

Crenças Intermediárias: Atitudes, Regras e Pressupostos

Os pensamentos automáticos, as palavras ou imagens que de fato passam pela mente de uma pessoa, são específicos para a situação e podem ser considerados o nível mais superficial de cognição (2). As crenças intermediárias situam-se entre os pensamentos automáticos e as crenças nucleares, sendo influenciadas por estas. Essa classe intermediária de crenças consiste em atitudes, regras e pressupostos, frequentemente não expressos (2).

Exemplos:

  • Atitude: “É terrível falhar.”
  • Regra: “Devo desistir se um desafio parecer muito grande.”
  • Pressuposto: “Se eu tentar fazer algo difícil, vou fracassar; se eu evitar fazê-lo, tudo ficará bem.”

É fundamental ressaltar que as crenças disfuncionais podem ser desaprendidas, e novas crenças, mais funcionais e baseadas na realidade, podem ser desenvolvidas e fortalecidas durante o tratamento (2). A forma mais eficaz de ajudar os pacientes a se sentirem melhor e a agirem de maneira mais adaptativa é auxiliá-los a identificar e fortalecer suas crenças adaptativas mais positivas, além de modificar suas crenças imprecisas. Uma vez alcançado isso, os pacientes tendem a interpretar situações ou problemas atuais e futuros de forma mais construtiva (2). Em geral, é necessário trabalhar as crenças nucleares negativas de forma indireta inicialmente, e mais diretamente em fases posteriores do tratamento. Mesmo a identificação de crenças nucleares negativas pode desencadear afeto negativo significativo, podendo fazer com que os pacientes se sintam inseguros (2).


Distorções Cognitivas

Quando disfuncionais, os pensamentos frequentemente contêm erros ou distorções cognitivas, que são vieses de raciocínio. Dentre elas, destacam-se:

  • Catastrofização: Tendência a prever que o pior cenário ocorrerá em cada situação, percebendo eventos negativos como catástrofes intoleráveis, sem uma visão em perspectiva.
  • Emocionalização: Presunção de que sentimentos são fatos, ou seja, acreditar que algo acontecerá ou é verdadeiro apenas por sentir uma emoção forte a respeito, considerando essa emoção como prova do pensamento.
  • Polarização ou Pensamento Dicotômico: Percepção de situações ou pessoas em termos absolutos, enxergando apenas duas possibilidades extremas.
  • Abstração Seletiva ou Filtro Negativo: Ignorar aspectos relevantes de uma situação para focar exclusivamente no negativo, realçando uma parte negativa ou neutra e desconsiderando o restante positivo.
  • Adivinhação: Antecipar problemas que talvez não ocorram e nutrir expectativas negativas sobre o futuro.
  • Leitura Mental: Presumir, sem evidências concretas, o que os outros estão pensando sobre si ou sobre as situações, desconsiderando outras hipóteses.
  • Rotulação: Atribuir um rótulo rígido a si mesmo ou a outra pessoa, em vez de rotular a situação ou o comportamento específico.
  • Personalização: Assumir culpa ou responsabilidade por eventos negativos, sem reconhecer o envolvimento de outras pessoas e fatores.
  • Vitimização: Considerar-se injustiçado ou incompreendido, atribuindo responsabilidades a outros ou a circunstâncias por eventos que estavam sob seu controle, recusando-se a assumir a responsabilidade pelo próprio comportamento ou seus efeitos.
  • Hipergeneralização: Tomar um evento esporádico como regra e assumir que sempre será assim, desconsiderando as circunstâncias e seus determinantes.
  • Questionalização ou “E… Se…”: Focar no que poderia ter sido e não foi, culpando-se por coisas do passado e questionando-se sobre escolhas futuras, sem estimar as probabilidades realistas.

