Vitamina A: Metabolismo, Funções, Avaliação e Implicações Clínicas
Introdução
A vitamina A é um nutriente essencial, abrangendo um grupo de compostos, os retinoides e os carotenoides (2). Desempenha um papel fundamental em diversas funções fisiológicas, incluindo a visão, o sistema imunológico e a diferenciação celular (1).
Conduta Clínica e Recomendações Nutricionais
As recomendações diárias de vitamina A variam de acordo com o sexo e o estado fisiológico:
- Homens (RDA): 900 µg/dia
- Mulheres (RDA): 700 µg/dia
- Gestantes (RDA): 770 µg/dia
- Lactantes (RDA): 1300 µg/dia
- Limite Superior (UL): 2800 µg/dia
Fontes Alimentares
A vitamina A é encontrada em diversos alimentos, tanto de origem animal quanto vegetal:
- Fígado
- Cenoura
- Batata doce
- Manga
- Pupunha
- Couve
- Damasco
- Leite e derivados
- Ovos
Conversão de Unidades
- 1 UI = 0,3 µg de retinol (2)
- 1 µg de retinol = 3,33 UI (2)
Exames Bioquímicos para Avaliação do Estado Nutricional
A avaliação do estado nutricional da vitamina A pode ser realizada através de diferentes métodos bioquímicos:
Níveis Séricos de Retinol
A dosagem de retinol sérico é o método mais comum, frequentemente avaliado em conjunto com a proteína ligadora de retinol (RBP) (5). No entanto, os níveis séricos de retinol não refletem diretamente as reservas hepáticas, devido ao controle homeostático (5).
- < 10 µg/dL (0,35 µmol/L): Carência grave (associada à xeroftalmia) (5)
- < 20 µg/dL (0,70 µmol/L): Deficiência de vitamina A (5)
- < 1,05 µmol/L: Considerado baixo ou deficiente (5)
O ponto de corte de 1,05 µmol/L é frequentemente utilizado para definir a deficiência de vitamina A em gestantes, puérperas, recém-nascidos, pré-escolares, escolares e adolescentes (5).
Avaliação da Reserva Hepática
O retinol hepático é o indicador bioquímico pré-patológico, refletindo as reservas hepáticas de retinol (50-90% da reserva corporal) (4, 5). No entanto, por ser invasivo, não é utilizado em investigações de rotina (4, 5).
Avaliação Indireta da Reserva Hepática
Outras medidas incluem a concentração de RBP no sangue (embora possa ser afetada por infecções e desnutrição), RDR (Relative Dose Response), MRDR (Modified Relative Dose Response), resposta sérica de 30 dias a uma dose de vitamina A (+S30DR) e avaliação das reservas corporais por diluição isotópica (5).
Concentração de Vitamina A no Leite Materno
O teor de vitamina A no leite humano avalia simultaneamente o estado nutricional da mãe e do filho, sendo um indicador precoce da deficiência (5). O ponto de corte adotado pela OMS é < 30 µg/dL (1,05 µmol/L) (5).
Biodisponibilidade e Metabolismo
A vitamina A é representada por retinoides (retinol, retinaldeído e ácido retinoico, encontrados em alimentos de origem animal) e carotenoides (precursores encontrados em vegetais) (2). O betacaroteno é o precursor mais potente, convertido em retinol pela enzima 15,15′-dioxigenase (5).
Em condições normais, 70-90% do retinol da dieta é absorvido, enquanto a absorção de carotenoides é menos eficiente (10-50%) (4). A absorção do retinol livre ocorre por difusão facilitada, e em concentrações farmacológicas, por difusão simples (4). A absorção depende da ingestão concomitante de lipídios (4).
O betacaroteno é clivado na mucosa intestinal, produzindo retinaldeído, que é reduzido a retinol, esterificado e secretado em quilomícrons (2). O retinol é armazenado no fígado (50-80%) e liberado ligado à RBP para os tecidos periféricos (4). O excesso é metabolizado e excretado (4).
Interação com Outros Nutrientes
- Ferro (+): A vitamina A facilita a incorporação do ferro na hemoglobina (1). Estudos mostram correlação entre hemoglobina e retinol (4).