Terapeuta Efetivo na TCC

Para um observador sem treinamento, a TCC pode, por vezes, transmitir uma falsa impressão de simplicidade. O modelo cognitivo — a proposição de que nossos pensamentos influenciam nossas emoções e comportamentos (e, por vezes, a fisiologia) — é de fato simples em sua essência. No entanto, terapeutas experientes em TCC realizam múltiplas tarefas simultaneamente: estabelecem rapport, orientam e familiarizam o paciente, coletam dados, conceitualizam o caso, trabalham para atingir os objetivos do paciente e superar obstáculos, ensinam habilidades, realizam resumos periódicos e solicitam feedback (2). Ao desempenhar essas tarefas, a interação pode parecer quase coloquial (2).

O desenvolvimento da expertise como terapeuta cognitivo-comportamental pode ser compreendido em quatro estágios:

  • Estágio 1: O terapeuta adquire as habilidades básicas de conceitualização de caso em termos cognitivos, baseando-se na avaliação inicial e nos dados coletados durante a sessão. Aprende a construir uma relação terapêutica sólida, a estruturar as sessões e a utilizar a conceitualização do paciente e o bom senso para planejar o tratamento, levando em conta os valores, aspirações e objetivos do indivíduo (2). O terapeuta auxilia os pacientes a desenvolverem soluções para os obstáculos que enfrentam e a encararem seus pensamentos disfuncionais de maneira diferente. Ele aprende a empregar técnicas cognitivas e comportamentais básicas e a ensiná-las aos pacientes (2).
  • Estágio 2: O terapeuta torna-se mais proficiente na integração de sua conceitualização com o conhecimento das técnicas. Ele aprimora sua capacidade de compreender o fluxo da terapia, identifica com mais facilidade os objetivos principais do tratamento e torna-se mais hábil na conceitualização dos pacientes, aprimorando-a e utilizando-a para embasar as decisões de intervenção (2). O terapeuta expande seu repertório de estratégias e aprimora a seleção, o timing e a implementação de técnicas apropriadas, além de fortalecer a relação terapêutica (2).
  • Estágio 3: O terapeuta integra dados novos à conceitualização de forma mais automática. Ele aperfeiçoa sua habilidade de formular hipóteses para confirmar ou ajustar sua compreensão do paciente. Quando necessário, varia a estrutura e as técnicas da TCC básica, especialmente em casos de pacientes com transtornos de personalidade e outros transtornos e problemas complexos. Torna-se mais hábil na prevenção e reparo de rupturas na aliança terapêutica (2).
  • Estágio 4: O terapeuta continua a aprender TCC ao longo de toda a sua vida profissional. Ele segue aprendendo com cada paciente que trata, participa de discussões de caso semanais, busca assessoria clínica com colegas e supervisionados, e mantém-se atualizado com a pesquisa e prática em TCC por meio da leitura de livros e artigos, além da participação regular em congressos (2).

Visão Geral do Tratamento na TCC

Os princípios do tratamento em TCC são a base para uma prática eficaz e centrada no paciente.

Princípios do Tratamento

  1. Planos de tratamento baseados em uma conceitualização cognitiva contínua (2): A terapia é guiada por uma compreensão dinâmica e em evolução do funcionamento cognitivo do paciente.
  2. Requer uma aliança terapêutica sólida (2): A relação de confiança e colaboração entre paciente e terapeuta é fundamental.
  3. Monitoramento contínuo do progresso do cliente (2): Acompanhamento constante dos resultados para ajustar o tratamento.
  4. Culturalmente adaptada e individualizada (2): O tratamento é ajustado às características culturais e necessidades específicas de cada indivíduo.
  5. Enfatiza o positivo (2): Foco nos pontos fortes e recursos do paciente.
  6. Enfatiza a colaboração e a participação ativa (2): O paciente é um agente ativo no processo terapêutico.
  7. Aspiracional, baseada em valores e orientada para os objetivos (2): A terapia alinha-se com os valores, aspirações e metas do paciente.
  8. Inicialmente enfatiza o presente (2): O foco primordial é nos problemas atuais.
  9. Educativa (2): Ensina habilidades e estratégias ao paciente.
  10. Atenta ao tempo de tratamento (2): Busca a eficiência, mas reconhece a necessidade de flexibilidade.
  11. Sessões estruturadas (2): As sessões seguem um formato para otimizar o tempo e a efetividade.
  12. Utiliza a descoberta guiada e ensina os clientes a responderem às suas cognições disfuncionais (2): O terapeuta guia o paciente na exploração e reavaliação de seus pensamentos.
  13. Inclui planos de ação (tarefas de casa da terapia) (2): Atividades para serem realizadas fora da sessão, reforçando o aprendizado.
  14. Utiliza uma variedade de técnicas para mudar o pensamento, o humor e o comportamento (2): Adapta estratégias de diversas modalidades psicoterápicas.

Detalhamento dos Princípios

Princípio 1: Conceitualização Baseada em Dados

A conceitualização do paciente baseia-se nos dados fornecidos na avaliação, informada pela formulação cognitiva (cognições-chave, estratégias comportamentais e fatores de manutenção do(s) transtorno(s)) (2). Inicialmente, as dificuldades são conceitualizadas dentro de três estruturas temporais:

  • Presente: Identificação das cognições atuais que atuam como obstáculos às aspirações do paciente (p. ex., “eu sou um fracasso”; “não faço nada direito”). Também se identificam obstáculos comportamentais que contribuem para a manutenção da condição (p. ex., depressão, isolamento, inatividade excessiva) (2).
  • Fatores Precipitantes: Identificação dos fatores que influenciaram as percepções no início do transtorno (p. ex., dificuldades no trabalho que levaram à perda do emprego; uma esposa que se tornou crítica e resultou em divórcio) (2). Esses eventos contribuíram para a crença de incompetência (2).
  • Eventos-chave do Desenvolvimento: Formulação de hipóteses sobre eventos-chave do desenvolvimento e padrões consistentes de interpretação desses eventos que podem ter predisposto o paciente ao transtorno. Por exemplo, a expectativa de uma mãe para que o filho pré-adolescente assumisse responsabilidades domésticas significativas, para as quais ele não estava preparado, levando-o a interpretar a crítica materna como válida em vez de reconhecer a sobrecarga materna (2).

Princípio 2: A Aliança Terapêutica

O grau em que os pacientes são capazes de desenvolver uma boa aliança terapêutica varia inicialmente (2). Em geral, o terapeuta dedica tempo suficiente ao desenvolvimento da relação terapêutica para engajar os pacientes a trabalharem efetivamente em equipe (2). Alguns pacientes, especialmente aqueles com transtorno de personalidade, requerem uma ênfase muito maior na relação terapêutica e em estratégias avançadas para forjar uma boa aliança de trabalho (2).

Nota: Em muitos transtornos ou casos específicos, a relação terapêutica é o foco principal do trabalho. Em alguns, pode ser necessário dedicar um longo período a ela antes de qualquer intervenção. Transtornos de personalidade, adolescentes e certas crenças específicas necessitam de uma relação terapêutica robusta para que o tratamento progrida.

Princípio 3: Monitoramento do Progresso

Estudos demonstram que o monitoramento rotineiro melhora os resultados da terapia (2). Os resultados são aprimorados quando pacientes e terapeutas recebem feedback sobre o progresso. Além disso, com a crescente ênfase na recuperação, muitos terapeutas de TCC atualmente também avaliam o funcionamento geral dos pacientes, seu avanço em direção aos objetivos e a sensação de satisfação, conexão e bem-estar (2).

Princípio 4: Adaptação Cultural e Individualização

Tradicionalmente, a TCC refletiu os valores da cultura dominante nos EUA. No entanto, pacientes de diferentes origens étnicas e culturais obtêm melhores resultados quando seus terapeutas reconhecem a relevância das diferenças, preferências e práticas culturais e étnicas (2). Pacientes de outras culturas podem ter valores e preferências distintas, como raciocínio emocional, graus variados de expressão emocional e coletivismo ou interdependência (2). Os pacientes podem diferir em muitos aspectos, incluindo idade, orientação religiosa ou espiritual, etnia, condição socioeconômica, deficiência, gênero, identidade sexual e orientação sexual (2). Quando as culturas dos pacientes diferem da do terapeuta, pode ser necessário aprimorar a competência cultural. Frequente, o terapeuta pode não ter consciência de seus próprios vieses culturais (2). É fundamental informar-se sobre as características dos pacientes, antecipando como essas diferenças podem ser relevantes para o tratamento (2).