- Zinco (+): Essencial para a síntese de RBP e para a conversão do betacaroteno em vitamina A (4).
Funções no Organismo
A vitamina A desempenha diversas funções metabólicas (4):
- Componente dos pigmentos visuais.
- Carreador de unidades manosil na síntese de glicoproteínas.
- Hormônio com ações no núcleo e na proliferação e diferenciação celular.
- Regulação do sistema imune.
- Síntese de insulina e GH.
- Espermatogênese.
O betacaroteno atua como antioxidante (1).
Retinol no Ciclo Visual
O 11-cis-retinal é um componente dos pigmentos visuais (cones e bastonetes) na retina (4). A rodopsina, pigmento dos bastonetes, libera energia que ativa o nervo óptico (4). A diminuição do retinol circulante causa cegueira noturna (4).
Retinol e Doenças Cardiovasculares
Os carotenoides atuam como antioxidantes, e suas concentrações plasmáticas podem influenciar o risco de DCVs (4).
Deficiência de Vitamina A
A deficiência é caracterizada por valores de retinol < 0,70 µmol/L (5):
- Normal: > 1,05 µmol/L (5)
- Aceitável: 0,70-1,04 µmol/L (5)
- Baixo: 0,35-0,69 µmol/L (5)
- Deficiente: < 0,35 µmol/L (5)
A primeira manifestação funcional é a cegueira noturna (5). O termo xeroftalmia designa o espectro de sintomas oculares (5).
Prevalência
A deficiência crônica é um problema nutricional em países em desenvolvimento (5). No Brasil, níveis inadequados foram observados em crianças e mulheres (5).
Sinais e Sintomas
- Menor produção de muco
- Maior permeabilidade intestinal
- Menor produção de IgA
- Cegueira noturna
- Pele ressecada
- Prejuízo no crescimento ósseo
- Má formação fetal
- Anemia não responsiva ao ferro
- Maior risco para trombose
A OMS estima que a deficiência de vitamina A causa cegueira em milhares de crianças anualmente (4). A deficiência funcional pode ocorrer devido à síntese diminuída de RBP (4). A progressão da deficiência leva à xerose conjuntival, manchas de Bitot, queratinização da córnea e, eventualmente, ulceração e cegueira irreversível (4).
Controle da Deficiência
A prevenção envolve a administração de doses elevadas de vitamina A (acetato ou palmitato de retinol) (4). O tratamento do sarampo também é importante, pois esta doença pode reduzir os níveis de retinol (5).
Hipervitaminose
O excesso de vitamina A prejudica a função da vitamina D e do hormônio da tireoide (2).
Suplementação
A suplementação em doses fisiológicas tem efeito limitado na peroxidação lipídica causada pelo exercício (1). A suplementação na gestação deve ser controlada (4).
Tratamento da Deficiência
A suplementação de vitamina A é indicada em casos de xeroftalmia, com doses variando conforme a idade (5).
Terapia Medicamentosa
Retinoides são usados no tratamento de acne, eczema e psoríase (3). Eles modulam o crescimento celular epidérmico, reduzem a atividade das glândulas sebáceas e têm efeitos anti-inflamatórios (3).
Toxicidade
A toxicidade crônica causa diversos sintomas, afetando o sistema nervoso central, fígado, ossos e pele (4). A suplementação é contraindicada em pacientes com cálculos urinários (5). O excesso na gestação pode ser teratogênico (5).
Referências Bibliográficas
LANCHA JR., A. H.; ROGERI, P. S.; PEREIRA-LANCHA, L. O. Suplementação Nutricional no Esporte. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2019. 266 p.
RODWELL, V. W. et al. Bioquímica Ilustrada de Harper. 30. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2017. 817 p.
RITTER, J. M. et al. Rang & Dale Farmacologia. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2020. 789 p.
COZZOLINO, S. M. F. Biodisponibilidade de Nutrientes. 6. ed. São Paulo: Manole, 2020. 934 p.
BRAGA, J. A. P.; AMANCIO, O. M. S. Deficiências Nutricionais – Manual para Diagnóstico e Condutas. 1. ed. Santana de Parnaíba: Manole, 2022. 216 p.