Princípio 5: Ênfase no Positivo

Estudos recentes sublinham a importância de enfatizar a emoção e a cognição positiva no tratamento da depressão. Assim, o terapeuta auxilia ativamente os pacientes no cultivo de estados de humor e pensamento positivos, o que é crucial para inspirar esperança (2).

Princípio 6: Colaboração e Participação Ativa

Tanto o paciente quanto o terapeuta são ativos no processo. Inicialmente, o terapeuta é mais ativo, sugerindo direções para as sessões de terapia e para alguns planos de ação. Posteriormente, o paciente é encorajado a ser cada vez mais ativo na sessão: decidir quais passos dar em direção aos seus objetivos, resolver problemas relacionados a obstáculos potenciais, avaliar suas cognições disfuncionais, resumir pontos importantes e elaborar planos de ação (2).

Princípio 7: Aspirational, Baseada em Valores e Orientada para Objetivos

A TCC é aspiracional, fundamentada nos valores individuais dos pacientes (o que é realmente importante para eles na vida), em suas aspirações (como desejam ser, como desejam que suas vidas sejam) e em seus objetivos específicos para o tratamento (o que desejam obter como resultado da terapia) (2).

Princípio 8: Foco no Presente

A TCC inicialmente enfatiza o presente. O foco é direcionado para o passado em três circunstâncias:

  • Quando um paciente expressa um forte desejo de fazê-lo (2).
  • Quando o trabalho direcionado para os problemas atuais e aspirações futuras produz mudança insuficiente (2).
  • Quando o terapeuta julga importante que ele e o paciente compreendam como e quando suas principais ideias disfuncionais e estratégias de enfrentamento comportamental se originaram e foram mantidas (2).

Após essa exploração do passado, a discussão volta para o que os pacientes entendem agora sobre o passado e como podem utilizar esse novo entendimento na semana seguinte (2).

Princípio 9: Atenção ao Tempo de Tratamento

Tradicionalmente, a TCC era descrita como uma terapia de curta duração, com muitos pacientes com depressão e transtornos de ansiedade necessitando entre 6 e 16 sessões. No entanto, o tratamento para algumas condições pode ser consideravelmente mais longo (2). Alguns pacientes têm vidas caóticas ou enfrentam desafios severos constantes, como pobreza ou violência. Outros apresentam transtornos crônicos ou resistentes ao tratamento, transtornos de personalidade, uso de substâncias enraizado, transtorno bipolar, transtornos alimentares ou esquizofrenia. Nestes casos, um ou até dois anos de terapia podem ser insuficientes (2).

Princípio 11: Estrutura das Sessões

Aderir a um formato-padrão, bem como ensinar as técnicas terapêuticas aos pacientes, facilita o alcance dos objetivos (2). O que o terapeuta faz em determinada sessão é influenciado pelos objetivos e problemas do paciente, pela conceitualização cognitiva, pela força da relação terapêutica e pelo estágio do tratamento (2).

A primeira parte da sessão visa restabelecer a aliança terapêutica, revisar o plano de ação e coletar dados para que terapeuta e paciente possam, colaborativamente, definir e priorizar a pauta. Na segunda parte, discutem-se os problemas ou objetivos da pauta. Essas discussões e intervenções naturalmente conduzem a planos de ação. Na parte final da sessão, terapeuta e paciente resumem o que foi abordado. O terapeuta deve assegurar que o plano de ação é razoável e, então, solicita feedback do paciente (2).

Princípio 12: Descoberta Guiada e Resposta às Cognições Disfuncionais

No contexto da discussão de um problema ou objetivo, o terapeuta formula perguntas aos pacientes para auxiliá-los a identificar pensamentos disfuncionais (perguntando o que estava passando por sua mente), avaliar a validade e utilidade de seus pensamentos (utilizando diversas técnicas) e formular um plano de ação (2).

É importante notar que se evita “desafiar” as cognições (afirmando ou tentando convencer os pacientes de que seus pensamentos ou crenças são inválidos). Em vez disso, a ajuda ocorre por meio da reestruturação cognitiva, um processo de avaliação e resposta ao pensamento mal-adaptativo (2). Quando pensamentos automáticos fazem parte de um processo de pensamento disfuncional, como ruminação, obsessão ou autocrítica contínua, o terapeuta pode auxiliar os pacientes a aceitarem seus pensamentos sem crítica, permitindo que eles surjam e desapareçam por si (2).

Princípio 13: Planos de Ação (Tarefas de Casa)

A TCC inclui planos de ação (dever de casa). Em geral, esses planos consistem em (2):

  • Identificar e avaliar pensamentos automáticos que são obstáculos aos objetivos dos pacientes (2).
  • Implementar soluções para os problemas e obstáculos que podem surgir na semana seguinte.
  • Praticar habilidades comportamentais aprendidas na sessão (2).

Nota: Os planos de ação decorrem naturalmente da discussão de cada objetivo ou problema em pauta (2).

Princípio 14: Variedade de Técnicas

A TCC utiliza uma variedade de técnicas para mudar o pensamento, o humor e o comportamento. Estratégias de muitas modalidades psicoterápicas são adaptadas dentro do contexto da estrutura cognitiva.


Conceitualização Cognitiva

A conceitualização cognitiva, também conhecida como conceituação de caso, é um dos pilares da TCC, fornecendo uma estrutura essencial para o tratamento. Ela ajuda a:

  • Compreender os pacientes, seus pontos fortes e fracos, suas aspirações e desafios (2).
  • Reconhecer como os pacientes desenvolveram um transtorno psicológico com pensamento disfuncional e comportamento mal-adaptativo (2).
  • Fortalecer a relação terapêutica (2).
  • Planejar o tratamento dentro e entre as sessões (2).
  • Escolher intervenções apropriadas e adaptar o tratamento quando necessário (2).
  • Superar pontos de bloqueio (2).

É crucial compreender a formulação cognitiva para o(s) diagnóstico(s) do paciente, as cognições típicas, as estratégias comportamentais e os fatores de manutenção. Contudo, é sempre necessário verificar se a formulação se ajusta ao paciente específico (2). À medida que os pacientes fornecem novas informações, o terapeuta confirma, rejeita ou modifica as hipóteses. O terapeuta compartilha a conceitualização e pergunta ao paciente se ela “soa verdadeira” ou “parece correta” (2).

É importante que o terapeuta se coloque no lugar do paciente, desenvolvendo empatia pelo que ele está experimentando, compreendendo como ele se sente e percebendo o mundo através de seus olhos. As percepções, pensamentos, emoções e comportamento do paciente devem fazer sentido, considerando a interpretação de suas experiências passadas e atuais, seus pontos fortes e vulnerabilidades, seus valores e atributos pessoais, sua biologia, genética e epigenética (2).

Diagramas de Conceitualização Cognitiva (DCCs)

Os diagramas de conceitualização cognitiva (DCCs) são instrumentos utilizados pelo terapeuta na TCC, sendo preenchidos desde o início do tratamento e podendo ser alterados com base em novas informações. Eles auxiliam na organização da considerável quantidade de dados obtidos dos pacientes (2). A maioria dos pacientes fornece dados negativos no início do tratamento, portanto, é fundamental fazer perguntas para obter informações positivas. Também é importante estar continuamente atento aos dados positivos que os pacientes ignoram ou desconsideram (2).

O preenchimento do DCC geralmente começa pela parte inferior, seguindo a ordem de: situação, pensamento, significado do pensamento, emoção/resposta fisiológica e comportamento.

  1. Emoção ou Comportamento: Inicie pela caixa da emoção ou comportamento, que são mais fáceis de identificar e são frequentemente as queixas que levam os pacientes a procurar serviço psicológico. Peça ao paciente que se lembre de um momento em que sentiu uma emoção significativa (tristeza, ansiedade, irritação, angústia) ou exibiu um comportamento problemático (agressão, fuga, compulsão) – procure por uma reação típica.
  2. Situação e Pensamento Automático: Preencha a situação e o pensamento automático. Certifique-se de que o pensamento automático é típico (o paciente deve ser capaz de dizer com confiança: “isso é o que eu normalmente penso nesse tipo de situação”). O diagrama da conceituação é útil somente quando se encontram pensamentos e reações típicas.
  3. Significado do Pensamento: Pergunte ao paciente: “se esse pensamento automático for verdadeiro, o que isso significaria? E a seu respeito? O que há de pior nisso?” Em seguida, preencha o significado do pensamento.
  4. Crença Central: Repita os passos anteriores para duas ou três situações típicas. Tente identificar o tema (esquema) relacionado aos pensamentos. Em seguida, preencha a caixa da crença central com os significados dos pensamentos automáticos.
  5. Estratégias Compensatórias: Observe a caixa do comportamento e pergunte se o conteúdo reflete um padrão de comportamento não saudável. Se sim, registre esse comportamento na caixa de estratégias compensatórias.
  6. Suposições: Preencha as suposições. Geralmente, são pressupostos como: “se eu fizer [minha estratégia compensatória] estarei bem; se não, [minha crença central se concretizará ou ficará evidente]”.
  7. Necessidades e Consequências: Identifique as necessidades que o paciente deseja atender na situação e a finalidade do comportamento. Especifique as consequências produzidas e os efeitos mantenedores das reações disfuncionais.
  8. Dados Relevantes da Vida: Preencha a caixa superior com dados relevantes da vida, perguntando ao paciente se ele se lembra de experiências que podem ter contribuído para o desenvolvimento de suas crenças e comportamentos. Se houver e for relevante, adicione informações médicas, orgânicas, genéticas ou hereditárias.
  9. Pontos Fortes e Déficits: Por fim, identifique os pontos fortes (comportamentos saudáveis) do paciente e os déficits que o vulnerabilizam a padrões disfuncionais e que precisarão ser desenvolvidos como objetivos terapêuticos.

Diagrama de Conceitualização Baseado nos Pontos Fortes (DCC-PF)

O Diagrama de Conceitualização Cognitiva Baseada nos Pontos Fortes (DCC-PF) ajuda o terapeuta a prestar atenção e a organizar os padrões de cognições úteis e de comportamento do paciente. Entre outras coisas, ele ilustra a relação entre (2):

  • Acontecimentos importantes na vida e crenças nucleares adaptativas (2).
  • Crenças nucleares adaptativas e o significado dos pensamentos automáticos do paciente.
  • Crenças nucleares adaptativas, crenças intermediárias relacionadas e estratégias de enfrentamento adaptativas (2).
  • Situações, pensamentos automáticos adaptativos e comportamentos adaptativos (2).

Nota: O DCC-PF é muito complexo para ser apresentado diretamente aos pacientes. Se for fazê-lo, mostre uma cópia em branco. Vocês podem preenchê-los juntos, escolhendo situações históricas (pré-mórbidas) em que os pacientes tiveram pensamentos automáticos e comportamento adaptativo. Ou o terapeuta pode esperar até que os pacientes estejam atualmente percebendo a si e a suas experiências de forma mais realista e estejam engajando-se em estratégias de enfrentamento úteis (2).


Terapia Cognitiva Orientada para a Recuperação (CT-R)

A Terapia Cognitiva Orientada para a Recuperação (CT-R) é uma adaptação da TCC tradicional que mantém os fundamentos teóricos do modelo cognitivo na conceitualização dos indivíduos e no planejamento e realização do tratamento (2). No entanto, a CT-R acrescenta uma ênfase na formulação cognitiva das crenças adaptativas e estratégias comportamentais dos pacientes, bem como nos fatores que mantêm um humor positivo. Em vez de focar nos sintomas e na psicopatologia, a CT-R destaca os pontos fortes, qualidades pessoais, habilidades e recursos dos pacientes (2).

Uma diferença crucial entre a TCC tradicional e a CT-R reside na orientação temporal. Na TCC tradicional, a tendência é abordar problemas que surgiram no passado, utilizando técnicas da TCC para resolvê-los. Na CT-R, o foco está mais nas aspirações futuras dos pacientes e nos passos que eles podem dar semanalmente em direção aos seus objetivos. As técnicas habituais da TCC são empregadas para superar os desafios ou obstáculos que os pacientes enfrentarão ao dar esses passos (2).


Resistência Terapêutica

Na TCC, resistência é entendida como qualquer pensamento, emoção ou comportamento que interfira negativamente no processo terapêutico. Comportamentos que podem sinalizar resistência incluem o paciente falar pouco ou excessivamente sobre emoções ou o passado, ou não se lembrar de eventos importantes de sua vida. As resistências mais comuns incluem faltas, atrasos, não pagamento das sessões, desvalorização do profissional e término prematuro do tratamento.

Ao perceber a resistência do paciente, o terapeuta deve convidá-lo a explorar suas razões e os fatores do terapeuta que podem contribuir para ela. É fundamental reavaliar as metas e verificar se as mudanças necessárias são ameaçadoras para o paciente, ponderar as vantagens e desvantagens da mudança, corrigir pensamentos distorcidos, ajustar o grau de dificuldade exigido ou buscar soluções para problemas antevistos.

Ao utilizar a relação terapêutica como um ambiente de aprendizado, o terapeuta pode empregar técnicas como:

  • Autorrevelações oportunas: Humanizar o processo permitindo que o paciente conheça facetas da vida do clínico e dificuldades semelhantes pelas quais ele possa ter passado.
  • Modelação: O terapeuta demonstra os comportamentos que o paciente precisa para atuar em determinada situação.
  • Reparação parental ou reparentalização: Prover, dentro dos limites éticos, as necessidades socioemocionais que o paciente busca atender com seus comportamentos disfuncionais, porém quando este exibe comportamentos funcionais para sua obtenção.
  • Feedbacks corretivos empáticos: O terapeuta sinaliza ao paciente comportamentos-problema que ocorrem em sua vida e que se manifestaram na relação terapêutica, exigindo a mudança pela qual estão trabalhando.

Estabelecimento de Metas Terapêuticas

As metas de tratamento são desenvolvidas antes do início das sessões de intervenção para mudanças. É crucial estabelecê-las para que o terapeuta saiba exatamente o que o paciente deseja alcançar.

Para compor metas terapêuticas a partir de demandas inespecíficas, diversas áreas da vida do paciente são avaliadas, incluindo as dimensões: Pessoal, Interpessoal, Ocupacional, Material, Recreativa e Existencial. Essas áreas são avaliadas para determinar:

  • Quais são as possíveis dificuldades em cada uma delas e o que o paciente gostaria de alcançar.
  • A rotina e o dia típico do paciente, o que ele percebe que está fazendo em excesso ou em déficit.
  • O que ele gostaria que fosse diferente em sua vida.

Em vez de aceitar metas abrangentes como “quero ser feliz”, o terapeuta deve questionar: “se você fosse mais feliz, o que estaria fazendo? Ou o que estaria fazendo menos?”, “O que seria diferente em seus comportamentos e em sua vida?”. Isso permite determinar metas mais específicas, delineando o caminho a seguir e como alcançá-las.


Ferramentas Úteis

Uma ferramenta útil é o “Curto Grama”, que solicita aos pacientes que preencham quadrantes relacionados a si mesmos e a seus comportamentos:

  • Sou ou faço e gosto de ser ou fazer.
  • Sou ou faço e não gosto de ser ou fazer.
  • Não sou ou faço e gostaria de ser ou fazer.
  • Não sou ou faço e não gostaria de ser ou fazer.

Referências Bibliográficas

  1. LEAHY, R. L. Técnicas de terapia cognitiva – Manual do terapeuta. 2. ed. Artmed, 2019.
  2. BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental: Teoria e prática. 3. ed. Artmed, 2022.